Em seminário sobre transição energética, estatal e BNDES reforçam defesa por exploração de petróleo na região.
Apesar das resistências da área ambiental do governo, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, afirmou nesta quarta-feira (11) que a estatal espera receber em 2024 licença para perfurar um poço em busca de petróleo na bacia da Foz do Amazonas.
A empresa vem fazendo grande campanha pública para a liberação da atividade e, nesta quarta, organizou evento com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para tratar do tema, no contexto do que o setor de petróleo passou a chamar de “transição energética justa”.
No evento, estatal e banco reforçaram o discurso de que a exploração da chamada margem equatorial brasileira é necessária para renovar as reservas brasileiras de petróleo e poderia contribuir com a preservação da floresta, ao direcionar recursos a iniciativas e conservação.
A estatal teve negado o primeiro pedido para perfurar no litoral do Amapá, área ainda não produtora de petróleo e considerada de grande sensibilidade ambiental. A empresa recorreu da negativa, mas o Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis) ainda não se manifestou.
Em outro pedido de licenciamento para a região da chamada margem equatorial, o Ibama autorizou a perfuração de poços na bacia Potiguar, no litoral do Rio Grande do Norte, área que já tem produção de petróleo.
A autorização foi celebrada pelo governo como um passo no sentido de liberar a exploração em toda a margem, mas a área ambiental do governo defende a necessidade de avaliação ambiental mais ampla para avaliar a atividade em áreas ainda virgens.
“Temos toda a expectativa de, ainda no primeiro semestre do ano que vem, ou mais tardar ao longo do ano, ir rumo ao Amapá”, afirmou Prates no evento conjunto com o BNDES, que quase não teve vozes contrárias à abertura de novas fronteiras de petróleo.
Prates alega ainda que a perfuração de um primeiro poço não significa necessariamente que a costa do Amapá terá produção de petróleo. Antes, afirmou, eventuais descobertas precisam ser dimensionadas com novos poços.
“E o Brasil precisará tomar a decisão, depois de confirmada a reserva, se quer produzir ou não”, continuou. “Se isso não acontecer agora, não acontecerá mais. E se não acontecer com a Petrobras, não acontecerá com ninguém mais.”
Além dos presidentes da Petrobras e do banco de fomento, foram convidados para falar sobre o tema o governador do Amapá, Clécio Luiz, o ex-diretor da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis) Allan Kardec Barros e o diretor-executivo do Instituto Escolhas, Sergio Leitão.
“É talvez a última grande fronteira de petróleo que a gente tem”, disse o presidente do banco estatal, Aloizio Mercadante. Ele defendeu que a Petrobras tem condições de explorar a região “com toda a segurança”. “Vamos estar juntos [com a Petrobras] na margem equatorial”, concluiu.
O governador do Amapá disse que a indústria do petróleo pode contribuir com a redução das desigualdades no estado, que “é campeão em indicadores ambientais, mas está nos últimos lugares em indicadores econômicos”.
“Esperamos que essa oportunidade possa se reverter em geração de emprego e renda”, disse, criticando que a decisão seja tomada por um “gabinete” e não pelo governo como um todo. “É disso que estão nos privando agora. Não se pode nem provar que o litoral do Amapá tem petróleo e gás.”
Os presidentes da Petrobras e do BNDES acenaram com recursos do petróleo para preservar a floresta, mas não explicaram como. Falaram em direcionamento das participações governamentais cobradas sobre a produção, embora mudanças na destinação dos royalties do petróleo demandem processos legislativos.
Eles defenderam ainda que os recursos da exploração da margem equatorial são necessários para financiar investimentos na transição para energias renováveis sem elevar imediatamente o custo final ao consumidor.
Única voz a levantar dúvidas no seminário desta quarta, o diretor-executivo do Instituto Escolhas questionou a falta de planos para o uso dos recursos do petróleo e para a própria transição energética nacional.
“Vamos levar quantos anos fazendo essa transição? E, ao final, qual a mudança de longo prazo vamos fazer?”, perguntou. “Se a gente não fizer essa conversa sobre o prazo, o início, o meio e o final, fico temendo que todos nos falemos sobre transição —e transição não haverá.” (Folha, 12/10/23)