Governo espera captar R$ 10 bilhões com títulos verdes.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem a expectativa de que o Plano de Transformação Ecológica do Brasil seja mais do que uma proposta para exportar energia sustentável e se torne a base para uma nova onda de industrialização do país.
“Não precisamos nos resignar à condição de exportador de energia limpa, que é o que o mundo gostaria que fizéssemos. Nós entendemos que boa parte dessa energia limpa deve ser consumida no Brasil para manufaturar produtos verdes. Esse é nosso objetivo último”, disse Haddad ao chegar na manhã desta segunda-feira (18) na Bolsa de Valores de Nova York, para o evento Brasil em Foco, que reúne investidores, políticos e empresários.
A expectativa do governo é captar R$ 10 bilhões com títulos verdes, valor considerado pequeno pelo ministro. “O Brasil tem condições de captar muito recurso no exterior porque tem a melhor matriz energética do mundo. Temos condições de dobrar a energia limpa em um prazo inferior a dez anos”.
A aposta é que, ao dobrar a produção energética sustentável, o país possa exportar não só a energia propriamente dita, como também produtos manufaturados de maior valor agregado, gerados a partir da economia verde.
A falta de qualificação no Brasil pode ser um empecilho. Apenas 20% dos jovens brasileiros entre 18 e 24 anos estão na universidade, segundo dados da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua) de 2022, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
“A tão esperada reforma do ensino médio é uma atribuição dos governos estaduais e ela não chegou”, disse à Folha. Mesmo assim, o ministro não acredita que a falta de profissionais qualificados será um problema, se ocorrer o desenvolvimento esperado com a nova industrialização. “Falavam do apagão de mão de obra no governo Lula, quando o país crescia 4% ou 5%, e não faltou mão de obra para aquele momento.”
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, fez questão de ressaltar que, para combater as mudanças climáticas, o Brasil precisa não só de obras de mitigação e adaptação, mas de “transformação”. Para ela, é disso que se trata o plano verde de Haddad.
O ministro da Fazenda ainda disse no evento que o setor agrícola brasileiro é moderno e interessado em fazer investimentos que promovam ganhos ambientais, mas enfatizou que ainda há muito trabalho a ser feito na pecuária.
“Essa agenda da agricultura moderna está na nossa política. Eu vejo disposição do setor [agronegócio] em fazer”, disse Haddad.
“O agro sabe que se essa agenda não for endereçada, ele vai perder o mercado internacional. Temos que fazer grande trabalho no caso da pecuária”, acrescentou o ministro em outro momento da fala.
O ministro defendeu ainda a exploração de fontes de energia renováveis como uma forma de garantir segurança energética e afirmou que o Brasil possui uma grande vantagem ao contar com uma “bateria” de reserva de energia das hidrelétricas.
Em Nova York desde domingo, Haddad se reuniu com mais de 60 fundos de investimento e afirmou que a receptividade foi positiva. O próprio presidente do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e ex-presidente do Banco Central do Brasil, Ilan Goldfajn disse que essa é uma “mega oportunidade” para o Brasil e para a América Latina, e de interesse global, tanto dos governos quanto do setor privado.
“Há um potencial para a economia dar um salto”, disse Goldfajn. “Mas a América Latina já desperdiçou muitas oportunidades.”
Fernando Haddad disse no evento que o Brasil precisa aproveitar um clima “favorável a tudo” para avançar com sua agenda e garantir um bom desempenho econômico.
“É o clima favorável a tudo. Temos que aproveitar esse momento de harmonização dos poderes para fazer a agenda avançar. Quanto mais cedo nós colhermos os frutos dessa agenda, mais facilmente a economia brasileira vai decolar para patamares de crescimento compatíveis com o nosso potencial” (Folha, 19/9/23)
Haddad diz que o agro brasileiro vai colaborar com a agenda ambiental
Em sua fala, o ministro da Fazenda procurou defender a agenda sustentável do governo aos investidores internacionais, ao mesmo tempo em que elogiou o agronegócio brasileiro.
Fernando Haddad defendeu ainda a exploração de fontes de energia renováveis como uma forma de garantir segurança energética.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse nesta segunda-feira (18) que o setor agrícola brasileiro é moderno e interessado em fazer investimentos que promovam ganhos ambientais, mas enfatizou que ainda há muito trabalho a ser feito na pecuária.
“Às vezes olhamos para maus brasileiros, que desmatam, corrompem a natureza, mas essa não é a realidade do nosso agro, que investe em tecnologia, garante espaço no mercado global”, disse o ministro durante evento da CNI (Confederação Nacional da Indústria) e da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) realizado na Bolsa de Nova York.
Os comentários foram feitos no primeiro compromisso desta segunda-feira (18) em Nova York, onde Haddad permanecerá até quarta-feira (20) para apresentar o plano de transformação ecológica do governo Lula a investidores, empresários, acadêmicos e membros da sociedade civil. Esta é a primeira agenda internacional sobre a pauta ecológica brasileira.
Em sua fala, Haddad procurou defender a agenda sustentável do governo aos investidores internacionais, ao mesmo tempo em que elogiou o agronegócio brasileiro – setor que, nas últimas eleições, demonstrou maior alinhamento aos candidatos da direita, cuja visão é mais conflitante com as demandas ambientais.
“Essa agenda da agricultura moderna está na nossa política. Eu vejo disposição do setor (do agronegócio) em fazer”, disse o ministro.
“O agro sabe que se essa agenda não for endereçada, ele vai perder o mercado internacional. Temos que fazer grande trabalho no caso da pecuária”, acrescentou Haddad em outro momento da fala.
O ministro defendeu ainda a exploração de fontes de energia renováveis como uma forma de garantir segurança energética e afirmou que o Brasil possui uma grande vantagem ao contar com uma “bateria” de reserva de energia das hidrelétricas.
Para o ministro, o país pode usar a energia eólica e a solar para abastecimento, deixando a reserva das hidrelétricas para momentos mais “delicados”.
Haddad afirmou ainda que o Brasil poderá se tornar um grande exportador de lítio, hidrogênio e produtos verdes. Um dos objetivos, conforme o ministro, é tornar o Brasil um porto de chegada de investimentos que visam a sustentabilidade do planeta.
“Queremos capitalizar o Fundo Clima para financiar projetos verdes”, disse Haddad, em referência ao fundo, vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, que busca garantir recursos para apoio a projetos ou estudos e financiamento de empreendimentos que tenham como objetivo a mitigação das mudanças climáticas.
“Temos a oportunidade de mostrar que o país está aberto a negócios verdes”, acrescentou.
Reindustrialização verde
No mesmo evento, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, defendeu uma “reindustrialização verde” para o Brasil e ressaltou que o Estado deve ser um mobilizador da iniciativa privada nesta área.
“Brasil não vai esperar que o paguem para combater a mudança climática”, pontuou (Reuters, 18/9/23)
Entidades tentam quantificar valor da natureza do Brasil
Projetos buscam convencer investidores e políticos de que biodiversidade do país é ativo financeiro.
Na busca por transformar a natureza brasileira em ativo financeiro, empresas e organizações da sociedade civil vêm batendo de porta em porta para convencer políticos e investidores sobre a funcionalidade de novos negócios verdes. Mas muitas dessas formas ainda não existem fora do país, o que levanta dúvidas da real operacionalidade desses modelos.
A BMV Global, por exemplo, greentech que produz ativos baseados na conservação da natureza, tem uma equipe responsável por se reunir com políticos. A empresa quer convencê-los de que estados e municípios podem arrecadar milhões com áreas de preservação e conservação, seja com créditos de carbono ou com créditos de biodiversidade.
Um crédito de biodiversidade, também chamado pela BMV de unidade de crédito de sustentabilidade, equivale a 13 m² de área nativa preservada e 27 benefícios gerados por manter a floresta em pé, dentre eles a preservação da fauna e flora, manutenção de fluxos hidrológicos, madeira armazenada e estocagem de carbono.
O principal entrave hoje é que para gerar créditos, de carbono ou de biodiversidade, é necessário comprovar que houve esforço financeiro ou tecnológico para manter aquela área intacta. Assim, como não se pode desmatar uma área de vegetação nativa protegida por lei não há, portanto, esforço para mantê-la de pé e, por consequência, não há produção de crédito.
Mas um projeto de lei apresentado pelo deputado Zé Silva (Solidariedade-MG) com base em metodologia criada pela BMV pretende autorizar que governos estaduais e municipais transformem essas áreas em ativos financeiros.
“Países e regiões que têm natureza conservada estão fadados a ser pobres. Se a floresta da região Norte, por exemplo, virasse madeira, todo mundo ficaria rico. Esse projeto é, portanto, uma forma de reverter essa desigualdade social”, diz Maria Tereza Umbelino, presidente da BMV.
O texto foi elaborado ainda em 2017, mas em junho –para convencer demais parlamentares a aderirem ao projeto– o deputado pediu à BMV um levantamento sobre qual seria a arrecadação de cinco estados caso o projeto fosse aprovado: Alagoas, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo. O último, por exemplo, poderia ganhar até R$ 96 bilhões com créditos de biodiversidade, segundo o estudo.
Em agosto, a deputada Adriana Ventura (Novo-SP) apresentou um projeto de lei que busca definir o que são os ativos ambientais –o texto foi apensado ao de seis anos atrás. “O crédito de biodiversidade, que é uma ótima modalidade para incentivar a preservação de forma sustentável, é apenas um dos vários efeitos benéficos de uma lei que define o que são os ativos ambientais”, afirma.
O texto está hoje parado na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara.
Metodologia semelhante foi criada no Amapá em 2018, com ajuda da BMV Global. Na prática, porém, houve dificuldades de se criar uma metodologia brasileira e inovadora. O Tesouro Verde, como o governo local nomeou o programa, autoriza o estado a comercializar certificados de conservação de vegetação nativa para empresas que queiram compensar seus impactos ambientais. Em troca, elas teriam acesso a benefícios fiscais já existentes.
O Amapá é o estado com a maior área de floresta tropical preservada do Brasil, 73% de seu território é protegido.
No projeto, o estado mapeou 35 mil hectares da reserva de desenvolvimento sustentável do Rio Iratapuru. De acordo com cálculo da Unesp, a região tinha um estoque de 59 milhões de créditos de biodiversidade, o que nas contas do governo local poderia gerar R$ 2 bilhões aos cofres públicos.
Mas faltou combinar com quem pagaria. Desde a criação do programa, o estado arrecadou apenas R$ 2 milhões, sendo que mais da metade veio de uma única empresa, a mineradora que operava a maior mina de ouro do estado.
O principal obstáculo, segundo o atual secretário de Relações Internacionais e Comércio Exterior do Amapá, Lucas Abrahao, era convencer empresas, inclusive internacionais, de que o cálculo da Unesp era preciso.
“A comercialização poderia ser muito melhor. Hoje, muitas empresas esperam ver metodologias e certificações internacionais, como a da Verra. Esse é um desafio que o Brasil terá ao criar suas próprias metodologias”, afirma. O programa está suspenso até que se encontre um novo parceiro.
Com sede em Washington, a Verra é a certificadora de crédito de carbono mais renomada do mundo.
Os desafios de elaborar um projeto com metodologia própria também apareceram para a BVRio, organização sem fins lucrativos que promove soluções inovadoras e sustentáveis de mercado. Há um ano e meio, ela criou o SIMFlor, programa que visa remunerar proprietários de terra que tenham vegetação nativa excedente em suas áreas –ou seja, mais do que a legislação determina.
A ideia da BVRio é fazer contratos de venda futura de cotas de reserva ambiental, títulos financeiros citados pelo código florestal que autorizam o proprietário de uma área com déficit de vegetação nativa a comprar parcelas daquele que tem de sobra. Esses títulos, porém, nunca foram comercializado devido a divergências jurídicas e a atrasos dos governos estaduais em analisar o cadastro ambiental rural de proprietários.
Depois de algumas tentativas, a organização conseguiu arrecadar US$ 200 milhões (R$ 973 milhões) com um fundo europeu, mas agora o problema tem sido encontrar proprietários que queiram fechar contratos. “Mapeamos 1.700 imóveis na Amazônia, só que nós não temos o telefone e o e-mail dos proprietários, isso não é um dado público. Precisamos ir a essas áreas, encontrar esses proprietários, checar os documentos necessários e conseguir um contrato com eles”, diz Beto Mesquita, diretor de Florestas e Políticas Públicas da BVRio.
Os investidores, segundo Mesquita, pretendem utilizar as áreas para arrecadar com projetos de crédito de carbono. Mas, por ora, apenas dois proprietários fecharam contratos (Folha, 19/9/23)