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Agro no SXSW: a próxima revolução alimentar será neutra em carbono

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Por Vera Ondei

Saiba o que pensam três mulheres, a pecuarista Corey Carman, e as empreendedoras Alexia Akbay e Ann Radil, sobre o desafio no estabelecimento de uma nova rota alimentar

“O que realmente me inspira é a relação que temos com a terra e como administramos o solo e a importância de seu entorno, como meio de solução para a redução dos riscos climáticos”, disse a pecuarista Corey Carman, do Rancho Carman, em Wallowa, Oregon, que assumiu em 2003 a centenária fazenda de gado da família. “Mas não estamos conversando sobre como os animais podem – e como o gado, em particular, pode – fazer parte da terra, como podemos gerenciá-los de forma a ajudar a sequestrar carbono para melhorar sua função ecológica, porque estamos muito focados nesta questão das emissões de metano.”

Corey foi uma das três mulheres que integraram a mesa “Carbon Neutral Beef? Too Good to be True?”, para falar sobre o futuro da carne bovina e o futuro da inovação nessa atividade, durante o

SXWS (South by Southwest 2023), um dos principais festivais dos EUA, que começou no dia 10 e termina neste domingo (19). O festival, que começou com filmes e músicas, passou para economia digital e nos últimos anos expandiu sua agenda de temas diversos. Entre eles, a alimentação e os desafios climáticos entraram definitivamente no roteiro do festival. A mesa sobre a pecuária e seus impactos na emissão de metano foi uma das que provocaram na plateia as indagações mais acaloradas.

Para Ann Radil, head de Carbon Reduction na Neutral Foods, a primeira empresa de alimentos neutra em carbono nos Estados Unidos, que trabalha com projetos e implementação estratégica para a descarbonização, o papel da pecuária na mitigação e adaptação aos efeitos das mudanças climáticas precisa de mais canais de comunicação. “O ponto crucial da crise climática é nossa dependência de combustíveis fósseis, mas é claro que a agropecuária é uma parte realmente importante a desempenhar no painel governamental e na mudança climática, até porque ela está associada a mudanças no uso da terra”, afirma Radil. “Nosso sistema alimentar contribui com até 37% das emissões globais de gases de efeito estufa. Essa é a contabilidade mais holística e isso impulsiona muito nosso trabalho em busca de alimentos neutros.”

Ela também afirma que a pecuária, ao contrário de outros setores de emissão pesada de GEEs (gases de efeito estufa), pode desenvolver um portfólio de projetos nas propriedades rurais com alcance real de redução da pegada de carbono em suas operações, por exemplo, mudando a dieta dos bovinos, o destino dos dejetos, entre outros caminhos. “Nós temos soluções que podem gerar uma série de co-benefícios para os produtores. Portanto, além de reduzir ou remover os gases de efeito estufa, eles podem impactar positivamente outros aspectos das operações do agro e de sua lucratividade”, diz Radil.

Hoje, as atividades agrícolas são consideradas uma fonte significativa de emissões com grandes oportunidades de mitigação. Nos EUA, por exemplo, a pecuária é a maior fonte de metano. Esse gás é chamado de poluente de curto prazo que, quando ativo na atmosfera, retém 85 vezes mais calor do que o dióxido de carbono. Portanto, os cientistas do clima dizem que mitigar o metano é o caminho mais próximo de atingir objetivos de redução de gases, como se fosse a “bala de prata” para manter vivos os objetivos do Acordo de Paris ou limitar o aquecimento global a um grau e meio.

Isso deve ser uma moeda de troca. E mais ainda nessa relação, “com o metano, a mitigação é diferente dos demais gases, o que daria mais tempo para investir e acelerar outras soluções para reduzir as emissões de gases de efeito estufa mais duradouras, como o dióxido de carbono, por exemplo”, afirma ela. “A agropecuária é, realmente, a única capaz de salvar o planeta mais rapidamente, pois pode ser um sumidouro líquido de carbono ou as terras agrícolas podem ser operadas de forma a gerenciar carbono armazenado por muito tempo, em termos de vegetação e solos.”

Alexia Akbay, fundadora e CEO da Symbrosia, uma startup de tecnologia limpa fundada em 2018, que trabalha para reduzir as emissões de metano do gado por meio do emprego de algas marinhas na dieta animal, explicou para uma plateia leiga o que é o tal do metano entérico, ou seja o resultado em gases, quando bovinos, animais de corte e vacas leiteiras, ovelhas e cabras ao digerir forragem ou qualquer outra fonte de alimentação, como os grãos. “Eles têm um sistema estomacal de quatro câmaras que inclui uma etapa de fermentação e, como subproduto dessa fermentação, expelem metano”, afirma. “Isso é, também, uma grande perda de energia. Assim, cerca de 20% da energia alimentar consumida é perdida em metano.”

Daí a atual procura por aditivos alimentares, como vêm buscando uma série de empresas no mundo. No caso da Symbrosia, o início se deu em 2016, com um grupo de pesquisadores da Austrália que traçou o perfil de várias algas marinhas diferentes como um aditivo alimentar para o gado e descobriu que uma espécie em particular, chamada Asparagopsis taxiformis poderia reduzir as emissões de metano entérico em mais de 80% no gado de corte e em vacas leiteiras, e também melhorar a eficiência ao fornecer mais de 90 micronutrientes ao gado. Desde então, a startup está tentando escalar o produto e pesquisando seus impactos na dieta animal.

Akbay afirma que há muitas soluções de mitigação nos dias atuais e “isso é uma ótima notícia”. Mas, para ela, há um desafio imenso para os produtores dispostos a fazer a transição para níveis mais baixos de emissões, porque nenhuma prática por ora conseguiu encontrar o que é o ponto neutro de gases. E mais, a sociedade tem dificuldade em entender o que isso significa. “As pessoas querem, cada vez mais, fazer algo para limitar sua pegada de carbono e são instruídas a reciclar sua garrafa plástica de água ou comprar um Tesla como seu próximo veículo”, afirma. Para ela, há todo um segmento de indivíduos em que a comida é tão autodefinida quanto essencial, mas que estão à margem quando se trata de escolhas.

“Imaginamos que comprar um litro de leite, vindo de um sistema alimentar melhor para todos nós, precisa fazer parte também desse perfil de comprador”. Para Radil, no entanto, há cada vez mais dados para mostrar que as próximas gerações estão dispostas a pagar mais por produtos sustentáveis. Ou seja, há um mercado à vista. “As pessoas, quando vão ao supermercado, têm de tomar decisões. Haverá a decisão entre a opção neutra em carbono ou uma não neutro carbono.”

Carman, a pecuarista do Oregon, está fornecendo algas na dieta de seus bovinos criados a pasto, acreditando que esse é um movimento sem volta. Ela faz parte de um grupo de 10 pecuaristas que ocupam uma área de 8 mil hectares em sua região, e que vêm trabalhando para mostrar que a integração dos bovinos com a natureza traz benefícios à sociedade. O foco é a recuperação de solo, bem-estar animal e sequestro de carbono, enquanto produz carne bovina. Para esse grupo – nadando contra a corrente de que o gado é parte do problema –, gado pode fazer parte do conjunto de soluções. “A realidade é que o gado faz parte dos sistemas ecológicos, então há uma interação realmente crítica entre a terra, os humanos e os animais, e que são muito antigos.”

Para ela, produtores e sociedade precisam conversar mais sobre essa administração da terra e a sua importância como uma solução de sustentabilidade. “Tenho um rancho que está na minha família há mais de 100 anos. Então ele é o meu primeiro amor”, disse ela ao explicar o motivo de seu atual engajamento para tornar sua pecuária cada vez mais sustentável. “Minha filosofia sempre foi que nós, produtores, somos uma espécie de coalizão da vontade. Nosso grupo tem algumas coisas em comum: são inovadores, progressivos, curiosos sobre o que podem fazer e também são líderes em sua comunidade. Isso faz parte da nossa teoria da mudança, se a gente quer colocar a pecuária como uma indústria muito visível” (Forbes, 17/3/23)

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