Sem sinal do fim do conflito, especialistas acreditam que os preços devem continuar elevados pelo menos até o meio do ano, quando os produtores rurais começam a comprar insumos para a próxima safra.
Os preços dos adubos importados acumulam alta de até 53% no Brasil desde o início da guerra entre Rússia e Ucrânia, há cerca de dois meses. O impacto varia a depender do nutriente, mas o ponto comum é o fato de que nenhum dos principais produtos aplicados nas lavouras passou ileso da volatilidade do mercado global de fertilizantes. A perspectiva é de que as cotações permaneçam elevadas, próximas ao patamar atual, pelo menos no médio prazo, segundo analistas de mercado.
De 24 de fevereiro, início da invasão russa ao território ucraniano, até a última quinta-feira, 21, o preço do cloreto de potássio (KCl) importado aumentou 53%, de acordo com levantamento divulgado pela consultoria StoneX. Na data, o KCl atingiu US$ 1.208,30 por tonelada no Brasil.
Já o valor praticado da ureia, referência para nitrogenados, avançou 46% na mesma base comparativa, para US$ 856,70 por tonelada. O fosfato monoâmonico (MAP) subiu 39% na mesma base comparativa, para US$ 1.253,30 por tonelada.
Os dados são os mais recentes do mercado e atualizados semanalmente. “O impacto nos preços é inevitável porque a Rússia representa 16% do mercado global de fertilizantes, o que significa tirar uma fatia relevante de oferta”, avalia o diretor de Fertilizantes da StoneX, Marcelo Mello.
O reflexo nos preços deve-se à elevada participação da Rússia no mercado global de adubos e das consequentes incertezas sobre a capacidade do país de manter suas exportações em meio à guerra. A Rússia é o segundo maior exportador de nitrogenados do mundo e terceiro maior exportador global de fosfatados e potássicos, com participação de 16% no mercado global de adubos.
Para o Brasil, a Rússia fornece aproximadamente 22% do volume de fertilizantes consumidos e é a principal origem das importações.
Analista de Insumos do Rabobank Brasil, Bruno Fonseca aponta que o dólar contribuiu para amenizar a alta das cotações nas últimas semanas. De acordo com ele, houve uma desaceleração após os preços dispararem no início do conflito e baterem recordes sucessivos. “As cotações estão subindo menos porque tendem a atingir certo patamar que derruba a demanda. Há um limite na demanda para aumento dos preços”, disse.
Preços elevados
Entretanto, sem sinais de um cessar-fogo entre os países do Leste Europeu, a perspectiva é de que as cotações internacionais dos adubos continuem próximas ao patamar atual. “Há uma boa parcela de oferta ‘fora’ do mercado, o que vai sustentar o preço até meados de junho e julho ou enquanto as sanções estiverem vigentes. Para o potássio, ainda há fôlego para subir mais em virtude da ausência também de Belarus do mercado”, avalia Fonseca.
Essa estimativa de médio prazo coincide com o período de aquisição de fertilizantes para a safra de grãos de verão do Brasil, o que corrobora a perspectiva de encarecimento do custo destes insumos para a temporada 2022/23.
Outro fator que pode interferir nos preços no curto e médio prazo é a volatilidade do mercado. Mello, da StoneX, observa que as incertezas continuam presentes e o mercado ainda busca entender os efeitos da guerra no setor.
“O mercado continua estressado, sem saber o que realmente está ocorrendo e tentando digerir os impactos do conflito sobre as exportações russas de fertilizantes. É muito mais que uma questão de preço. É uma questão de conseguir trazer o produto”, afirma Mello.
De acordo com o analista, apesar de os fertilizantes não estarem inclusos diretamente nas sanções europeias e norte-americanas à Rússia, os embargos comprometeram os pagamentos em dólar, inviabilizou a ação de alguns bancos russos e prejudicou o transporte dos insumos tanto pelo Mar Negro como, em menor proporção, pelo Mar Báltico. “Além disso, os custos de frete marítimo para cargas russas subiram expressivamente. Nenhum armador e companhia marítima quer ir para lá”, diz o analista.
Nesse cenário nebuloso, produtores que têm recursos tentam até mesmo antecipar pagamentos a fim de garantir o insumo, enquanto as empresas misturadoras limitam as vendas por lotes determinados à medida que garantem o volume com fornecedores externos, relata Fonseca, do Rabobank. “Por enquanto, o mercado doméstico enfrentou forte aumento de preços, mas a incerteza se haverá ou não produto ainda é muito grande, com maior risco de falta”, ressalta (O Estado de S.Paulo, 30/5/22)