Por Arnaldo Luiz Corrêa
Para aqueles com experiência em estudar o mercado de açúcar ou outras commodities com uma perspectiva crítica, objetiva e focada, as tendências e sinais muitas vezes se revelam claramente. Esses observadores se dedicam a uma análise minuciosa dos fundamentos do mercado, considerando os alertas vindos do campo e evitando serem influenciados por emoções impulsivas. Tal abordagem conduz a um processo decisório mais ponderado e confiável. Contudo, o que se manifesta como evidente para alguns pode, de fato, ser uma surpresa para outros.
Para compreender melhor o cenário que contrasta com a lógica a que me refiro, isto é, gente que acredita numa alta de preços, examine os números fornecidos pela UNICA sobre a produção de cana na safra atual e avalie se existe algum indício real de escassez iminente. Não deixe também de observar os relatórios meteorológicos para verificar a presença do fenômeno El Niño. Você não encontrará nada, correto?
Quanto às tendências do mercado, este tem manifestado uma resistência notável em superar certos patamares de preços. Especificamente, vem enfrentando obstáculos para ultrapassar a barreira dos 24 centavos de dólar por libra-peso na safra atual, os 23 centavos para a safra 24/25 e os 20 centavos para a safra subsequente. Esses pontos têm se mostrado como barreiras firmes e consistentes.
A resposta está claramente delineada: o mercado fechou a sexta-feira com o contrato para vencimento em outubro de 2023 abaixo dos 24.00, chegando precisamente a 23.80 centavos de dólar por libra-peso, o que acumula uma queda semanal de 53 pontos, equivalentes a quase 12 dólares por tonelada.
O contrato com vencimento em março de 2024 também fechou em queda, de 47 pontos, ou pouco mais de 10 dólares por tonelada. Os contratos futuros para a safra 24/25 do Centro-Sul finalizaram com uma média de fechamento de 22.07 centavos de dólar por libra-peso, e a safra 25/26 com 19.39 centavos de dólar por libra-peso.
Um aspecto importante a ser enfatizado é a diferença de 100 dólares por tonelada entre as safras 23/24 e 25/26. Essa informação é crucial para quem pondera sobre o momento ideal para fixar as vendas, especialmente no que concerne à safra 24/25, já que a 25/26 ainda pode ser considerada distante para tomar decisões sem uma proteção adequada (venda em reais por tonelada aliada a uma compra de uma call fora-do-dinheiro).
Retornando ao cenário de curto prazo, observamos uma situação interessante no spread entre outubro de 2023 e março de 2024. Este spread já mostra um carrego, o que ocorre quando o preço do mês mais curto está abaixo do preço do mês mais longo, ainda que essa diferença seja relativamente pequena (menos de 3% ao ano). Essa tendência sinaliza que o mercado prevê uma maior disponibilidade de produto do que se antecipava anteriormente.
Consideremos também o spread entre março e maio de 2024. Você pode se lembrar de nossa discussão anterior nesse mesmo espaço, quando ele era negociado a 150 pontos, e a nossa afirmação de que esse nível não se sustentaria a menos que houvesse uma mudança drástica na oferta e demanda. Pois bem, o spread fechou na última sexta-feira a 116 pontos, reduzindo-se em 7.50 dólares por tonelada. E vai estreitar mais.
Cada pessoa, ou talvez cada sonhador, adere à narrativa que mais lhe convém. Na vida corporativa, a linha entre ‘acreditar’ e ‘precisar acreditar’ é tão fina que poderia ser cortada com uma faca cega. Há notícias de empresas que esperam que os preços do açúcar subam até o final do ano, chegando a 30 centavos de dólar por libra-peso. Em Nova York, em maio, durante a semana do Jantar do Açúcar, alguns otimistas chegaram a apostar em 64 centavos! Aí você se pergunta: será que legalizar a cannabis na cidade teve algum efeito colateral nos analistas? E atenção, queridos leitores, estou falando de cannabis, não ‘cana bis’. A última, diferente de certas previsões, certamente marcará presença na próxima safra.
Mas vamos falar dos eternos otimistas, aqueles crentes fervorosos que acreditam em um retorno glorioso do açúcar em NY aos velhos e bons níveis de 30 centavos de dólar por libra-peso. Ah, essa possibilidade existe – mas somente se os deuses do clima estiverem de mau humor. Apostar na recuperação do mercado sem um fenômeno como El Niño sendo o protagonista é como dar um all-in num jogo de pôquer com um par de dois na mão. Às vezes a gente ganha com par de dois, é verdade. Mas, se você senta nessa mesa de pôquer em que o mercado de açúcar está se transformando e não identifica quem na sua mesa é o “pato”, cuidado. O pato pode ser você.
Os fundos especulativos prosseguem liquidando suas posições compradas. Saindo aos poucos do açúcar. Na minha visão, só estão aguardando um gatilho que venha do mercado de energia para trocarem as compras de açúcar pelas commodities energéticas que foram as que mais sangraram no acumulado dos últimos doze meses e, em tese, as que teriam maior potencial de alta. Mas, a economia da China mais lenta ainda não validou essa ideia na cabeça dos gestores. Na semana, os fundos liquidaram mais 19,000 lotes, mas ainda possuem 114,000 para vender. Vai vendo….
As usinas, de acordo com a nossa segunda estimativa de fixação de açúcares relativa à safra 2024/2025, com os dados consolidados até 31 de julho de 2023, estão fixadas um volume total de 6.24 milhões de toneladas de açúcar para exportação, com preço médio de 20.88 centavos de dólar por libra-peso. Esta cifra corresponde a R$ 2,432 por tonelada equivalente FOB Santos, montante que inclui o prêmio de polarização. Esse volume total corresponde a aproximadamente 24.0% da próxima safra. Honestamente, eu achava que o modelo iria dar um número maior. Ah, os modelos….
Para fins comparativos, é relevante destacar que, em 31 de julho do ano anterior, a fixação da safra 2023/24 situava-se em 27.5%. Simultaneamente, o valor médio das fixações apontava para 17.55 centavos de dólar por libra, o que equivalia a R$ 2,240 por tonelada FOB, já considerando o prêmio de polarização.
O real se desvalorizou frente ao dólar. Encerrou a semana a R$ 4.9703 retraindo 1.43% em comparação à sexta-feira passada. Apenas o usual desgaste do cenário macro, a infindável incerteza sobre o arcabouço fiscal, e a saída estratégica dos estrangeiros da bolsa de valores, que amargou doze dias de queda consecutiva – um recorde nostálgico que não víamos desde 1968. Mas, vamos ser otimistas: a queda acumulada foi menor do que 6%.
E por falar em otimismo, lembre-se da regra de ouro: nunca se apaixone por uma posição. Dinheiro no bolso não quebra nenhuma empresa.
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