Pelos cálculos da Associação dos Importadores de Combustíveis, no caso do diesel, defasagem de preços no Brasil em relação ao mercado externo está em 14%
O preço do barril de petróleo do tipo Brent fechou nesta quarta-feira, 6, em US$ 90,60, o maior patamar desde novembro do ano passado. Os analistas já esperavam que o barril voltasse a passar a casa dos US$ 90 em 2023, mas esperavam que isso acontecesse mais próximo ao fim do ano. O novo rali do petróleo coloca mais pressão sobre os preços dos combustíveis no Brasil, com o aumento da defasagem em relação aos valores do mercado internacional – já que a Petrobras não segue mais, desde meados de março, a fórmula da Paridade de Preços de Importação (PPI), criada no governo Michel Temer.
No último dia 15 de agosto, a Petrobras reajustou os preços dos combustíveis no Brasil depois de um hiato de três meses. Mesmo assim, o reajuste não havia sido suficiente para zerar a defasagem em relação aos preços internacionais. De acordo com a Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), no caso do diesel (que foi reajustado em 25,5%), essa defasagem, que à época era de 30%, estava no início desta semana em 10%. Nesta quarta-feira, porém, com o aumento do petróleo, já havia voltado a subir para 14%, o que equivale a R$ 0,62 por litro. Nas contas do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), essa defasagem chegou a 13,1%, ou R$ 0,58 por litro.
No caso da gasolina, que tem uma menor necessidade de importação, a defasagem da Petrobras calculada pela Abicom segue em um dígito desde o aumento de 16,2% nas refinarias, em 15 de agosto, ficando em 5% – ou R$ 0,17 por litro. Nas contas do CBIE, essa distância é maior, chegando a 11,6%, ou R$ 0,38 no momento.
Para Pedro Rodrigues, do CBIE, essa alta do petróleo vai pressionar a Petrobras a realizar novos aumentos, mas a tendência é que eles sejam represados, como da última vez – que, para ele, só ocorreu pela iminência da escassez de diesel importado no mercado nacional. Com os preços da Petrobras muito abaixo dos preços internacionais, as margem dos importadores despencam e eles têm dificuldades de operar, ameaçando o abastecimento do País. Hoje, o Brasil importa entre 20% e 30% do diesel que consome.
O aumento dos preços do petróleo pode, por um lado, ser benéfico para a Petrobras, já que o Brasil é hoje um exportador da commodity. Mas um eventual reajuste dos preços no mercado interno, se for inevitável, terá impacto direto na inflação, pressionando o Banco Central, que iniciou no mês passado o ciclo de redução das taxas de juros, hoje em 13,25% ao ano.
Mercado externo
Para analistas, a tendência dos preços do petróleo no mercado internacional segue em rota de valorização. O movimento atual tem como pano de fundo a manutenção dos cortes de 1,3 milhão de barris de petróleo diários por mais três meses, até o fim do ano, definidos pela Arábia Saudita e Rússia. A decisão colocou de vez a oferta como o fator preponderante para a dinâmica dos preços este ano.
A demanda global por petróleo até avançou este ano, mas, segundo especialistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast, teria atingido um teto, parando de puxar os preços por si só. Hoje, essa demanda está em dos 100 milhões de barris por dia.
Segundo o estrategista da consultoria S&P Global, Felipe Perez, em função do protagonismo excessivo da Arábia Saudita no mercado internacional de petróleo, novos cortes de produção ou extensões desse prazo de três meses são possíveis, o que pressionaria ainda mais os preços.
A consultoria global Rystad Energy já prevê déficit no balanço entre oferta e demanda no quarto trimestre, com o mundo consumindo 2,7 milhões de barris por dia a mais que o ofertado pelos produtores. A consequência óbvia são estoques menores e preços mais altos.
Os especialistas dizem que a escalada de momento já era esperada no segundo semestre, mas veio de forma precoce pelo movimento unilateral encabeçado pela Arábia Saudita. Ainda assim, algumas casas resistem a alterar previsões. O CBIE, por exemplo, manteve a previsão de US$ 93 para o preço médio do segundo semestre, com máxima de US$ 95 a ser alcançada no quarto trimestre.
Perez observa que a demanda mundial para petróleo bate níveis recordes, mas o aumento, porém, vem abaixo do que se esperava, sobretudo em função do avanço tímido da economia chinesa. “O mercado se balizou numa recuperação de demanda da China, que já veio e agora se estabilizou abaixo das expectativas. Estamos vendo um certo platô nessa demanda global (por petróleo) e agora o que vai fazer a diferença é a oferta”, diz o especialista.
O analista Amance Boutin, da Argus, corrobora. “Quem apostava em US$ 100 por barril (de Brent), acreditava na retomada forte da economia chinesa. A demanda vinha se fortalecendo, mas acabou não se materializando como previsto. O que sobra agora para aumentar preço é aperto na oferta”, diz.
Influência
Perez destaca a influência da Arábia Saudita nos preços. “Hoje, os sauditas produzem 9 milhões de barris por dia, podendo reduzir esse volume rapidamente em 1 milhão ou 2 milhões ou aumentá-lo em até 3 milhões induzindo o preço.”
Movimentos desse tipo, no caso da Arábia Saudita, estão muito ligados à receita do País, 90% dependente de petróleo, enquanto para a Rússia importa mais o jogo geopolítico de pressionar as economias da Europa e Estados Unidos. Por essa razão, diz ele, mais cortes ou prorrogação dos cortes atuais até o primeiro trimestre de 2024 não seriam surpreendentes.
O diretor do CBIE Pedro Rodrigues observa que dificilmente os dois países que lideram a Opep+ vão aceitar voltar a conviver com preços do Brent abaixo de US$ 85 no curto prazo. “É cada vez mais claro que a lógica desses países é a busca de aumento da receita via valorização de preços por meio de redução da oferta. Eles têm influência crescente no preço e seguirão atuando para manter esse preço, no mínimo, entre US$ 85 e US$ 90″, diz o especialista.
A saída, diz Rodrigues, seria equilibrar o aumento da produção de petróleo por países fora da Opep+, o que não é factível no curto prazo. É o caso do Brasil, que poderia renovar reservas e aumentar a produção com a Margem Equatorial. Aqui e em todo o mundo, porém, essa possibilidade se mostra cada vez mais remota ante o rigor ambiental crescente e os esforços de transição energética dos países (Estadão, 8/9/23)