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Açúcar: Tempos tenebrosos

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Por Arnaldo Luiz Corrêa

A invasão da Ucrânia perpetrada pela Rússia está sendo considerada por muitos especialistas em relações internacionais como uma das maiores rupturas no cenário mundial desde a Segunda Guerra, trazendo temor e perplexidade ao Ocidente similares aos ataques terroristas em território americano ocorridos em 11 de setembro de 2001.

Situações de estresse chacoalham os mercados financeiros mundiais e a tendência dos investidores é fugir o quanto antes dos ativos de risco aportando seus recursos em portos mais seguros. Espera-se uma onda de problemas atingindo principalmente os mercados de grãos e de energia que vivenciaram imensa volatilidade nessa semana com aumentos dramáticos nos preços dos ativos, exigindo dos CFOs das tradings e usinas enorme empenho para honrarem as chamadas de margem. Todos sabemos o que o estresse de caixa (chamada de margem) representa nos mercados intensificando seu movimento e resultando em preços que normalmente exageram na alta ou na queda.

No acumulado do ano, pelas cotações da última sexta-feira, a gasolina subiu 30%, enquanto o petróleo tipo Brent (usado como referência para a Petrobras) subiu 27% e o tipo WTI 22%. Todo o complexo soja (grão, farelo e óleo) subiu em média 17% enquanto o milho subiu 11% e o trigo 12%.

Vem mais inflação por aí. E em nível mundial. E seguindo a inflação virão os aumentos nas taxas de juros, tanto lá fora quanto aqui dentro, criando um cenário de muita dúvida acerca da tão aguardada recuperação da economia global.

Com a economia mais lenta, mais inflação e a queda do poder aquisitivo é natural pressupor que os consumidores industriais continuarão inseguros quanto a formação de estoques e deverão manter a estratégia de comprar da mão pra boca, como se diz no jargão do mercado. Mais estoque na mão dos produtores, mais pressão nos spreads e nas curvas de preço. É quando o mercado vai para o carrego.

As implicações diretas no açúcar serão sentidas conforme a evolução dos acontecimentos. A Europa deve assistir a uma elevação no custo de produção do açúcar de beterraba, que tem no gás natural (cujo preço subiu 20% este ano !!) um componente relevante na formação do preço.

Uma contínua e expressiva elevação do preço do petróleo, que chegou a bater 102.62 dólares por barril e já marca 46.5% de alta em doze meses, pode acelerar o programa de etanol na Índia e, por conseguinte, redirecionar mais cana para a produção do combustível em detrimento do açúcar, diminuindo a disponibilidade do produto internamente, reduzindo estoques, fortalecendo o mercado interno e deixando a exportação mais residual. Por enquanto, estamos apenas conjecturando.

Aqui no Brasil, o setor sucroalcooleiro espera ansiosamente que a Petrobras ajuste os preços da gasolina na refinaria. Com a subida da gasolina no mercado internacional, a defasagem hoje está em 15%, mas chegou a 20% esta semana.

As volatilidades do real e do petróleo combinadas tornam difícil para a estatal brasileira estabelecer uma política de reajuste de preços que combine adequadamente a manutenção da margem, a preservação da participação dela no mercado e redução dos espasmos criados pela enorme volatilidade. Difícil.

A demanda de etanol internamente está fraca e o estoque é grande, segundo os números publicados pela UNICA. Sem o reajuste da Petrobras, o mercado de etanol está no limbo. O preço médio de fevereiro já está 12% abaixo do preço médio de janeiro e 22% abaixo da média de novembro/21. No mesmo período, açúcar para exportação convertido em reais por tonelada pela cotação de NY caiu 7% e 13.5%, respectivamente. Sem dúvida que o etanol sofreu mais.

Em NY, o mercado de açúcar encerrou a semana com o vencimento março (que expira na segunda-feira) a 17.99 centavos de dólar por libra-peso, 21 pontos de queda em relação à semana anterior. O mercado físico tem sido um não-evento. Maio/22, que passa a ser o primeiro mês de negociação, encerrou a semana basicamente inalterado, cotado a 17.64 centavos de dólar por libra-peso seguido pelos vencimentos até outubro de 2024, que mostraram variações negativas de até 15 pontos. Nada de extraordinário para reportar.

O real, depois de ficar abaixo de R$ 5,0000 por um brevíssimo período de tempo, encerrou a semana cotado a R$ 5,1500 variando apenas 0.26% na semana. Os vencimentos de NY convertidos em reais por tonelada, fecharam rigorosamente inalterados.

Qualquer opinião sobre qual o desfecho da ocupação russa na Ucrânia é prematura e corre o risco de entrar para o anedotário. Só tem uma pessoa que sabe o que vai acontecer: Putin. Mas, esse é o momento em que eu aproveito para tocar num assunto que tenho perseverado em dezenas de vezes nesse espaço. É o risco de cauda.

Imagine o impacto que poderemos ter no custo de produção do açúcar se o preço dos insumos (muitos deles vindos dos dois países em conflito) explodir. A gestão de risco tem um capitulo especial que são os eventos não esperados, as armadilhas que o mercado nos prega. Temos que ter sempre isso em mente: se proteger do improvável.

Há seis meses, entre as sugestões que demos aos clientes como operações que objetivavam proteger o improvável (cisne negro) estava a compra de uma opção de compra fora-do-dinheiro de petróleo a US$ 100 o barril para vencimento maio/22. Naquela época o petróleo negociava US$ 70 o barril. Ninguém imaginava que fosse chegar a US$ 100. É sempre assim.

Nossa estimativa de fixação de preços do açúcar para exportação aponta que, com base nos dados até 31 de janeiro de 2022, as usinas já fixaram 16.3 milhões de toneladas para a safra 22/23, representando um percentual de 64% do total estimado de exportação de açúcar para a safra que se inicia em abril. O preço médio apurado até o momento é de 16.75 centavos de dólar por libra-peso, sem prêmio de polarização, equivalentes a R$ 2,178 por tonelada FOB Santos, ou R$ 0,9480 por libra-peso, ambas incluindo o prêmio de polarização. Para a safra 2023/24 acreditamos que 12% das exportações para aquele período já estavam fixadas até 31 de janeiro.

Quem leu o best-seller “Homo Deus”, escrito em 2015 pelo professor Yuval Noah Harari, PhD em história pela Universidade de Oxford, certamente ficou animado com as perspectivas futuras da humanidade traçadas pelo autor. Segundo ele, a morte seria apenas um problema técnico já que a medicina avançaria de tal forma que nós nos tornaríamos amortais; também afirmara que a guerra se tornaria completamente obsoleta e as pandemias seriam definitivamente um assunto do passado. Infelizmente para nós – mortais – Hariri já errou nas duas últimas (Arnaldo Luiz Corrêa é diretor da Archer Consulting – Assessoria em Mercados de Futuros, Opções e Derivativos Ltda.)

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