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Açúcar: Fatos e Versões

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Por Arnaldo Luiz Corrêa

No Brasil de Lula, a versão é muito mais importante do que o fato. É fato, por exemplo, que o mercado de energia tem derretido mundo afora com o excesso de oferta de petróleo e potencializado pelo crescimento da inflação global e a explosão nas taxas de juros que reprimem o consumo. Para colocar números nessa narrativa, veja o que ocorreu com o mercado de energia nos últimos doze meses: o gás natural evaporou 72%, enquanto o petróleo tipos WTI e Brent (que serve de referencia para a Petrobras) encolheram 32% e 30%, respectivamente. A gasolina RBOB minguou 31% enquanto o milho encolheu 29%. Aqui ao sul do Equador, a moeda brasileira, numa combinação de fatores internos e externos valorizou-se frente à moeda norte-americana. Esses são os fatos. Inexoráveis.

A versão engendrada pela equipe do anacrônico presidente da república, após o anúncio da redução no preço dos combustíveis pela Petrobras, é que finalmente o Brasil está abrasileirando o preço da gasolina. Pura invencionice fabricada na cabeça oca do presidente e aplaudida pela horda de incautos do seu partido. A redução de preços dos combustíveis já estava pronta em razão dos elementos acima mencionados. Ou seja, o preço foi reduzido porque a paridade internacional assim o permitia e fim de papo. O que o governo fez foi aproveitar a situação e colocar uma roupagem que saísse melhor para a apetência de Lula por um populismo de terceira categoria.

O problema é a percepção que o mercado tem em relação a quão lesiva pode ser essa mudança na formação de preços para o setor sucroalcooleiro. Por um lado, mudanças estruturais na formação de preço, abandonando a paridade de preços internacionais, vão contra os princípios de governança e conformidade dentro da empresa, que não se cansa de emitir comunicados sempre que alguém de fora do seu círculo – como o ministro da Fazenda, por exemplo – emita opiniões disparatadas. Por outro, o comando da empresa sabe muito bem que uma eventual política de preços que prejudique os acionistas vai trazer enormes problemas jurídicos para ela e seus dirigentes. Quem vai querer colocar o seu CPF na reta?

No fundo, o presidente da Petrobras, espertamente aproveitando a queda do petróleo no mercado internacional, anuncia a redução no preço dos combustíveis escondendo o real motivo (o derretimento dos preços lá fora) passando a mão na cabeça de Lula, como se ele estivesse apenas cumprindo ordens do chefe. O importante é a versão. Quero ver essa valentia toda dessa gente quando o petróleo subir de preço. Causa espécie como o Brasil consegue sobreviver tendo tanto tempo no poder central ora boçais natos, ora pascácios ululantes.

Para o setor o quadro global de energia é desanimador. O hidratado derrete ao negociar com insólito desconto de 10 centavos de dólar por libra-peso em relação ao açúcar. Esse é um enorme contratempo para as usinas. Uma parte do mix produz 700 pontos de margem positiva enquanto a outra parte impinge margem negativa de 400 pontos. Dependendo do mix de produção e de quão eficiente for a gestão de risco, um ano que propalava generosos lucros pode se revelar num enorme desapontamento.

E o açúcar em NY recuou quase 200 pontos da máxima. O mercado futuro em NY encerrou o pregão de sexta-feira com o vencimento julho/23 cotado a 25.80 centavos de dólar por libra-peso, uma redução de 42 pontos na semana, equivalentes a pouco mais de nove dólares por tonelada. Os meses com vencimentos mais curtos caíram mais. Para quem está de olho no hedge para as próximas safras, a queda de NY foi praticamente compensada pela desvalorização de 1.5% do real na semana, fechando próximo dos R$ 5,0000.

Os fundos reduziram a posição comprada em apenas 2.600 contratos, mas estão sentados em quase 216.000 lotes, segundo o COT (Commitment Of Trades), relatório dos comitentes, publicado pelo CFTC (Commodity Futures Trading Commission), agência independente do governo dos Estados Unidos, que regula os mercados de futuros e opções das commodities, nesta sexta-feira. Comenta-se que muitas usinas aceleraram as fixações para a safra 2024/25, cujo volume total ainda não apuramos, mas o mercado acredita que esteja em torno de 10-15%.

O CBIO (Crédito de Descarbonização) negociado na B3 alcançou R$ 111,90 (equivalentes a 55 pontos em NY), uma alta expressiva de 12% na semana, indicando que o mercado está assumindo que as usinas irão produzir o máximo de açúcar possível e o hidratado pode ter reduzida sua disponibilidade. O CBIO é um bom indicador dessa tendencia.

Enquanto todo o mercado de açúcar olha pra cima, com gente apostando até e preços acima de 60 centavos de dólar por libra-peso (não, não é erro de impressão! É isso mesmo: 60 centavos de dólar por libra-peso), a safra de cana no Centro-Sul apresenta um desempenho 18.8% melhor do que o ano passado. “Ah, mas estamos apenas no começo”, murmuram os altistas. O fato é que estamos moendo mais com ATR 2.5% melhor.

Num cenário normal, sem percalços climáticos, podemos ver elevada a produção de cana no Centro-Sul para além de 600 milhões de toneladas de cana. Além disso, os bons preços e a queda dos insumos vão propiciar melhores cuidados culturais nos canaviais e quem sabe uma safra ainda maior para 2024/2025. Não é sem razão que estamos vendo maior celeridade nas fixações para o ano que vem. A razão é simples: menos reais ao longo da curva futura de dólar, via NDF (Non-Deliverable Forward), um contrato a termo de moeda com liquidação financeira, decorrentes da expectativa de redução na taxa de juros internamente.

O preço médio de fechamento dos vencimentos julho/23, outubro/23 e março/24, que compõem a safra 23/24 do Centro-Sul, nesta sexta-feira foi de 25,45 centavos de dólar por libra-peso. Para a 24/25 é uma perda de 72 dólares por tonelada. Na 25/26, uma perda adicional de 64 dólares por tonelada. Ou seja, em duas safras, o preço cai mais de 135 dólares por tonelada (675 reais por tonelada). Vamos precisar de muita narrativa para elevar os preços futuros. E isso também é fato.

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