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Muito show, pouco agro

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Editorial O Estado de S.Paulo

O presidente Bolsonaro usa a maior feira de agronegócios do País para fazer campanha eleitoral irregular, mas nada fala sobre as condições de financiamento da safra 2022/2023.

Depois de dois longos anos, o arrefecimento da pandemia de covid-19 tem finalmente permitido a retomada dos tão aguardados eventos presenciais. Um deles é a Agrishow, principal feira de agronegócio do País, realizada em Ribeirão Preto (SP). Naturalmente, a presença do presidente Jair Bolsonaro na cerimônia de abertura gerou expectativas. Sua passagem teve de tudo – motociata, cavalgada e mais um discurso antidemocrático –, exceto o essencial: o anúncio das condições do Plano Safra 2022/2023, maior programa de financiamento do setor.

De certa forma, isso não deveria surpreender ninguém. Linhas do Plano Safra 2021/2022 com taxas de juro subsidiadas estão suspensas há semanas porque não há recursos para equalizar os empréstimos. Praticamente todo o volume de R$ 7,8 bilhões aprovado no Orçamento pelo Legislativo acabou há quase dois meses, quando o Ministério da Economia suspendeu a contratação de novas operações pelas instituições financeiras.

Ao menos em tese, o dinheiro deveria durar até junho, mas a subida da taxa básica de juros, de 2% em março do ano passado para os atuais 11,75%, contribuiu para consumir os recursos mais rapidamente. A única linha que ainda estava com crédito liberado, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf Custeio), foi suspensa pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no último sábado. Na melhor das hipóteses, o projeto de lei do Congresso Nacional que garante mais R$ 868,5 milhões para a equalização das taxas será votado nesta semana, mas os recursos não serão suficientes para todos. Em paralelo, a Organização das Cooperativas do Brasil (OCB) pediu um aumento de 31% nos recursos do Plano Safra 2022/2023, para R$ 330 bilhões, ante R$ 251,22 bilhões da safra atual. Seria o valor necessário para dar conta da demanda do setor e da conjuntura de disparada da inflação, Selic em alta e avanço dos custos de produção – insumos, defensivos e fertilizantes, bem como comercialização e investimentos.

Nada disso fez parte do discurso de Bolsonaro no evento. Em 20 minutos, houve espaço para defender o perdão que concedeu ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), a autorização para o garimpo em terras indígenas, a atuação do ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, a ampliação do acesso da população a armas e a retomada dos ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF), além de ventilar as tradicionais teorias da conspiração que fazem parte do universo bolsonarista. Sobre sua inoportuna visita à Rússia às vésperas da invasão da Ucrânia, o presidente disse que o encontro com o presidente russo, Vladimir Putin, garantiu a importação de fertilizantes, embora não tenha firmado nenhum compromisso formal nesse sentido.

Diante de uma indústria enfraquecida e serviços cambaleantes, o agronegócio tem sido fundamental para sustentar a economia. O setor encerrou o ano com participação de 27,4% no PIB, a maior desde 2004, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Esalq/USP e a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Mesmo com a seca, o PIB do agronegócio subiu 8,36% em 2021. Porém, há riscos. No mais recente Relatório Trimestral de Inflação (RTI), o Banco Central manteve a projeção de crescimento do PIB em 1% em 2022, mas reduziu a estimativa para o agro de 5% para 2% em razão da quebra de safras.

Esses números deixam claro que o segmento precisa ser tratado com prioridade pelo governo, não em razão do eleitorado que potencialmente representa, mas por causa da sua relevância para a economia. A Agrishow, no entanto, serviu apenas como palco de um teatro de ambos os lados. Bolsonaro faz seu show e finge apoiar o setor em busca de votos, e o agro aceita posar para fotos na expectativa de obter algum retorno. Não impressiona que Bolsonaro aproveite toda e qualquer situação para fazer campanha: é só o que ele faz desde 2019. O que chama a atenção é o fato de que lideranças do agronegócio se deixem utilizar para fins políticos por tão pouco – ou mesmo nada (O Estado de S.Paulo, 28/4/22)

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