Por Arnaldo Luiz Corrêa
O mercado de açúcar em NY continua com aquela concepção altista como se não houvesse amanhã. Repetidamente temos falado que os componentes do tripé que sustenta essa alta são: a posição comprada dos fundos, construída há alguns meses e exitosa financeiramente; a ausência das usinas como contraparte do apetite insaciável dos fundos, por elas já terem fixado grande parte do volume de produção destinada à exportação e, por último, mas não menos importante, o fato ignorado por muitos analistas de que os consumidores finais de açúcar postergaram suas compras e/ou reposição dos estoques apostando que a entrada maciça de açúcar no início da safra do Centro-Sul iria colocar os preços no lugar que faz sentido.
NY encerrou a semana cotado a 21.14 centavos de dólar por libra-peso para o vencimento maio/23, variando 22 pontos ou quase 5 dólares por tonelada, em relação ao fechamento da semana anterior. Os demais meses fecharam com altas semanais entre 28 e 42 pontos, de 6 a 9 dólares por tonelada.
A manutenção do preço do açúcar em NY nos atuais níveis elevados vai depender, no entanto, de outros fatores: o preço do petróleo no mercado internacional, por exemplo, precisa se apreciar para se contrapor à valorização esperada do real frente à moeda americana. O Brasil oferece juros reais acima de 7% ao ano e é apenas natural que o fluxo positivo de recursos estrangeiros venha em abundância e valorize o real com a sólida entrada de dólares. O hidratado só ganha competitividade em relação à gasolina se o petróleo se valorizar mais do que o real. Hoje, a paridade da gasolina com o etanol faz com que o consumidor “esqueça” o combustível renovável e abasteça com a gasolina mais competitiva. Com o hidratado fora de jogo as usinas vão maximizar a produção de açúcar.
Prefiro não levantar a hipótese de intervenção do governo federal na formação de preços do combustível. Qualquer política de preços que seja considerada como deletéria abre a possibilidade de ações judiciais por parte dos acionistas estrangeiros junto à SEC, a CVM americana, como já ocorrera no passado. Nenhum dirigente vai querer colocar seu CPF na reta uma vez que diretores estatutários e o conselho podem ser responsabilizadas por gestão temerária. O que Lula esbraveja nos palanques que habita para a sua plateia de beócios encantados é uma coisa completamente diferente do que lhe impõe a realidade.
Voltando ao mercado de açúcar, desde junho do ano passado que o mercado de energia sofre enormes perdas. Petróleo dos tipos WTI e Brent, bem como a gasolina tem perdas acumuladas de 18%, 16% e 12% respectivamente. No mesmo período, o açúcar subiu 28%. Alguma coisa parece estar fora do lugar.
O início da safra no Centro-Sul deverá dar o tom do mercado. Se houver efetivamente a percepção de que a disponibilidade de açúcar está comprometida, isso estará refletido imediatamente no basis (prêmio que o físico paga sobre o valor negociado na bolsa). Isso ocorre porque para o consumidor industrial não adianta comprar a bolsa, ele quer o açúcar para poder processar seu produto. Preços altos na bolsa não necessariamente implicam em preços altos no físico. Vide o início de 2006.
Alguém pode argumentar que os spreads negociados em NY espelham bem essa situação. Contudo, essa afirmação seria verdadeira se a curva do real não apresentasse um prêmio tão alto ao longo do tempo. A diferença entre os juros internos e os juros externos faz com que os bancos ofereçam mais reais por US$ aos exportadores ao longo do tempo. Esses reais adicionais pressionam a curva de açúcar em centavos de dólar por libra-peso. Caso não houvesse diferença entre as duas taxas de juros o mercado futuro de açúcar ainda mostraria uma curva invertida (nesse caso refletindo apenas a oferta demanda do produto), mas não tão descontada como a existente.
A preocupação atual de 10 entre 10 usineiros é acerca do preço do hidratado. O enorme desconto mostrado pelo mercado não vai impedir que o produto seja negociado. As usinas menos capitalizadas precisam fazer dinheiro para atender aos compromissos de início de safra enquanto as mais abastadas vão deixar o etanol no tanque. Mas, não há a menor dúvida que a prioridade é aumentar a produção de açúcar.
Até que haja açúcar do Centro-Sul disponível no sistema, um gestor de fundo sentado numa montanha de dinheiro tem todas as ferramentas necessárias para adicionar mais gasolina na fogueira. Não sei se vocês notaram, mas nas últimas semanas vimos o mercado experimentar picos de preços provocados por ordens volumosas colocadas em curto intervalo de tempo. Alguém acredita que os fundamentos mudaram naqueles breves segundos? Claro que não. Por isso, o mercado pode subir um pouco mais antes de realizar. A bola está com os fundos.
O aperto do crédito provocado pelo efeito Americanas dificultou a renovação integral de empréstimos vencidos recentemente de algumas usinas juntos às instituições financeiras, situação que pode piorar com a contaminação da quebra do banco SVB nos Estados Unidos, a maior desde 2008, fechado pelos reguladores daquele país. Usina descapitalizada vai vender etanol a qualquer preço.
O aumento nas taxas de juros para controlar a inflação ocorre em vários países desenvolvidos. A tônica das empresas é a redução de custos e a otimização dos estoques. O consumo das famílias diminui e a indústria vai comprar da mão para a boca. Com esse cenário, caros leitores, fica complicado acreditar num mercado em alta. Mas, os fundos dão a bola.
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