Editorial Estadão
Agropecuária dita o ritmo nos avanços e recuos de uma economia que precisa de outros protagonistas.
O tombo de 2% na atividade econômica brasileira em maio, como mostrou o IBC-Br, indicador calculado pelo Banco Central (BC) que funciona como uma prévia do Produto Interno Bruto (PIB), reforçou a enorme “agrodependência” brasileira. Terminada a safra de soja e milho do início do ano, que garantiu um crescimento espetacular da economia no primeiro trimestre, o Brasil despencou a uma velocidade bem maior do que a prevista pelos analistas, que imaginavam uma queda ao redor de 0,1%.
A rapidez do governo em atribuir o baque à manutenção da taxa básica de juros em 13,75% é tão compreensível quanto frágil. Compreensível por fazer parte da pressão do Planalto por uma queda consistente dos juros na próxima reunião do Comitê de Política Monetária do BC, em 1.º e 2 de agosto – uma queda também já esperada, não em razão da entrada dos dois novos diretores do banco indicados pelo governo, mas pelas condições estruturais da própria economia; e frágil porque colocar apenas na conta dos juros a pancada sofrida em maio é distorção tão flagrante quanto foi o excesso de entusiasmo com o bom desempenho da economia no início do ano.
Quando o IBGE liberou, no mês passado, os dados do primeiro trimestre, a alta de 1,9% do PIB em relação ao trimestre anterior foi maior do que as estimativas mais otimistas. Mas o resultado refletiu tão somente a força da agropecuária que, na mesma comparação, avançou 21,6%, enquanto indústria, serviços e consumo das famílias patinaram, um pouco mais ou um pouco menos, ao redor de zero.
Os dados demonstram que, para cima ou para baixo, o ritmo da economia brasileira é ditado pela agricultura, pecuária e toda a cadeia que as duas atividades envolvem, desde o campo até a indústria de exportação. A pujança da agropecuária é, obviamente, um quadro positivo. Mas a dependência excessiva da economia de um setor específico não é.
O agro alcançou o nível de excelência atual por investir pesada e continuamente em pesquisa e desenvolvimento. Tem incentivos do governo – como, ademais, os tem a maioria dos países –, mas multiplica os recursos com investimentos em tecnologia. Até agora o País não assistiu ao mesmo salto na indústria, por exemplo, a despeito dos sucessivos programas de incentivo, alguns descabidos, como o do “carro popular”.
A agropecuária é a prova de que investimentos em qualificação e pesquisa trazem competitividade e produtividade. Quando o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o vice-presidente e ministro da Indústria, Geraldo Alckmin, imputaram, de pronto, aos “juros escandalosos” a responsabilidade pelo forte recuo de maio, estavam fazendo uma avaliação pela metade.
Desde agosto de 2022 na casa de 13,75%, a Selic precisará mais do que a força do agro para cair. Para começar, seria bom o governo sinalizar que o prometido ajuste fiscal é sério, o que já teria o condão de fazer os juros futuros recuarem. Enquanto prevalecer a suspeita de que o governo e o Congresso não estão dispostos a cortar despesas, o custo do dinheiro continuará alto (Estadão, 19/7/23)