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O agronegócio e o risco climático

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Editorial O Estado de S.Paulo

Devastação e mudança do clima podem resultar emperdas multibilionárias no setor mais competitivo da economia brasileira.

 Uma seca devastadora, a mais severa em décadas, já causou perdas de R$ 71,9 bilhões a produtores de grãos do Sul e do Centro-Oeste, segundo estimativa da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Ao mesmo tempo, chuvas em excesso reduziram a colheita de frutas no Vale do Rio São Francisco, impondo prejuízos consideráveis aos plantadores, mesmo com a alta de preços decorrente da menor oferta. Apesar dos danos, a safra 2021-22 ainda poderá atingir 268,2 milhões de toneladas de cereais, leguminosas e oleaginosas, segundo a última estimativa do Ministério da Agricultura, superando por 5% a colheita da temporada anterior. Mas esse resultado será 5,7% menor que o previsto no levantamento de janeiro, de 284,4 milhões. Todo esse estrago será apenas consequência de fenômenos conhecidos há muitos anos, como La Niña, ou já refletirá os efeitos do aquecimento causado pela devastação ambiental?

Com ou sem La Niña e El Niño, mudanças climáticas estão presentes e seus efeitos são notados no Brasil e na maior parte da América do Sul, segundo especialistas em questões ambientais. Eventos extremos, como tempestades, enchentes, furacões, ciclones, secas prolongadas e ondas de calor, tendem a ocorrer com maior frequência, impondo a centenas de milhões de pessoas condições de vida mais desafiadoras. Uma tentativa de quantificação desse aumento foi apresentada em agosto de 2021 pelo Painel Intergovernamental de Mudança do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU). Exemplo: ondas de calor já ocorrem com o triplo da frequência observada no período de 1850 a 1900.

Economicamente relevantes em todo o mundo, esses eventos meteorológicos têm especial importância no Brasil, um dos maiores produtores e exportadores de alimentos e de matérias-primas de origem agropecuária. Além de ser o setor mais eficiente e mais competitivo da economia brasileira, o agronegócio é um fator essencial de bem-estar das famílias e de estabilidade econômica. Qualquer governo responsável se empenharia, portanto, em evitar políticas ambientais perigosas para a produção rural – pelo menos para preservar o bom funcionamento da economia. Um governo sério também levaria em conta outros objetivos e interesses, bem mais amplos, mas o cuidado com a saúde econômica já produziria bons efeitos.

A alimentação tem grande peso no orçamento da maioria dos brasileiros e, portanto, suas condições de oferta podem afetar muito sensivelmente a evolução dos preços ao consumidor. Em janeiro, por exemplo, o encarecimento do item alimentação e bebidas (1,11%) teve impacto de 0,23 ponto de porcentagem na alta geral do índice de preços (0,54%).

Especialistas em índices de inflação já se mostram preocupados com os possíveis efeitos da quebra de produção de vários produtos agropecuários. Milho e farelo de soja com preços mais altos – para citar só dois exemplos – tendem a elevar os custos de produção de aves e suínos, tornando menos acessíveis à maioria da população duas importantes fontes de proteína.

Além de essencial para o abastecimento interno, o agronegócio tem relevância estratégica para o comércio internacional. Seu superávit comercial, US$ 108,4 bilhões nos 12 meses até janeiro, compensou o déficit de outros setores e deixou uma grande sobra. Nesse período, o agronegócio exportou produtos no valor de US$ 123,7 bilhões, ou 43,3% de toda a receita comercial do Brasil. Foi uma participação menor que a de um ano antes, de 48%, mas o novo número basta para mostrar a enorme importância do setor nas transações externas. Em janeiro deste ano, o valor exportado, US$ 8,8 bilhões, foi recorde para o mês e equivaleu a 44,9% do total faturado.

A força do agronegócio garante, além de outros benefícios muito importantes, a saúde das contas externas, diminuindo o risco de crises muito dolorosas. Se levasse em conta esse dado, o presidente Jair Bolsonaro já encontraria um excelente motivo – bem mais forte que as pressões internacionais – para estimular práticas ambientais muito mais sérias e responsáveis (O Estado de S.Paulo, 22/2/22)

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