Por Vinicius Torres Freire
- EUA incluem produtos alimentícios brasileiros na lista do ‘destarifaço’ mundial
- Conversa sobre itens industriais e barreiras não tarifárias deve ser mais difícil
O Brasil enfim entrou no trem de corte de impostos de importação dos Estados Unidos, “tarifas”, o expresso da impopularidade de Donald Trump, diminuída por queixas a respeito do custo de vida. Com quase uma semana de atraso, o presidente americano cancelou aquele imposto extra de 40% sobre certos produtos brasileiros. Atraso: na sexta passada, Trump mandara reduzir a zero, para o mundo inteiro, Brasil inclusive, aquelas “tarifas recíprocas” de 10% sobre produtos alimentícios e fertilizantes.
Boa notícia, em termos. Além do “destarifaço” para carne de boi, café, certas frutas, outros produtos alimentícios e de peças e partes de aviões, o tom do decreto de Trump que anunciou o “destarifaço” parcial indica que as relações com o Brasil estão menos amargas. Trump ainda escreve que “…o alcance e a gravidade das políticas, práticas e ações recentes do governo do Brasil constituem ameaça incomum e extraordinária à segurança nacional, à política externa e à economia dos Estados Unidos”. Mas esse resumo dos dissabores foi reduzido e não indicou vontade de bater mais.
Um pouquinho menos animador também é que, nesse documento, Trump afirma apenas que as negociações dizem respeito ao decreto do tarifaço. Mas há vários contenciosos. Por exemplo, impostos majorados sobre outros produtos e o listão de queixas do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR), que menciona desde pirataria até o Pix, passando por corrupção, desmatamento ilegal, etanol etc.
Por um lado, certos produtos estão isentos do tarifaço. Bom para as empresas do setor. Por falar nisso, o valor das exportações de carne, café e frutas para o mundo inteiro vinha crescendo mesmo com as sanções americanas, em parte por aumento de preço (café), em parte também por aumento de quantidade exportada (caso de frutas e nozes). As empresas encontravam outros mercados.
Por outro lado, como a lista de produtos extratarifados é agora menor, em tese os americanos têm menos para conceder. A discussão a respeito dos impostos pode ficar relativamente mais difícil. O tarifaço é especialmente daninho para a indústria, como a de máquinas e equipamentos e de móveis e madeiras. Muitas dessas empresas vendem não apenas muito de sua produção para os EUA, mas vendem produtos talhados para os EUA.
É bom lembrar que Trump vai diminuindo tarifas no ritmo de queda de sua popularidade, abalada também pela volta relativa da carestia, que agrava uma situação de nível de preços elevados desde a epidemia. O aumento do salário médio do quarto mais pobre da população (3,5% ao ano) mal cobre a inflação anual (3%).
A inflação americana da comida está em 3,1% ao ano, em média. O preço do café moído no varejo aumentou 18,9% em um ano, até setembro, dado mais recente. O da carne de boi, 14,7%.
A impopularidade do presidente americano voltou a aumentar em meados de outubro. Nesta quinta, na média das pesquisas recentes calculada pelo Silver Bulletin, 55,6% dos americanos desaprovavam Trump (na posse, em janeiro, eram 40%). No caso do desempenho do governo quanto à inflação, a desaprovação era de 65%.
Não dá para dizer, pois, que mais este recuo de Trump tenha sido motivado por simpatia bilateral. Poderia ser pior, claro, se apenas os alimentos do Brasil continuassem sob tarifaço. Os EUA baixaram o tom. Mas as demais negociações vão longe e vão ser muito duras. Se por mais não fosse, Trump precisa levar um troféu para casa (Folha, 21/11/25)









