Sucesso dessa revolução depende da união entre produtores, governo e setor privado para superar barreiras e ampliar os horizontes desse mercado promissor
O Brasil, líder global em produção agrícola, encara um dilema urgente: como equilibrar a produtividade que alimenta o mundo com práticas que respeitem o meio ambiente? Nesse cenário, os bioinsumos surgem discretamente como protagonistas, aliando eficiência no campo à preservação ambiental. De 2021 até hoje, o mercado brasileiro de bioinsumos tem crescido de forma impressionante: uma taxa média de 21% ao ano, com mais de R$ 5 bilhões movimentados em 2023.
Esses números posicionam o Brasil como um dos principais atores globais no setor. Dados do Ministério da Agricultura e Pecuária indicam que cerca de 40 milhões de hectares são cultivados com bactérias promotoras de crescimento de plantas, além dos 10 milhões de hectares utilizando outros bioinsumos para controle de pragas. Apesar do avanço, questões como regulamentação e capacitação ainda limitam seu pleno potencial.
O Brasil está diante de uma oportunidade única: transformar sua biodiversidade e expertise agrícola em referência mundial de inovação sustentável. Mas o sucesso dessa revolução depende da união entre produtores, governo e setor privado para superar barreiras e ampliar os horizontes desse mercado promissor.
A agricultura global enfrenta uma pressão crescente para adotar práticas mais sustentáveis, reduzindo o impacto ambiental sem comprometer a produtividade. Nesse cenário, os bioinsumos se destacam como uma alternativa crucial aos insumos químicos tradicionais, promovendo o equilíbrio entre alta eficiência e menor impacto ambiental.
Globalmente, estima-se que o mercado de bioinsumos alcance US$ 30 bilhões até 2025, impulsionado pela demanda por alimentos livres de resíduos químicos, especialmente na Europa e América do Norte, que lideram o consumo desses produtos.
No Brasil, o contexto é ainda mais promissor. O país reúne uma biodiversidade única, com mais de 20% das espécies vegetais e animais do mundo, criando um terreno fértil para o desenvolvimento de soluções biológicas avançadas. Além disso, cerca de 17% das áreas agrícolas brasileiras já utilizam algum tipo de bioinsumo, de acordo com dados da Embrapa.
A tecnologia dos bioinsumos vem sendo implementada principalmente nos estados de Mato Grosso, Goiás/Distrito Federal, São Paulo, Paraná, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais, que lideram o uso desses produtos no país. Este avanço é respaldado por iniciativas como o Plano Nacional de Bioinsumos, que incentiva a integração dessas soluções no manejo agrícola.
Com programas de incentivo e uma demanda crescente por práticas sustentáveis, o Brasil não apenas responde às pressões globais por sustentabilidade, mas também se posiciona como líder em inovação, consolidando sua relevância no mercado internacional de bioinsumos.
No Brasil, o uso de bioinsumos já traz resultados palpáveis para o campo e o meio ambiente. Por exemplo, os inoculantes com bactérias fixadoras de nitrogênio estão ajudando produtores de soja a capturar esse nutriente da atmosfera, aliviando a dependência de fertilizantes químicos e reduzindo os custos de produção. Essa prática não apenas diminui os custos de produção, mas também aumenta a produtividade das lavouras.
A produção e o uso de bioinsumos fortalecem a economia local, incentivando a produção regional e gerando novas oportunidades de mercado. Além disso, a adoção de práticas sustentáveis atende à crescente demanda dos consumidores por produtos agrícolas com menor impacto ambiental, agregando valor aos produtos e ampliando mercados.
Os bioinsumos oferecem uma alternativa viável e sustentável para a agricultura brasileira, promovendo benefícios econômicos para os produtores e contribuindo para a preservação ambiental.
Apesar do crescimento significativo do mercado de bioinsumos no Brasil, diversos desafios ainda limitam seu pleno desenvolvimento. Citam-se: regulamentação e padronização; resistência cultural e capacitação técnica; infraestrutura e logística; incentivos fiscais e financeiros.
A regulamentação dos bioinsumos no Brasil ainda deixa lacunas importantes. O Decreto Nº 10.375, que criou o Programa Nacional de Bioinsumos em 2020 (que tem como objetivo estimular a pesquisa, a produção e o uso de produtos biológicos), foi um marco inicial, mas as normas precisam ser atualizadas para garantir mais clareza e segurança tanto para agricultores quanto para as empresas do setor.
Importante avanço nesse sentido é a recém-sancionada Lei N. 15.070 de 23 de dezembro de 2024, que regulamenta aspectos como a produção, o registro, o uso e a comercialização de bioinsumos no Brasil. Ela traz um marco legal significativo para o setor, principalmente no que tange a produção onfarm (o que, por seu turno, reduz a dependência dos produtores rurais em relação aos insumos importados).
Muitos agricultores desconhecem os benefícios dos bioinsumos ou hesitam em substituir métodos tradicionais por soluções biológicas. Há uma carência de programas de capacitação técnica para produtores e consultores agronômicos, o que dificulta a adoção dessas tecnologias.
A definição de bioinsumos adotada nas normativas é ampla e abarca vários produtos de origem vegetal, animal ou microbiana com ação em setores diversos da agropecuária. Ainda assim, muitos agricultores desconhecem os benefícios dos bioinsumos e suas diversas aplicabilidades, que não se restringem ao uso na nutrição e fertilidade do solo. Também têm aplicação na produção animal e processamento de produtos de origem animal e vegetal.
Quando têm algum conhecimento, parte dos agricultores hesita em substituir métodos tradicionais por soluções biológicas. Há uma carência de programas de capacitação técnica para produtores e consultores agronômicos, o que dificulta a adoção dessas tecnologias.
A produção e distribuição de bioinsumos enfrentam desafios logísticos, especialmente em áreas remotas. A falta de infraestrutura adequada limita o acesso dos produtores a esses insumos, comprometendo sua aplicação em larga escala.
A escassez de políticas públicas robustas que apoiem a pesquisa, produção e comercialização de bioinsumos é um entrave significativo.
Comparativamente, os insumos químicos tradicionais recebem mais subsídios, colocando os bioinsumos em desvantagem competitiva.
O futuro dos bioinsumos no Brasil depende de esforços conjuntos. Produtores, empresas e governo precisam alinhar suas ações, investindo em pesquisa, logística e políticas públicas que incentivem a adoção de soluções biológicas.
Além disso, é essencial sensibilizar os produtores, os consumidores e os mercados globais para o valor dos produtos agrícolas sustentáveis, fortalecendo a competitividade dos bioinsumos brasileiros no cenário internacional.
Também é importante salientar que o crescimento dos bioinsumos deve ser acompanhado de um controle rígido de qualidade, não só para a garantia da efetividade dos produtos, mas também para o aumento da credibilidade dessas tecnologias.
O Brasil tem a chance de liderar uma revolução sustentável no campo, transformando sua biodiversidade única e sua expertise agrícola em referência mundial. Essa oportunidade só será concretizada se todos os agentes envolvidos abraçarem o desafio de construir um agronegócio mais sustentável, eficiente e inovador, beneficiando o planeta e as futuras gerações (Marcos Pena Jr é analista em gestão estratégica de PD&I agrícola e doutorando em agronegócios (UnB). Juliana Lima é engenheira agrícola e mestranda em agronegócios (UnB). Warley Henrique Silva é engenheiro, gestor nacional de pesca e aquicultura do Sebrae e doutorando em agronegócios (UnB). Luiz Honorato da Silva Jr é economista, doutor em economia e professor associado da Universidade de Brasília (UnB); Globo Rural, 5/2/25)