Na COP28, Brasil pretende usar o mecanismo de arrecadação de recursos internacionais como cartão de visitas – e cobrar que países industrializados paguem mais para proteger a floresta.
Dinheiro, dinheiro e mais dinheiro: na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP28) em Dubai, que começa nesta quinta-feira (30/11) e segue até o dia 12 de dezembro, o foco está em como e por quem a adaptação às mudanças climáticas e a desaceleração do aquecimento global devem ser financiadas.
Nos meses que antecederam o evento, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou abertamente o que muitas nações em desenvolvimento e emergentes estão exigindo: os países industrializados têm uma “dívida com a humanidade” e devem pagar.
Essa assertividade aparece em um momento em que o mundo está de olho no Brasil. Depois de quatro anos negligenciando políticas ambientais sob o comando do ex-presidente Jair Bolsonaro, o país declarou sua intenção de recuperar sua posição perdida como líder na proteção climática.
Ajuda não apenas para a Amazônia
Agora, na CO28, o Brasil que impressionar com o Fundo Amazônia. O mecanismo, hoje principalmente financiado pela Noruega (cerca de 94%) e pela Alemanha (cerca de 6%), foi criado há 15 anos, em 1º de agosto de 2008, e revitalizado desde que Lula assumiu o terceiro mandato. Outros países, assim como a União Europeia, anunciaram que também farão doações ao fundo.
O que há de especial no Fundo Amazônia é que ele também apoia projetos de proteção climática fora do Brasil. Isso inclui, por exemplo, apoio financeiro e técnico para o monitoramento conjunto da floresta tropical via satélite em todos os países pelos quais ela se estende: Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Venezuela, Guiana e Suriname, além do Brasil.
Fora da América Latina, também estão sendo financiadas medidas de conservação em florestas tropicais ao longo do rio Mekong, na República do Congo e na República Democrática do Congo, bem como na Ilha de Bornéu.
“A cooperação Sul-Sul é possível e foi planejada desde o início”, explica à DW Nabil Moura Kadri, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que administra o fundo.
Primeiro o resultado, depois o dinheiro
O fundo é abastecido por doações que não precisam ser reembolsadas. De acordo com o próprio fundo, seu montante atual é de R$ 5,7 bilhões. Com as novas doações prometidas por Alemanha, Reino Unido, Dinamarca, Suíça, EUA e União Europeia, esse valor poderá dobrar.
O mecanismo de financiamento também difere de outros instrumentos importantes, como o Global Environment Facility (GEF) ou o Green Climate Fund (GCF). Isso porque o valor só é liberado se as metas acordadas com os doadores forem cumpridas.
Ou seja: o Brasil precisa provar que as taxas de desmatamento realmente caíram para poder sacar os recursos. O método funciona: entre 2008 e 2020, o desmatamento na região amazônica caiu de cerca de 13 mil para 4,5 mil quilômetros quadrados por ano, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
O Brasil é que decide
Em 2021, a destruição da Amazônia atingiu novamente a marca de 13 mil quilômetros quadrados. Desde que Lula assumiu o cargo em janeiro, porém, uma tendência de queda começa a surgir novamente.
De acordo com o INPE, em agosto de 2022 a julho de 2023, o desmatamento foi de 9 mil quilômetros quadrados, contra 11,5 mil quilômetros quadrados no mesmo período do ano anterior, uma queda de 22%.
Outra característica especial é a autonomia nacional do fundo. O próprio Brasil decide como os recursos serão utilizados. E isso simplifica a aprovação das solicitações de projetos, ao contrário dos mecanismos de financiamento internacionais, em que o Banco Mundial e a ONU estão envolvidos na implementação.
“O fundo é gerenciado inteiramente pelo Brasil, desde a seleção dos projetos até a alocação dos recursos”, enfatiza Kadri. “Os doadores não fazem parte do comitê organizador do fundo que decide sobre a seleção dos projetos.”
Sociedade civil tem voz
As organizações não-governamentais (ONGs) também veem o fundo como um instrumento flexível e eficiente. A sociedade civil está representada no comitê organizador, juntamente com membros dos estados e ministérios.
“O Fundo Amazônia é o instrumento mais importante para o Brasil obter financiamento internacional”, enfatiza Marcio Astrini, diretor do Observatório do Clima, uma rede de cerca de 90 ONGs brasileiras.
Trilhões para combustíveis fósseis
Apesar do sucesso na captação de recursos internacionais para projetos de proteção climática na Amazônia e em outras regiões de florestas tropicais, os combustíveis fósseis continuam tendo muito mais subsídios do que as energias renováveis. De acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), os subsídios para essa finalidade totalizaram um recorde de sete trilhões de dólares no ano passado.
Perto deste montante, os 100 bilhões de dólares planejados anualmente para o Green Climate Fund (GCF) parecem absolutamente modestos. E, na realidade, segundo o GCF, mesmo esse valor está muito longe de ser alcançado.
No final de outubro deste ano, o portfólio do GCF incluía um total de 13,5 bilhões de dólares em financiamento para 243 projetos em todo o mundo.
“Mesmo que o financiamento planejado chegue a 100 bilhões de dólares pela primeira vez este ano, isso ainda é muito pouco”, afirmou a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, em entrevista à DW. “Os investimentos para limitar o aquecimento global são insuficientes e os países industrializados não cumpriram suas promessas.”
Na próxima conferência mundial sobre o clima, o Brasil quer mostrar que as coisas podem ser feitas de forma diferente.
“Queremos mostrar em Dubai projetos de reflorestamento bem-sucedidos e o uso ecológico e produtivo das florestas tropicais”, afirmou Kadri, responsável pelo Fundo Amazônia no BNDES. “Estamos agora gerenciando 102 projetos” (DW, 29/11/23)