A desigualdade de renda do trabalho entre ricos e pobres no Brasil diminuiu no primeiro trimestre de 2022, em relação ao trimestre imediatamente anterior e também a igual período de 2021, informou nesta sexta-feira (10/6) o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
Mas o que à primeira vista parece uma boa notícia é resultado na verdade de um cenário bastante negativo: tanto os ricos quanto os pobres viram sua renda do trabalho diminuir no período, em relação ao primeiro trimestre de 2021.
Só que a queda de renda dos mais ricos (-3,98%) foi em percentual maior do que a dos mais pobres (-1,17%), o que resulta nessa redução da desigualdade sem motivo para comemorar.
“Os empregados com carteira no setor privado, sem carteira no setor privado e, sobretudo, do setor público encontraram dificuldade em negociar reposições salariais ao longo de 2021, apesar da recuperação do crescimento da atividade econômica observada no ano”, destaca o Ipea, no estudo de autoria do economista Sandro Sacchet de Carvalho.
“A maior queda da renda dos trabalhadores do setor público explica, em grande medida, a maior redução dos rendimentos dos domicílios de renda mais alta ao longo dos últimos quatro trimestres — o que, por sua vez, explica parte da diminuição da desigualdade de renda”, acrescentou o instituto.
A forte alta da inflação e a falta de recursos para reajustes nos entes públicos explicam as dificuldades dos trabalhadores de conseguir reajustes salariais neste início de ano.
Mesmo com a queda da desigualdade, no primeiro trimestre de 2022, a renda domiciliar dos trabalhadores da camada mais alta era 28 vezes maior do que os da faixa mais baixa — comparado a 28,8 vezes no primeiro trimestre de 2021.
Ou seja: a desigualdade diminuiu, mas continua altíssima. E diminuiu porque todo mundo perdeu renda, mas os mais ricos perderam em percentual maior.
‘Volta à normalidade’
Em média, a renda habitual dos brasileiros recuou 8,7% no primeiro trimestre de 2022, em comparação com o mesmo trimestre de 2021, para R$ 2.548. Foi o quarto trimestre seguido de queda da renda na comparação anual.
O Ipea esclarece que parte dessa queda de renda é explicada pelo “retorno à normalidade” do mercado de trabalho passada a pior fase da pandemia.
Isso porque, no pior momento da pandemia, em meados de 2020, os trabalhadores de menor renda foram os que mais perderam ocupação. Como quem permaneceu ocupado tinha maior renda, o rendimento médio da população ocupada teve alta, sem que isso refletisse uma melhora do mercado de trabalho.
Agora, os trabalhadores de menor renda estão voltando ao mercado, o que puxa a renda média para baixo. Mas, além desse efeito de composição, o nível de renda de maneira geral é inferior ao observado antes da pandemia.
“Os trabalhadores sem carteira e do setor público fecharam o primeiro trimestre de 2022 com quedas [da renda do trabalho na comparação anual] de 6% e 12,9%, respectivamente. Os trabalhadores privados com carteira tiveram uma queda na renda habitual de 4,6% e os trabalhadores por conta própria de 6,4%”, observa o Ipea.
O instituto destaca ainda o aumento na proporção de domicílios sem renda do trabalho, que passou de 22,2% no quarto trimestre de 2021 para 23,3% no primeiro trimestre de 2022.
O aumento neste início de ano reverte tendência de melhora no indicador, que chegou a 28,5% de domicílios sem renda do trabalho no segundo trimestre de 2020, auge da pandemia.
Menor nível de renda de todas as fontes em dez anos
A divulgação do estudo do Ipea acontece no mesmo dia em que o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua de 2021, com dados de rendimentos para todas as fontes.
Diferentemente da pesquisa divulgada mensalmente pelo instituto, que inclui apenas os dados de renda do trabalho (analisados pelo Ipea em seu estudo), o levantamento divulgado nesta sexta-feira pelo IBGE inclui fontes de renda como os benefícios sociais pagos pelo governo e a renda de aluguéis.
Aqui, novamente, as notícias foram bastante negativas.
Segundo o IBGE, em 2021, o rendimento de todas as fontes dos brasileiros atingiu seu menor valor em dez anos.
De acordo com o levantamento, o rendimento mensal médio real (isto é, descontada a inflação) de todas as fontes no país passou de R$ 2.386 em 2020 para R$ 2.265 em 2021, valor mais baixo desde 2012, quando tem início a série histórica da pesquisa.
“Esse resultado é explicado pela queda do rendimento médio do trabalho, que retraiu mesmo com o nível de ocupação começando a se recuperar, e também pela diminuição da renda das outras fontes, exceto as do aluguel”, explicou Alessandra Scalioni, analista do IBGE.
Segundo ela, a mudança nos critérios de concessão do auxílio emergencial ocorrida em 2021 foi uma das principais causas da queda no rendimento de outras fontes.
O benefício foi reduzido de valores que ficavam entre R$ 600 e R$ 1.200, em 2020, para R$ 150 a R$ 375, em 2021. O número de beneficiários também diminuiu em 30%.
Com isso, o percentual de pessoas com algum rendimento na população do país caiu de 61% em 2020 para 59,8% em 2021, o mesmo percentual de 2012 e patamar mais baixo da série (BBC Brasil, 10/6/22)