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Como a guerra entre Rússia e Ucrânia afeta a economia brasileira?

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Por Isabella Velleda

Preços dos combustíveis e dos alimentos devem aumentar por causa do conflito, dizem especialistas.

  Aumento das pressões inflacionárias e redução das perspectivas de crescimento econômico serão alguns dos efeitos da guerra entre Rússia e Ucrânia na economia brasileira, segundo especialistas consultados pela Forbes.

 Na madrugada de hoje (24), o presidente russo Vladimir Putin ordenou uma invasão total da Ucrânia por terra, ar e mar, dando início ao maior conflito armado na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. Putin disse que não tinha outra opção a não ser ordenar o que chamou de uma operação especial contra a Ucrânia, dizendo que todas as tentativas anteriores de Moscou para alterar a situação de segurança não deram em nada.

 Os mercados acionários globais amanheceram em território de baixa, e até mesmo o bitcoin caiu para seu menor nível em um mês, a US$ 34.324, refletindo o movimento de venda de ativos mais arriscados.

 Aumento dos preços do petróleo

A Rússia é o terceiro maior produtor e segundo maior exportador de petróleo do mundo, e um conflito envolvendo o país prejudica o fornecimento da commodity. Os efeitos da diminuição da oferta podem ser ainda mais devastadores por conta do crescimento da demanda por combustíveis com a reabertura das economias pós-pandemia.

Hoje, os preços dos petróleos Brent e WTI atingiram os níveis mais altos desde agosto e julho de 2014, respectivamente. O Brent subia 5,37% para US$ 102,25 o barril às 15h35 do horário de Brasília, enquanto o WTI avançava 3,65% para US$ 95,46 o barril.

 O aumento dos preços impulsionou os papéis da Petrobras (PETR3 e PETR4), que registram ganhos na tarde de hoje.

  Roberto Dumas, professor de economia internacional do Insper, aponta que o repasse desses aumentos deve encarecer ainda mais os combustíveis no Brasil, o que, por sua vez, pode reforçar argumentos para a privatização da petroleira.

  “Podemos ter uma pressão maior do Executivo para intervir na Petrobras, principalmente por causa das eleições”, argumenta ele. Desde o ano passado, o presidente Jair Bolsonaro expressa interesse em privatizar a estatal e alterar a política de preços de combustíveis da petrolífera.

 Cláudio Mastella, diretor-executivo de comercialização e logística da Petrobras, afirmou nesta manhã que a empresa avaliará os impactos da alta volatilidade da commodity no mercado internacional antes de tomar qualquer decisão sobre os preços domésticos.

 Sobem os preços do gás natural e, consequentemente, dos alimentos

A Rússia é a maior fornecedora de gás natural para a Europa – o país é responsável por cerca de 35% da oferta ao continente. Por isso, o início de um conflito, bem como a imposição de sanções a Moscou, terá efeitos negativos sobre o setor energético da zona do euro.

Apesar de não depender do fornecimento russo, o Brasil também fica suscetível à redução da oferta de gás natural.

 Pedro Brites, professor da escola de relações internacionais da FGV (Fundação Getulio Vargas), explica que a maior parte dos fertilizantes importados pelo Brasil vem da Rússia. Esses produtos são produzidos a partir de gás natural – especialmente os nitrogenados, fosfatados e o cloreto de potássio.

  O gás natural chegou a registrar alta de 40% na Europa no pregão de hoje. Com o repasse desses aumentos, a agricultura brasileira também deve ser impactada, e os preços dos alimentos devem subir.

 Brites também chama atenção para o fato de o Brasil possuir uma participação significativa no mercado de importação de trigo. “Mais de 80% do trigo importado pelo nosso país vem da Argentina. Mas como esses preços são cotados internacionalmente, surge uma pressão inflacionária sobre os alimentos também.”

 A Rússia e a Ucrânia respondem por 29% das exportações globais de trigo, 19% do fornecimento mundial de milho e 80% das exportações mundiais de óleo de girassol.

 Busca por ativos de maior segurança

Tradicionalmente, períodos de incerteza na economia mundial elevam a busca por mercados e ativos considerados mais seguros, como ações de empresas norte-americanas, dólar e ouro.

 Após acumular perdas de 2,5% no início da semana, o dólar voltou a subir frente ao real, e opera em alta de mais de 2% nesta tarde. O mesmo avanço foi observado em outros países emergentes, como a Turquia, que viu a lira cair mais de 5% frente à divisa norte-americana neste pregão.

    Esse movimento interrompe o recente fluxo de entrada de recursos estrangeiros na Bolsa brasileira. “A narrativa da busca por ativos de ‘valor’, a despeito da fuga de tecnologia e empresas ainda sem lucro, contribuiu para que o Brasil recebesse um fluxo muito positivo nos últimos meses”, comenta João Beck, economista e sócio da BRA.

 “Essa narrativa foi reforçada pela alta das taxas de juros globais, que prejudicou empresas com previsão de lucro mais à frente e reforçou a busca por empresas de valor – característica mais presente no Ibovespa”, complementa.

 Às 15h35 do horário de Brasília de hoje, o Ibovespa registrava queda de 2,16%.

 Juros em alta e crescimento em baixa

Segundo os especialistas, diante das pressões inflacionárias observadas principalmente no setor energético, a guerra entre a Rússia e a Ucrânia deve intensificar ainda mais a política monetária contracionista no Brasil.

 Em sua última reunião, no início do mês, o Copom (Comitê de Política Monetária) elevou a Selic, taxa básica de juros, em 1,5 ponto percentual pela terceira vez consecutiva, a 10,75% ao ano. Economistas esperam, agora, que ela chegue a 12,25% no final de 2022, enquanto analistas do Citi citam 12,75% como o patamar máximo do atual ciclo de aperto monetário.

 “Se nós víamos um PIB [Produto Interno Bruto] estável em 2022, ou com avanço de 0,3%, agora eu já aposto em um recuo de 0,5% diante desse cenário contracionista”, afirma Dumas.

  Os conflitos no leste europeu não devem trazer benefícios ao cenário macroeconômico brasileiro, embora algumas empresas de exportação, que têm receita em dólar, possam encontrar algumas vantagens.

 “Não temos muitos precedentes recentes de guerras que aconteceram no coração da Europa”, comenta Brites. “Mas podemos citar o conflito entre o Irã e os EUA há alguns anos, que também provocou a elevação do barril de petróleo.”

 O professor explica que os demais impactos econômicos vão depender do agravamento da crise: “Se houver uma participação mais efetiva dos países europeus e dos Estados Unidos no conflito, por exemplo, o cenário pode ficar mais crítico” (Forbes, 24/2/22)

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