Por Roberto Rodrigues
País deve fazer de tudo para manter relações comerciais com o mundo todo, sem preocupações com sistemas de governo ou ideologias políticas.
Um dos mais complexos debates resultantes da pandemia da covid-19 e mais da invasão da Ucrânia pela Rússia é a especulação sobre o que vai acontecer com a globalização da economia.
Muitas cadeias globais tiveram problemas com fornecimento de insumos ou componentes essenciais, levando seus responsáveis a repensar a forma de produção, até mesmo em voltar a produzi-los no país da matriz, de maneira a garantir a integridade do produto final.
Outra questão que domina discussões pelo mundo afora é a segurança alimentar, em pelo menos duas vertentes: a primeira é a redução de dependência externa de alimentos. Países que são grandes importadores já começam a procurar novos fornecedores ou, mesmo, buscam aumentar sua própria capacidade produtiva.
Em nome da segurança alimentar, algumas regras têm sido desconsideradas. Exemplo mais recente é a da possibilidade de países europeus permitirem a seus agricultores o plantio nas áreas em pousio.
Em nome da defesa do meio ambiente, pousio é a política pública que mantém, com subsídios, terras privadas sem cultivo por um determinado tempo, tendo em vista restabelecer os nutrientes extraídos com plantios anteriores.
Com isso, pode ser que o tema ambiental espere um pouco. Aliás, seria interessante que se preocupassem também com sua matriz energética, baseada em fósseis e com menos de 20% renováveis, enquanto a nossa tem mais de 19% de origem agro na matriz, com 48% renováveis.
A outra vertente é a escassez de fertilizantes, responsável por um brutal aumento de nossos custos de produção para a próxima safra.
Mas o ponto fundamental dessa discussão toda é realmente o destino da globalização. Analistas respeitados (como o ex-embaixador do Brasil Rubens Barbosa) acreditam que talvez caminhemos para uma nova dicotomia geopolítica: de um lado, o ocidente, com a liderança de países e blocos poderosos (EUA e UE), que influenciam instituições multilaterais como a ONU; de outro lado, a Ásia, importantíssima no comércio mundial, sob a liderança informal da China.
Como ficaríamos num eventual cenário como esse? Somos um país ocidental, mas mais da metade de nossas exportações vai para a Ásia. Claro, devemos fazer de tudo para manter relações comerciais com o mundo todo, sem preocupações com sistemas de governo ou ideologias políticas.
Mas como seremos vistos pelos diferentes grupos de países exportadores/importadores? São questões que podem trazer mudanças importantes no nosso comércio internacional. Devemos estar atentos a elas (Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura é coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas; O Estado de S.Paulo, 10/4/22)