Após aprovação de marco legal do setor, governo estuda incentivos à cadeia produtiva e a indústrias consumidoras.
Após a aprovação, há duas semanas, do marco legal do hidrogênio de baixo carbono, conhecido como hidrogênio verde, o governo defende medidas para tentar atrair investimentos na cadeia produtiva e em indústrias consumidoras do insumo, como siderúrgicas e fábricas de fertilizantes.
“O Brasil não pode aceitar ser apenas produtor e exportador do hidrogênio”, disse nesta terça-feira (22), em evento no Rio de Janeiro, o secretário de Desenvolvimento Industrial, Inovação, Comércio e Serviços do Mdic (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços), Uallace Moreira.
O projeto de lei que concede incentivos para a produção de hidrogênio verde foi aprovado há duas semanas pelo Congresso e encaminhado para sanção pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O texto garante créditos fiscais de até R$ 18 bilhões entre 2028 e 2032 para o desenvolvimento do setor.
Moreira disse que o projeto garante previsibilidade para investimentos no Brasil, mas outros programas do governo, como o projeto de lei dos combustíveis do futuro, são fundamentais para o desenvolvimento dessa indústria.
“Caso contrário, caímos no que o presidente Lula chama de neocolonização”, afirmou o secretário do Mdic. O potencial para a produção de hidrogênio põe o Brasil na mira de países em busca de alternativas para a descarbonização da economia, principalmente os europeus.
Estudo elaborado pelo GIZ (sigla para Acordo de Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável) identifica um potencial teórico de produção equivalente a 2.232 vezes o volume de energia gerada pela usina de Itaipu, a segunda maior hidrelétrica do mundo.
O instituto ressalta que a conta é teórica, por considerar o uso de todo o território ainda não destinado a usos urbanos e agrícolas ou sob proteção ambiental. Mas indica que o Brasil desponta como possível liderança nessa indústria.
“Quando falamos desses potenciais, numa visão global, existem poucos países com potencial tão grande como o Brasil”, diz o diretor de Energia e Transformação Urbana do acordo Brasil-Alemanha, Marcus Francke. “Talvez a Índia possa ter potencial parecido.”
As projeções da GIZ para o consumo nacional de hidrogênio em 2050 equivalem a 0,15% desse potencial teórico de produção, com grande demanda pelos setores siderúrgico e de aviação, que enfrentam maior dificuldade para descarbonizar as operações.
Assim, o estudo vê espaço não só para atendimento da demanda interna, mas também para a produção para exportação, uma vez que o transporte do hidrogênio em longas distâncias ainda não é viável. “Vai depender de decisão política”, afirma Francke.
O GIZ projeta que o Brasil terá capacidade de produzir hidrogênio verde a menos US$ 1,90 por quilo em 2050, valor considerado competitivo por Francke, resultado de um baixo custo da energia elétrica, que representa 70% do preço final.
Moreira, do Mdic, diz que o governo trabalha em iniciativas para atrair essa cadeia produtiva, com a regulamentação do marco do hidrogênio verde e iniciativas da nova política industrial lançada este ano. “A ideia é pensar quais instrumentos podem estimular essa cadeia produtiva. É ouvir o setor, dialogar com o setor.”
No setor privado, a Vale já tenta atrair investidores estrangeiros para processar minério de ferro com hidrogênio no país, em projetos que batizou de megahubs. Esses projetos preveem a produção de matéria-prima para fornos siderúrgicos elétricos, reduzindo as emissões do setor.
A mineradora já assinou uma série de memorandos de entendimentos com empresas estrangeiras para estudar os empreendimentos. Atualmente, os mais avançados são localizados no Oriente Médio, mas a ideia é buscar parceiros para projetos no Brasil.
“O Brasil é uma grande oportunidade, porque tem competitividade no custo da energia”, disse a diretora de Energia e Descarbonização da Vale, Ludmilla Nascimento. “Temos alguns clientes europeus já bem estabelecidos no Brasil e siderúrgicas nacionais, então, existe a possibilidade [de fazer no Brasil].”
Principal consumidora de hidrogênio do país, mas com base em gás natural, a Petrobras ainda estuda o novo marco regulatório para avaliar a migração para o hidrogênio como matéria-prima, afirmou o diretor de Transição Energética e Sustentabilidade da estatal, Maurício Tolmasquim.
“Estamos fazendo contas com esses novos incentivos [do PL]”, afirmou. “Não dá para dizer agora como será o modelo, mas foi um passo muito positivo do governo e do Congresso para dar incentivo para essa indústria.” (Folha, 24/7/24)