Por Adriano Pires
Há várias pistas. Mas talvez a principal seja o que eu chamo de neocolonialismo energético que estamos vivendo no Brasil.
Já faz algum tempo que me faço a seguinte pergunta: a quem interessa descarbonizar mais ainda a matriz elétrica brasileira? Por que me faço essa pergunta? Porque a matriz elétrica brasileira tem na sua composição 85% de energia renovável. Portanto, o Brasil é o único país que já fez a transição energética na sua matriz elétrica. Então qual seria a explicação para essa verdadeira cruzada, conhecida como a corrida do ouro, de que é preciso ainda mais descarbonizar a matriz elétrica brasileira.
Várias pistas. Mas talvez a principal seja o que eu chamo de neocolonialismo energético que estamos vivendo no Brasil. O neocolonialismo energético fica bem claro quando observamos as estratégias adotadas para viabilizar o crescimento da geração, principalmente da energia solar e agora o hidrogênio.
Vamos aos fatos. No caso do solar se vende a ideia de que o consumidor teria a oportunidade de gerar a sua própria energia de forma mais barata e que isso também levaria a um aumento de empregos e um maior desenvolvimento econômico e social, em particular, da região Nordeste. Na realidade, a geração solar não gera empregos no Brasil e sim na China, de onde vem as placas solares, e só é mais barata devido aos subsídios sem fim dados pelo Congresso Nacional, o que acabou por criar o modelo Robin Hood às avessas onde o pobre subsidia o rico. Também, não aumenta a arrecadação dos Estados que geram com a solar, na medida que o ICMS é recolhido no Estado que consome a energia e não no que produz. Ou seja, o crescimento sem qualquer planejamento beneficia os geradores e a China duplamente com a venda das placas e a geração de emprego naquele país.
No caso do hidrogênio o neocolonialismo energético é maior ainda, pelo fato de que a ideia é produzir no Brasil com o consumidor brasileiro subsidiando e exportar para a Europa. Mais uma vez, o grande beneficiário são os vendedores de equipamento e os consumidores de energia da Europa.
Por fim e não menos importante, essa cruzada infundada da descarbonização, que exige investimentos em linhas de transmissão para levar a energia solar e a eólica do Nordeste para o Sudeste, fez com que o custo da transmissão crescesse quatro vezes, ou seja, 300% nos últimos dez anos, muito acima do crescimento da carga do sistema elétrico. Este custo de transmissão vai aumentar sete vezes, ou seja, 600% até 2027 em função dos leilões de transmissão já realizados pelo governo. Mais uma anomalia que explica o fato de termos energia barata e tarifa das mais caras do mundo para o consumidor cativo.
A quem interessa mesmo descarbonizar ainda mais a matriz elétrica brasileira? Certamente os beneficiários não são a Dona Maria e o Seu José (Adriano Pires é diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura – CBIE; Estadão, 17/8/24)