Antecipar mudanças sobre o agro brasileiro e preparar os tomadores de decisão para o que está por vir. Com este propósito a Embrapa lança, na semana de comemorações dos seus 49 anos, a Visão de Futuro do Agro Brasileiro. A plataforma traz oito megatendências que têm como base os estudos de futuro do Sistema de Inteligência Estratégica da Empresa, elaborados a partir de consultas a mais de 300 especialistas e lideranças do agro brasileiro, consultas a 126 documentos estratégicos e discussões em 37 oficinas técnicas.
“Nossa equipe de Inteligência Estratégica se dedicou a identificar e estudar tendências, e várias delas já vêm se consolidando sem que muitos não percebam seus riscos ou oportunidades. Organizamos numa só plataforma os sinais e tendências de maior consenso. Além das 8 megatendências, o estudo traz informações já consolidadas no mundo da ciência, algumas universais, mas que precisam ainda ser melhor comunicadas, devido ao seu possível forte impacto para o agro, os negócios, as pessoas e a vida no planeta”, explica o presidente da Embrapa, Celso Moretti.
“Este estudo de futuro nos dará condições de subsidiar o Plano Diretor da Empresa (PDE) ao longo dos próximos anos, pois as grandes linhas mestras apontadas pela Visão de Futuro do Agro brasileiro indicam elementos importantes para a atuação da Embrapa em pesquisa e no desenvolvimento”, complementou.
Oito Megatendências para os próximos 20 anos
As oito megatendências apontam um conjunto de desafios para que o agro se mantenha competitivo e sustentável num longo prazo. A primeira é a Sustentabilidade. “Menor pegada de carbono, conservação da água, manutenção dos nutrientes do solo, uso controlado de antimicrobianos e defensivos, valorização dos serviços agro ambientais, redução de perdas e desperdícios e condições adequadas de emprego e renda no campo”, são as principais exigências trazidas nesta megatendência, explica o presidente da Embrapa. “Sustentabilidade será uma premissa”, complementa.
Conceitos como bioeconomia aliada à economia circular e à economia verde ampliaram seu espaço nas megatendências identificadas pela Embrapa e indicam a necessidade cada vez maior de investimento na produção de insumos biológicos (biofertilizantes e biopesticidas), por exemplo.
Adotar procedimentos como a rastreabilidade de todo processo produtivo da cadeia, valorizar os produtos orgânicos para o mercado de alimentos, atender os padrões de bem-estar animal, promover o crescimento da indústria de bioinsumos em detrimento dos produtos de origem fóssil e implementar o pagamento por serviços ambientais deverão pautar o agronegócio nos próximos anos.
Consumo de alimentos rastreados e aumento pela procura dos chamados plant-based
Cada vez mais o mundo vai buscar o consumo de produtos de valor agregado, como os chamados plant-based e produtos resultantes de um processo de rastreabilidade, desde o seu plantio até a chegada às prateleiras do mercado. O veganismo e o flexitarianismo (redução, mas não substituição do consumo de carne) são tendências mundiais, associando a isso a busca por alimentos com menos açúcar e sódio, e a valorização do nexo entre alimento, turismo e gastronomia, com o uso, inclusive, de produtos derivados de espécies nativas dos biomas brasileiros.
“Cada vez mais compradores e stakeholders vão participar dos processos decisórios do agro, definindo recomendações e instruções para disciplinar essa relação tanto no mercado interno quanto no externo”, afirmou o presidente, destacando, inclusive, a importância da rastreabilidade dos alimentos, tecnologia que já vem sendo incorporada pelo agro.
O futuro e o presente são digitais para o agro
Os sistemas agrodigitais foram apontados como uma megatendência importante para o agro brasileiro. Inteligência artificial, aprendizado de máquina, internet das coisas, realidade aumentada, robótica, impressão 3D e 4D, conectividade, big data, computação quântica. A transformação digital atinge também o meio rural e possibilita a abertura de novos mercados e oportunidades até então inimagináveis.
“No entanto, a conectividade no Brasil continua sendo um grande desafio. Sem ela, o hiato entre o produtor mais tecnificado e aqueles com dificuldades de acesso será ainda maior, aumentando também a pobreza rural”, aponta o estudo.
“Nós precisamos avançar junto com as agritechs, no uso dessas soluções, mas o fato é que o Brasil e mundo vão estar imersos no mundo digital. E nós temos um grande desafio que o Brasil precisa vencer: como avançar em agricultura digital se ainda 76% das nossas propriedades não possuem conectividade?”, questiona Moretti.
Tão importante quanto os sistemas agrodigitais é a megatendência que sinaliza a necessidade de o país fomentar a biorrevolução, investindo recursos no aprofundamento das pesquisas e no uso de técnicas avançadas de biotecnologia, como a edição genômica de plantas e animais e o desenvolvimento de biomoléculas, entre outras, para a produção de sistemas agrícolas mais resilientes e adaptados, por exemplo, à escassez hídrica, e raças de animais mais produtivos e resistentes. Tudo isso, integrando conhecimentos e tecnologias e boas práticas da agenda social, ambiental e de governança (ESG na sigla em inglês).
“No final do ano passado, nossos cientistas desenvolveram as primeiras canas resultantes de um trabalho de edição genômica. São as variedades Cana Flex I e a Cana Flex II, que apresentam, respectivamente, maior digestibilidade da parede celular e maior concentração de sacarose nos tecidos vegetais, o que vai propiciar a produção de um bioetanol de melhor qualidade e permitir que o bagaço seja melhor aproveitado na alimentação animal”, exemplificou Moretti ao falar da importância da biorrevolução para o país.
Mudança do Clima
Esta é outra importante megatendência apontada pelo estudo. A possibilidade do aumento da temperatura para os próximos anos ao patamar de 1,5 graus celsius, conforme considerado pelo ODS 13 (Objetivo de Desenvolvimento Sustentável), abre a perspectiva para a necessidade de investimento em pesquisa e desenvolvimento de tecnologias associadas a sistemas de produção mais resilientes à mudança do clima.
Nesse sentido, a plataforma Visão de Futuro do Agro Brasileiro aponta para a importância do investimento em políticas públicas que visem a adaptação da agricultura tropical brasileira ao aumento da temperatura global, visando competir com países (na maioria mais desenvolvidos) localizados em regiões de clima temperado, uma vez que estes poderão vir a ter melhores tecnologias e condições climáticas devido à mudança do clima.
Intensificação tecnológica e concentração da produção
O crescimento das exportações com o acesso aos novos mercados internacionais vem ocorrendo simultaneamente à concentração da pauta de exportação brasileira nos seus principais produtos. Amplia-se também a concentração da produção, com mudanças espaciais das regiões produtoras. A migração rural-urbana de trabalhadores persistirá, assim como a progressiva automação, capitalização intensiva e demanda por profissionais melhor capacitados.
Os locais de produção têm se deslocado do Sul-Sudeste para Centro-Oeste e Norte, aumentando a preocupação quanto aos impactos nos biomas Amazônia e Cerrado.
Os desafios agora são os relacionados à concentração da produção e da renda nas mãos de poucos produtores e a permanência dos pequenos produtores, povos e comunidades tracionais e extrativistas na atividade agropecuária.
“A permanência com renda dos pequenos produtores na atividade agropecuária dependerá de inovação tecnológica, de alternativas de agregação de valor, como o agroturismo, a gastronomia, nichos de mercado, além do associativismo, políticas públicas e inclusão digital”, destaca um dos trechos do estudo.
Novos conceitos que devem ser consolidados
Além das 8 megatendências, a plataforma traz também importantes conceitos que devem se consolidar no Brasil em um futuro próximo, entre eles: saúde única, economia circular, comércio justo, redução de perdas e desperdícios, vegetarianismo, veganismo e flexitarianismo, cadeias de comercialização curtas.
A Embrapa adotou o conceito de Saúde única ou One Health considerado pela FAO para explicar a tendência de integração de diferentes áreas e equipes para a busca de respostas aos problemas mais relevantes da sociedade e do ambiente, especialmente após a ocorrência da epidemia global do SARS-CoV-2. “Uma abordagem colaborativa, multissetorial e transdisciplinar ─ nos níveis local, regional, nacional e global ─ com o objetivo de alcançar resultados de saúde ideais, reconhecendo a interconexão entre pessoas, animais, plantas e seu ambiente compartilhado”, destaca o estudo da Embrapa (Assessoria de Comunicação, 28/4/22)