Mario Sergio Cutait, da MCassab, diz que o Ministério da Agricultura deve ser mais orientativo e menos limitativo.
O desafio do Brasil para os próximos anos será o de produzir mais, usando menos e a um custo acessível, tanto para o consumidor interno como para o externo.
O caminho é o da pesquisa e da inovação, uma vez que a competição pela matéria-prima entre alimentos para o ser humano, para animais e para energia renovável vai aumentar cada vez mais.
Esses desafios passam pela produção de alimentos saudáveis e com respeito ao meio ambiente. É assim que Mario Sergio Cutait, diretor e acionista da MCassab, vê o país nos próximos anos. A empresa, de capital nacional, se prepara para o seu centenário.
A produção seguirá crescendo, embora com volatilidade de custos e de preços, mas o país ganhará novos mercados.
Os avanços, no entanto, passam tanto pelas ações de governo como pelas de produtores e de indústrias.
Do lado do produtor, o empresário afirma que não há mais espaço para a mentalidade de que o país não precisa fazer mais nada porque os importadores de alimentos vão ter de recorrer ao Brasil para se alimentar.
Do lado das indústrias, os setores têm obrigação de municiar o governo, antecipando desafios e necessidades de política econômica.
Quanto aos novos governantes, o empresário já vê alguns desvios de percurso na esfera estadual, como a tributação no campo. Logística e segurança sanitária devem estar entre as prioridades.
Na área federal, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva deverá garantir segurança jurídica e da propriedade. Além disso, assegurar acessibilidade a novos mercados, ter presença com protagonismo nos fóruns internacionais, onde se discute sustentabilidade, e manter o equilíbrio fiscal.
A pandemia trouxe um cenário mais desafiador para as multinacionais. Elas estão revendo o conceito de megafábricas, instaladas principalmente em grandes mercados, como o da China, para abastecer o mundo todo.
A crise internacional na logística faz as empresas reverem esse conceito e pensar em fábricas regionais. Vão escolher países com estabilidade regulatória, logística eficiente, estabilidade tributária e custo de matéria-prima competitivo.
O Brasil precisa avançar nesses quesitos para se tornar um centro atrativo. “Senão, vamos continuar vendo ocorrer exatamente o contrário. Dói ver uma Ford indo embora do país”, afirma ele.
Cutait aposta no Brasil. A MCassab, voltada para a nutrição e saúde animal, está investindo R$ 170 milhões em Jarinu (SP). O novo complexo industrial ocupa uma área de 55 mil m² e dobra a capacidade anual de produção e de armazenamento do grupo.
Com a nova unidade industrial, a MCassab Nutrição e Saúde Animal quer dar um salto em especialidades, se dedicando ainda mais às pesquisas e ao desenvolvimento de produtos de alto valor agregado e de inovação. Apenas em laboratórios são 2.000 m² de área construída.
Cutait prevê uma forte evolução da demanda por proteínas, um setor que dá sustentação ao seu negócio.
O consumo no Brasil, hoje perto de cem kg por ano per capita, ainda tem espaço para crescer, e novos mercados externos vêm surgindo com força.
Alguns países, como Arábia Saudita, Rússia e China, estão em busca de uma autossuficiência, mas ainda vão continuar dependentes de produtos brasileiros.
O Brasil não pode esquecer o mercado chinês, mas a China também não pode ficar sem o mercado brasileiro. Somam-se a isso as portas que se abrem na Índia, na Indonésia, na Tailândia e nos países da África.
O diretor da MCassab diz que faz um investimento para longo prazo. Presente há quase duas décadas na Argentina e na China, o empresário aposta muito também no mercado indiano.
Ele vê uma necessidade de mudança de postura do estado na política econômica. Na avaliação da MCassab, o papel do governo deve ser orientativo para que os projetos industriais sejam adequados já no papel. Mas, ao contrário, o Estado mantém um papel limitativo.
O Ministério da Agricultura deveria ser mais orientador e menos fiscalizador. Se isso fosse colocado em prática, os custos seriam bem menores.
O governo tem de adotar planos de políticas de desenvolvimento de 20 anos, fazendo ajustes quando necessários. Onde plantar, tecnologias mais apropriadas, seguro rural, estimativas de demanda e outros pontos importantes, coisas que China e Estados Unidos fazem muito bem.
Para o empresário, hoje não há planejamento. Ele diz, no entanto, que é obrigação do setor privado levar para os órgãos públicos uma visão de futuro da atividade.
Já o governo deve delegar mais responsabilidade ao setor privado, principalmente no autocontrole. O setor público anda a uma velocidade de 100 km/h, e o setor privado, a 200 km/h. O setor público nunca vai acompanhar o privado.
“O autocontrole vai aumentar a responsabilidade das empresas, e é meu interesse atender a meus clientes com produtos seguros. Quero dormir tranquilo”, diz ele.
O agronegócio é um setor com vocação exportadora. Portanto, é necessária a abertura de novas portas para o produto brasileiro. E isso passa também por uma política de governo.
Estados Unidos, França e outros países que disputam o mercado internacional, quando estão em uma mesa de discussão, têm um especialista para cada setor. No caso brasileiro, um técnico tem de dominar todas as áreas.
O importante para empresas e para o país é não depender de um único produto e de um só mercado, afirma o empresário (Folha de S.Paulo, 29/11/22)