Por Ronaldo Lemos
País deveria investir mais neste gás, pois tem um potencial incrível para produzi-lo.
O Brasil já é o líder mundial em energia renovável. Poderia dobrar a aposta com o biometano. Trata-se do gás produzido a partir de resíduos como a cana após a produção de álcool, resíduos do milho ou da soja, de animais e até do saneamento. Com a enormidade do agro no país, o potencial brasileiro é imbatível.
Diferente de painéis solares e turbinas eólicas, que são importados, a cadeia do biometano é totalmente dominada pelo Brasil, especialmente por conta da produção de álcool. Vale dizer que a molécula do biometano é igual à do gás natural. Com isso é possível aproveitar toda a infraestrutura já instalada, incluindo o uso em veículos hoje movidos por GNV.
Goiás é um exemplo. Para gerar demanda, o estado está implementando uma frota de 500 ônibus movidos a biometano, o que garante uma demanda de 4 milhões de m³ por mês. Essa iniciativa não só reduz emissões, como diminui custos da frota e gera empregos locais. O estado tem, sozinho, o potencial de geração de 2,2 bilhões de m³ anuais de biometano.
Onde existe produção de açúcar ou álcool no Brasil hoje é possível partir para o biometano. A vinhaça da cana hoje acaba subaproveitada. Ela pode ser colocada em biodigestores e ao ser purificada produzir o gás. O resultado de tudo é o chamado digestato, um fertilizante natural que substitui insumos químicos importados, ajudando na independência do país.
O que Goiás está fazendo lembra o que a China fez com carros elétricos. Para garantir a demanda, cidades como Shenzhen promoveram como política pública a eletrificação da sua frota de táxis e ônibus. Isso impulsionou empresas como a BYD, que hoje atuam globalmente. O resultado foi não só a redução das emissões urbanas, mas também consolidar a liderança chinesa em veículos elétricos.
A título de comparação o líder mundial em biometano hoje é a Alemanha. O país injeta mais de 10 TWh de biometano nos seus gasodutos de gás natural por ano. Só que o potencial total de produção da Alemanha é limitado a 2 bilhões de m³ por ano (menor do que Goiás). O do Brasil é de 50 bilhões de m³ anuais. Desses, só 2% são explorados.
O biometano também pode ser usado como fonte de energia para data centers, inclusive para inteligência artificial. Com a crescente demanda por esses serviços, o biometano é uma fonte de energia que não é intermitente, isto é, pode garantir de forma constante energia elétrica para o centro de dados. Essa combinação de confiabilidade com sustentabilidade reforça o caminho para o Brasil enriquecer com energia para inteligência artificial, seja localmente ou fornecendo certificados de energia renovável (e créditos de carbono) fora do país.
Só que para tudo isso decolar é preciso que o biometano seja integrado à matriz energética do país. Isso requer investimento em infraestrutura, incluindo gasodutos, biodigestores e políticas claras para setores estratégicos, como transporte e data centers. O resultado é promissor: melhorar a gestão de resíduos, reduzir emissões, empregos e aumento da competitividade local.
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