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Açúcar: O índice do medo está nas alturas

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Por Arnaldo Luiz Corrêa

O mercado de açúcar em NY assistiu na última segunda-feira ao vencimento do contrato futuro de março/22, que resultou numa volumosa entrega física de 1.34 milhão de toneladas de açúcar. O que motiva um produtor/trading/exportador entregar seu produto na expiração de um contrato negociado em bolsa é – principalmente – porque ela apresentava a melhor oferta de compra no momento da tomada de decisão por parte do vendedor. Simples assim.

O contrato de açúcar da Bolsa de NY (ICE) determina que aquele preço negociado na bolsa precifica a entrega física do produto livre a bordo do navio do comprador/recebedor no porto do país de origem do açúcar. Pelas normas da Bolsa, o recebedor tem até 75 dias para nomear o navio e carregar o açúcar que decidiu receber. De maneira simplista, o vendedor/entregador compara o custo financeiro e a armazenagem nesse período com o desconto (basis) que o mercado físico negocia e opta por aquele que lhe dá melhor resultado. Mas, em geral, entregas volumosas indicam mercado físico fraco.

No entanto, existem outros lados nessa visão como o provável jogo do spread, negociação que envolve a compra e venda simultânea de um mesmo contrato futuro com vencimentos diferentes. O vendedor do spread (vendeu o março e comprou o maio) entregou o açúcar e acredita que o preço do maio vai subir para ele adicionar valor à venda original, quando liquidar essa última ponta da operação. É claro que há risco envolvido, mas é um risco que tem lastro na análise fundamentalista. E quem fez, tá rindo a caminho do banco.

Ocorre que quase que simultaneamente à expiração do contrato, deu-se a invasão russa na Ucrânia que fez explodir o mercado de energia e por contaminação o mercado de açúcar.

A vigorosa alta do açúcar, com o vencimento maio/22 encerrando a sexta-feira a 19.38 centavos de dólar por libra-peso, em nada tem a ver com a entrega, mas com uma série de desdobramentos que advieram do conflito no leste europeu. Siga comigo.

No acumulado do ano, a gasolina (RBOB) subiu 58.52% seguida de perto pelo trigo 56.86% e o óleo de soja 28%. Apenas esses três casos de elevação acentuada nos preços são suficientes para acreditar que a inflação de energia e alimentos vai sair do controle em grande parte dos países. Aqui no Brasil, podemos esperar que o Banco Central eleve os juros além do nível de 12.25% ao ano aguardado pelo mercado. Nível mais alto dos juros altera a inclinação da curva do câmbio propiciando mais reais por tonelada para quem fizer o hedge de venda do açúcar para a safra 23/24, por exemplo. Mas, não é só isso.

Ainda não se sabe qual o efeito da guerra (nem sua duração) na disponibilidade de fertilizantes. A ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Tereza Cristina, garantiu que o Brasil tem fertilizantes até outubro. Segundo a Associação Nacional para Difusão de Adubos, esse estoque termina em três meses. Um usineiro me disse que conversou com dezenas de empresas de fertilizantes e nenhuma foi capaz de lhe vender o produto que queria por falta de estoque. Qual será a consequência da falta de químicos na safra 23/24?

É espantoso como o mercado pode mudar da direção que discutíamos aqui há 2-3 meses. Entendíamos que o açúcar teria enormes dificuldades em ultrapassar os 20 centavos de dólar por libra-peso este ano, assunto que dominou nosso último comentário de 2021, mas o imponderável entrou em cena embaraçando ainda mais o processo decisório. Pode chegar aos 20? Ainda acho difícil, mas os fatores exógenos aumentaram seu peso na equação.

Entendo que essa safra que se inicia em breve trará melhor rentabilidade para o etanol. As usinas estão bastante comprometidas no açúcar de exportação (já fixadas acima de 65%) encurtando a capacidade de mudarem o mix. A Petrobras deverá ajustar o preço da gasolina uma vez que ele está 45% abaixo da paridade internacional. Erraram grosseiramente em espaçar os aumentos de preço e agora estão encurralados no canto do ringue.

Se repassarem integralmente o aumento, ele vai representar aproximadamente 18% de aumento do preço do combustível para o consumidor. Ainda que o aumento seja menor, existe grande espaço para o etanol recuperar a paridade com a gasolina e as vendas devem melhorar. Pelos nossos cálculos, o hidratado precisa subir R$ 0,20 por litro para encostar no açúcar.

Para a safra 22/23 que se inicia, acreditamos na estabilidade da oferta e demanda mundial do açúcar. O mundo está bem abastecido da commodity. Não antevemos sobressaltos. Veja a Índia, por exemplo. Dissemos neste espaço que não acreditávamos no número de exportação de 6 milhões de toneladas de açúcar, para esta safra, que eles estavam afirmando. Nossa projeção era de pelo menos 7.2 milhões de toneladas, volume igual à safra anterior. Pois bem, nesta sexta-feira eles revisaram a estimativa do volume de exportação para 7.5 milhões de toneladas de acordo com a ISMA, principal organização açucareira daquele país. Outra coisa: a rúpia se desvalorizou frente ao dólar o que indica que eles podem vender mais barato em centavos de dólar por libra-peso.

Bem, mas o mercado subiu e os fundos estão voltando. Será que o açúcar não vai retomar os níveis mais altos vistos no último trimestre de 2021? É possível. A apreensão de um movimento inflacionário acentuado no mundo provoca uma corrida para as commodities que possuem a reputação junto aos investidores de servirem como proteção à inflação. Mas, por outro lado, a guerra provoca uma fuga dos ativos de risco, entre eles as commodities. Essa incompatibilidade de situações cria muita volatilidade. O índice VIX, negociado em Chicago reflete a expectativa de volatilidade dos mercados e – sem surpresa – foi o ativo que mais subiu este ano – 62%. Volatilidade, como se sabe, é a medida da incerteza e o VIX é conhecido como sendo o índice de medo do mercado.

Se eu pudesse resumir em duas linhas o prolegômeno acima, eu diria que as usinas podem esperar um pouco mais antes de fixar açúcar de exportação para a safra 23/24, mas se quiserem fixar, comprem opção de compra fora-do-dinheiro.  

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