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A Arte da liderança

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Por Paulo Hartung

Agenda atual coleciona desafios e oportunidades ímpares, demandando o protagonismo de líderes estratégicos na tarefa de construção de uma nova era histórica.

Oportunidades e desafios de alta intensidade constituem tempos que ensejam a ação de lideranças estrategistas. Aprendi essa máxima no dia a dia de trabalho, seja nos oito mandatos eletivos que exerci, seja na iniciativa privada. São encruzilhadas temporais que demandam performances de indivíduos que consigam perceber com nitidez a realidade e suas contingências e que, a partir daí, sejam capazes de vislumbrar um horizonte comum, cujo alcance se viabilize pelo desenho de um mapa de caminhada. E tanto o destino que se projeta quanto o caminho a percorrer precisam ser objetos de comunicação e mobilização constantes, além de se ajustarem às intercorrências do percurso sem que se perca o rumo.

Ou seja, liderança e estratégia são irmãs siamesas. Não há estratégia eficaz nem liderança de verdade sem que as habilidades a elas ligadas se encontrem na forja do espírito daqueles que se propõem a liderar. Um líder só lidera efetivamente se conseguir formular travessias conjugando visão acurada sobre o hoje, o ontem e o que pode ser, considerando a gramática de valores, anseios e potencialidades de um povo, informando, motivando e norteando os movimentos, sem cessar. Outro desafio do líder é formar um time que dialogue e se complemente em seus talentos e vocações. E, nesse particular, não há inteligência artificial que possa substituir o mix de razão, criatividade e sensibilidade que configura a dignidade humana e sustenta a nossa distinção para escrever a História.

Falando em tempos propícios à ação de líderes estrategistas, estamos num desses momentos. O mundo e o Brasil de hoje se encaixam naquelas ocasiões de intensa pressão que requerem personagens que sejam capazes de amalgamar sonhos, possibilidades e projetos, energizando os deslocamentos rumo à transformação. Não por acaso, está à disposição de leitores em todo o planeta o seminal livro Liderança – Seis estudos sobre estratégia, de Henry Kissinger, narrando a trajetória de seis personagens de destaque no século 20.

Preparando o terreno para contar histórias que algumas ajudou a escrever como agente político, Kissinger dá uma verdadeira aula sobre a liderança, destacando “coragem e caráter” como “atributos vitais” de um líder, assim como seu papel de “educador” e também de aprendiz. Não se trata de um livro sobre o passado, mas sobre o que nos foi legado como patrimônio consistente acerca do papel de lideranças estratégicas no processo de evolução civilizacional. Dadas as marcas desafiantes e sísmicas da atualidade, é, pois, leitura mais que atual – obrigatória.

O mundo está numa fronteira atípica. Convulsionado pela emergência climática que ameaça sua própria viabilidade. Acha-se emaranhado numa ambiguidade tecnológica que lhe concede reinventar processos produtivos e laços sociais, mas que também permite ressuscitar monstros do passado extremista. Isso além de somatizar os abalos nas movimentações do xadrez geopolítico, que muitos insistem em chamar “desglobalização”, mas que, em verdade, traduzem um reajuste de forças entre os protagonistas EUA e China, com tremores de eco planetário.

Parte dessa cena global, o Brasil acumula problemas históricos, como pobreza, baixa qualidade da educação básica e déficits na atenção à saúde, entre outros, além de precisar complementar o ciclo de reformas que desate as correntes que impedem o País de realizar seu potencial de desenvolvimento sustentável e prosperidade compartilhada. Além dos desafios, estamos diante de uma oportunidade inédita, o florescimento da economia verde como paradigma planetário de produção e consumo. Aqui, exigem-se lideranças que rompam com a trágica tradição nacional de desperdiçar oportunidades.

Potência agroambiental, o Brasil tem um regime de chuvas privilegiado, que possibilita até três safras agrícolas anuais, e ainda contamos com uma gigantesca área territorial que nos permite avançar na produção sem necessidade de derrubar florestas nativas. Também estamos à frente do mundo na produção de energia elétrica limpa, com cerca de 87% da geração provinda de fontes renováveis. Nossos biomas são extremamente ricos, com a maior floresta tropical do planeta, a maior biodiversidade, 12% da água doce do mundo e com possibilidade de extração de metais essenciais para a transição energética, como lítio, cobre e níquel.

Nesse cenário, é preciso que tenhamos líderes com disposição para o conhecimento, ânimo para o debate, perspicácia para ler o passado, argúcia para enxergar o presente e grandeza para vislumbrar o futuro. Há muito o Brasil atravessa um deserto quanto ao surgimento de líderes que inspirem, pautem e ensejem vanguardas socioeconômicas e político-culturais. Uma demanda que, se não bastasse a nossa soma gigantesca de dívidas seculares, é radicalmente potencializada pelo tsunami multifatorial que redesenha o planeta – aqui e acolá, pois a agenda dos dias atuais coleciona desafios e oportunidades ímpares, demandando o protagonismo de líderes estratégicos na tarefa de construção de uma nova era histórica (Paulo Hartung é economista, presidente-executivo da IBÁ e foi governador do Estado do Espírito Santo; Estadão 5/9/23)

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