Para executivo da Galvani, licenciamento, custo do capital e isonomia tributária preocupam.
Após um período de dúvidas sobre o fornecimento de fertilizantes e seus preços elevados, devido à invasão da Ucrânia pela Rússia, a demanda nacional desse insumo deverá ser de 42,5 milhões de toneladas na safra 2023/24.
O número é da MB Agro Consultoria. Supera os 41,1 milhões da safra que se encerrou, mas fica abaixo dos 45,9 milhões do período 2021/22.
Essa estimativa, no entanto, não é fácil de ser feita, uma vez que diante do cenário complicado vivido pelo setor a área a ser plantada não deverá cair, mas a utilização de tecnologias nas lavouras sim, segundo Alexandre Mendonça de Barros, da MB Agro.
Ele acredita que parte dos produtores esteja elevando a utilização de nutrientes a partir de resíduos agroindustriais. O potencial desse setor é de 6 milhões de toneladas equivalentes a fertilizantes, vindas de vinhaça, esterco suíno e bovino e de cama de frango.
Barros diz que não se sabe quanto resíduo orgânico era utilizado nos anos anteriores, mas a alta dos preços dos fertilizantes inorgânicos deve ter estimulado o uso de orgânicos.
As afirmações foram feitas no 10º Congresso Brasileiro de Fertilizantes, da Anda (Associação Nacional para Difusão de Adubos), que discutiu também novos mecanismos para a transição energética.
Marcos Jank, do Insper, diz que o nome do jogo no futuro será bioenergia. A transição global para a energia de baixo carbono, no entanto, será lenta e complexa.
Na avaliação do cenário atual e do PNF (Plano Nacional de Fertilizantes), Marcelo Silvestre, presidente da Galvani, diz que o momento é propício para investimentos. Destacou que o plano traz previsibilidade boa.
Claro que há problemas e desafios, ressalta o executivo. O setor depende de mineração, e o subsolo pertence ao governo. Os licenciamentos, que podem ser federais e estaduais, geram uma certa instabilidade para o investidor.
Custo do capital e reforma tributária também são temas de preocupação. Silvestre destaca, no entanto, que tem havido uma interlocução melhor com o governo.
Bruno Fonseca, analista de pesquisa e análise setorial para o mercado de insumos do Rabobank, afirma que há uma necessidade de o PNF sair do papel. Na avaliação do banco, há uma urgência na execução de investimentos do setor porque 2050 já está aí.
Ele toma exemplo o caso da soja. O banco prevê uma produção de 206 milhões de toneladas da oleaginosa em 2030 . Isso significa uma necessidade de 20% a mais de importação de fertilizantes se a produção interna se mantiver em 7 milhões de toneladas.
Os desafios de 2030 serão para colocar no mercado interno esse volume de produto, considerando as dificuldades de logística e da capacidade dos portos. Além disso, o Brasil não está sozinho nessa corrida pelo adubo, e a competição será grande.
O mundo, contando com o Brasil, vai ter uma demanda de mais 15% de fertilizantes em 2030, e a execução de um projeto demora, afirma o analista.
O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, diz que é preciso a criação de um ambiente mais favorável para os investimentos no Brasil, o que geraria uma melhoria na competitividade do setor.
Tributação, infraestrutura, logística e demora no licenciamento são desafios para o setor. Na avaliação do ministro, fertilizantes trazem segurança alimentar, estabilidade econômica e controle inflacionário.
Para Jank, a agricultura se utiliza cada vez mais de tecnologia, aproveita melhor a terra e reduz a mão de obra sem qualificação. Com isso, 90% da produção do agronegócio vêm de apenas 500 mil produtores, de um universo de 5 milhões de estabelecimentos.
Carla Barroso Carneiro, representante do Brasil junto à ONU-FAO, diz é preciso garantir a segurança alimentar no mundo. Elevar a eficiência dos fertilizantes e buscar alternativas para as mudanças climáticas ajudam nesses desafios.
Guilherme Bastos, coordenador do FGVAgro (Centro de Estudos do Agronegócio), diz que é preciso a criação de uma diplomacia dos fertilizantes, diversificando as fontes de origem. Internamente, a sociedade deve debater sobre a exploração de reservas nacionais de fertilizantes.
É uma questão estratégica e é necessária uma avaliação melhor dos riscos dessa exploração, uma vez que esse insumo envolve segurança alimentar. Para o coordenador, são necessários também indicadores que possam auxiliar na avaliação.
O país tem 30 milhões de hectares de pastagens degradadas que podem ser incorporadas à produção de grãos. Aumenta a oferta de alimentos, mas também a necessidade de fertilizantes. Essa conversão de área degradada poderia remover 1 bilhão de toneladas de carbono em oito anos.
Roberto Rodrigues, presidente da ABCA (Academia Brasileira de Ciências Agronômicas), avalia que o mundo terá de tomar três grandes decisões: busca da segurança alimentar, renovação energética e administrar as questões ambientas. Todas passam pelo agronegócio, afirma (Folha, 30/8/23)