A agricultores que protestavam no sul do país, Gabriel Attal anunciou a oposição do governo ao tratado de livre-comércio, chamando-o de “lei da selva”. Aprovação depende de aval unânime dos 27 membros do bloco.
O primeiro-ministro francês, Gabriel Attal, anunciou nesta sexta-feira (26/01) a forte oposição do país ao acordo de livre comércio entre a União Europeia (UE) e o Mercosul. O objetivo era acalmar os agricultores franceses, que há dias bloqueiam inúmeras vias do país descontentes com as políticas do governo.
“Conforme já anunciado pelo presidente da República [Emmanuel Macron], a França opõe-se à assinatura do acordo com o Mercosul. Digo isso em alto e bom som”, declarou Attal a um grupo de agricultores que protestava em Haute-Garonne, no sul do país.
O premiê classificou o acordo como “uma lei da selva” que acaba afetando os agricultores franceses.
A oposição do governo francês ao acordo, porém, não é novidade. Em dezembro, na COP28 em Dubai, Macron já havia alegado falta de reciprocidade das normas ambientais entre a Europa, consideradas as mais exigentes do planeta, e as da América do Sul.
A recusa da França surge dois dias depois de governantes do Mercosul, numa reunião em Assunção, no Paraguai, darem como certo o desejo de seus países de avançarem na negociação das questões pendentes com a UE, com vista a finalizar a assinatura de um acordo equilibrado assim que possível.
No entanto, a posição francesa deve impedir a ratificação do acordo, já que para entrar em vigor é necessário o aval de todos os 27 Estados-membros da UE.
Os partidos de oposição na França aproveitam as manifestações de agricultores para criticar o desempenho do governo Macron antes das eleições europeias, marcadas para junho.
A líder populista de direita, Marine Le Pen, cujo partido Reagrupamento Nacional (RN) está bem posicionado nas mais recentes sondagens, culpa os acordos de livre-comércio, as importações e a burocracia pelos problemas econômicos dos agricultores franceses.
Em Bruxelas, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, abriu um painel de discussão para tentar colocar a agricultura como tema prioritário na política comunitária, prometendo levar em conta algumas das queixas levantadas pelos manifestantes em França.
“Todos concordamos que os desafios são, sem dúvida, crescentes: seja a concorrência externa, o excesso de regulamentação interna, as alterações climáticas, a perda de biodiversidade ou um declínio demográfico, apenas para citar alguns”, reconheceu.
Protestos devem continuar
Mesmo após uma sinalização positiva do governo às reivindicações dos agricultoreres, o FNSEA e outros dois dos principais sindicatos do setor instaram os manifestantes a seguirem com as mobilizações em todo o país.
“O que foi dito não apazigua o desconforto”, disse Arnaud Rousseau, presidente do FNSEA, pedindo que o governo “vá mais longe”.
Entre outras medidas, o governo francês prometeu isenção fiscal para o combustível agrícola, o compromisso de negociar em Bruxelas uma nova revogação da obrigação de deixar 4% das terras em pousio (interrupção para deixar o solo mais fértil) e acelerar os pagamentos para a Política Agrícola Comum (PAC) da UE, da qual a França é a principal beneficiária, com 9 bilhões de euros por ano.
Há pouco mais de uma semana, dezenas de barricadas paralisaram o trânsito em centenas de quilômetros de rodovias na França. Nesta sexta-feira, algumas das principais vias de acesso a Paris foram cortadas.
Embora o governo tenha garantido que não tem intenção de enviar agentes policiais para dissipar os protestos, que considera pacíficos, foram registrados alguns episódios de violência, como dois incêndios de prédios públicos.
Atos em outros países
Mas não é só na França que os agricultores estão nas ruas demostrando descontentamento. Na vizinha Alemanha, eles também tomam as ruas descontes com as políticas do governo.
Desde dezembro, ocorrem protestos com o bloqueio de cruzamentos e rodovias, em oposição às medidas anunciadas pela coalizão governamental para pôr fim ao subsídio do diesel e a isenções de impostos para veículos agrícolas. As manifestações têm sido abraçadas pela extrema direita, que tenta capitalizar em cima do mau humor do setor, e produtores rurais têm sido criticados por não se distanciarem claramente de ideologias perigosas.
Na Grécia, agricultores protestam com bloqueios de estradas no centro do país, para exigir do governo isenções fiscais para o combustível e ajudas devido à perda de colheitas pelas inundações.
Na Polônia, centenas de agricultores bloquearam na quarta-feira 160 estradas em todo o país contra o que classificam como importações “descontroladas” de produtos agroalimentares ucranianos (DW, 26/1/24)