Por Vitor Matsubara
Estudo da Universidade de São Paulo (USP) pretende abrir nova possibilidade de energia limpa para descarbonizar a frota brasileira.
O hidrogênio ainda não é considerado uma alternativa viável aos combustíveis fósseis no mundo, pois ainda apresenta barreiras consideradas de alto custo, como a cadeia produtiva, armazenamento complexo e a infraestrutura necessária para seu uso.
Um estudo realizado na Universidade de São Paulo (USP)quer mostrar como o etanol pode viabilizar a produção de hidrogênio renovável com importantes vantagens tanto para o meio ambiente quanto para o bolso.
“O custo do hidrogênio ‘verde’ obtido a partir do etanol é bem mais barato do que o valor do hidrogênio obtido a partir da eletrólise da água e também do hidrogênio a partir do gás natural. Além disso, a pegada de carbono do hidrogênio gerado pelo etanol é menor do que na eletrólise da água, mesmo com a matriz renovável de eletricidade disponível no país. Então podemos dizer que o Mirai será mais ‘verde’ no Brasil”, afirmou Thiago Lopes, professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP) e integrante do RCGI (sigla em inglês para Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa).
Inaugurado em 2015, o local já estudava maneiras de fazer com que o combustível derivado da cana-de-açúcar alimente células combustíveis de hidrogênio antes de receber um investimento de R$ 50 milhões da Shell Brasil. Além de financiar o projeto, a empresa petrolífera fornecerá o etanol necessário para os estudos por meio da distribuidora Raízen. A produção do hidrogênio será realizada com tecnologia da Hytron e o Senai prestará suporte no processo.
“Estamos falando de um hidrogênio mais ‘verde’ e que oferece um preço mais competitivo. Se nós unirmos esses pontos com o fato de a cidade de São Paulo ter proibido a circulação de ônibus novos movidos a diesel, temos uma condição única de contribuir com uma redução significativa de emissões no cenário nacional”, analisou o professor da USP.
O plano da universidade paulista é construir uma planta dentro de seu campus capaz de produzir 4,5 quilos de hidrogênio por hora, com início das atividades previsto para o primeiro semestre de 2024. Até lá, os três ônibus de testes que já circulavam pelas ruas da universidade paulista terão a companhia de um Toyota Mirai.
O sedã trazido pela própria fabricante já foi avaliado brevemente por Autoesporte e chamou atenção pela condução suave e o conforto digno de um bom carro executivo.
Além de encontrar uma fonte renovável e abundante para a produção do hidrogênio renovável, o projeto encabeçado pela USP quer calcular as emissões de CO2 na atmosfera do cultivo da cana ao consumo do hidrogênio pela célula combustível do veículo.
De quebra, o estudo resolveria outro importante problema: a falta de infraestrutura para abastecer um carro a hidrogênio, algo que ocorre no mundo inteiro. Segundo informações do Statista (plataforma virtual especializada em compilar dados de mercado), a China é o país com o maior número de estações de abastecimento de hidrogênio, e ainda assim o número é modesto: são apenas 250 pontos.
No Brasil, ao menos por enquanto, esse crescimento esbarra no custo. Recentemente, a própria fez um orçamento para a instalação de uma estrutura de abastecimento importada da Europa dentro de sua fábrica, na cidade de Sorocaba (SP). A conta ficou em mais de R$ 4 milhões, o que fez a empresa desistir da ideia e improvisar uma solução com uma válvula e alguns cilindros.
Entusiastas do hidrogênio
A participação da Toyota no projeto está alinhada com o discurso do novo CEO da empresa. Para Koji Sato, o hidrogênio desempenha um papel fundamental na estratégia de carbono zero da fabricante, mesmo com as atenções da montadora voltadas atualmente para os carros elétricos.
“Queremos assegurar que o hidrogênio permaneça como uma opção viável. Precisamos investir mais em produção e na cadeia de suprimentos. Se não houver evolução nestes pontos, não veremos crescimento no uso deste tipo de energia”, afirmou Sato, que está no cargo desde abril deste ano.
A marca japonesa é uma das poucas fabricantes que vendem um carro com célula de combustível a hidrogênio. Fora a empresa, apenas Honda (com o FCX Clarity) e Hyundai (com o Nexo) oferecem modelos deste tipo – e somente em alguns mercados, como Ásia e América do Norte. Por coincidência ou não, nenhuma das empresas possuem presença forte nos segmentos de carros híbridos e elétricos.
A BMW também defende a utilização do gás para alimentar as células de combustível dos veículos em um futuro próximo. No fim de 2022, a empresa prometeu o lançamento de um carro a hidrogênio “viável” até o final da década.
“É uma fonte de energia versátil que tem um papel fundamental a desempenhar no processo de transição energética e, portanto, na proteção do clima”, declarou o presidente da BMW, Oliver Zipse.
Ainda não se sabe qual será o modelo em questão, mas a marca trabalha no desenvolvimento de uma versão a hidrogênio do X5. Prova disso é o lançamento recente de uma frota piloto com “menos de 100 veículos” iX5 Hydrogen que vão circular por Munique, onde fica a sede da montadora alemã. A intenção é realizar demonstrações da tecnologia e testes com vários grupos de interesse. Ironicamente, os veículos utilizam células de combustível fornecidas pela… Toyota (Auto Esporte, 19/4/23)