Cerimônia de lançamento contou com ao menos 14 ministros, mas poucos membros da bancada ruralista.
O presidente Lula (PT) anunciou nesta terça-feira (27) que o Plano Safra 2023/2024 irá somar R$ 364,22 bilhões para o financiamento da atividade agropecuária de médio e grandes produtores.
O anúncio do valor, recorde —conforme antecipou a Folha—, acontece em meio aos esforços do governo para melhorar a relação com o agronegócio, setor que esteve próximo de Jair Bolsonaro (PL). Uma segunda parte do plano, voltada ao crédito rural para a agricultura familiar, será lançada nesta quarta.
A expectativa, segundo integrantes do governo, é que o valor total fique entre R$ 420 bilhões e R$ 430 bilhões –o que representaria um forte aumento em relação ao pacote anterior, que somou R$ 340,9 bilhões lançados por Bolsonaro para a safra 2022/2023.
Segundo o governo, a parte do plano lançada nesta terça é 27% maior do que a da safra anterior (R$ 287,16 bilhões no ano passado).
As taxas de juros para custeio e comercialização serão de 8% ao ano para os produtores enquadrados no Pronamp (Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural). Para os demais, serão de 12% ao ano. Para investimentos, as taxas de juros variam entre 7% e 12,5% ao ano., de acordo com o programa.
O governo também incluiu no plano uma redução extra para produtores que adotarem práticas sustentáveis e quiserem tomar crédito para custeio.
O corte é de 0,5 ponto percentual para produtores rurais que já estão com o CAR (Cadastro Ambiental Rural) analisado. Se o produtor adota medidas como produção orgânica ou agroecológica e bioinsumos, poderá conseguir outra redução de 0,5 ponto percentual na taxa de juros. Ou seja, se preencher os dois requisitos, a queda será de 1 ponto percentual.
Na cerimônia de anúncio no Palácio do Planalto, Lula prometeu que as próximas edições do Plano Safra serão melhores a cada ano, após o anúncio de um valor recorde para a edição 2023/2024.
O petista acrescentou que está enganado quem pensa que seu governo vai tratar o agronegócio de maneira ideológica, por causa da proximidade do setor com o seu antecessor. Também disse que um governo responsável não tem a “pequenez” de insuflar o ódio.
“É o primeiro Plano Safra do nosso governo. E como os outros, de 2003 a 2015, não tenho medo de dizer a vocês, que todos os anos a gente vai fazer planos melhores do que o ano anterior. Estou convencido disso”, afirmou o mandatário.
Lula disse ainda que seu governo vai criar uma “prateleira” de terras improdutivas para que haja uma política de assentamentos antes de movimentos sociais invadirem as propriedades rurais. Ele declarou ainda que, para haver uma reforma agrária no país, “não precisamos sequer ter mais invasão de terra”.
O Plano Safra, cujo objetivo é financiar a atividade agrícola no Brasil, é visto como senha para tentar melhorar a relação com um segmento que tem puxado o crescimento econômico neste início de ano.
O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro (PSD), disse após a cerimônia que a resistência do agronegócio em relação a irá cair. “Nos próximos seis meses, o presidente Lula já pode passar em qualquer evento, em feira agropecuária ou sindicato rural que ele vai ser muito bem recebido”, disse o ministro à Folha.
“Todos aqueles que conseguem já fazer essa análise clara, transparente do momento que estamos vivendo, já reconhecem que não precisa ter temor, sabe que é um governo que vai ajudar o agro como sempre o presidente Lula fez”, afirmou.
O petista foi acompanhado por pelo menos 14 ministros na cerimônia de lançamento do plano. Além de Fávaro, estavam presentes Fernando Haddad (Fazenda), Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar), Marina Silva (Meio Ambiente) e Rui Costa (Casa Civil), além do vice-presidente e ministro do Desenvolvimento e Indústria, Geraldo Alckmin, entre outros. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), se sentou ao lado de Lula.
Por outro lado, o evento teve menos representantes do Congresso do que nas cerimônias nos últimos anos de Bolsonaro. Poucos integrantes da bancada ruralista foram ao Planalto.
A ala de parlamentares foi ocupada pelo núcleo da articulação política, como os líderes do governo José Guimarães (PT-CE), Jaques Wagner (PT-BA) e Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), e o líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PR).
O presidente da bancada ruralista, deputado Pedro Lupion (PP-PR), não compareceu ao lançamento do Plano Safra porque está numa missão oficial na Argentina.
A cúpula da FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária) foi representada por Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), vice-presidente da bancada na Câmara, e pelo deputado Fábio Garcia (União Brasil-MT), um dos coordenadores do grupo
Integrantes da Câmara afirmam que a baixa presença no evento de Lula se deve à data escolhida pelo presidente para anunciar o programa para o agro. A semana está esvaziada pelas festas de São João no Nordeste e pela ausência de sessões na Câmara por causa da viagem do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), a um evento em Portugal.
Entre parlamentares de partidos aliados ao governo, poucos líderes foram ao Planalto. O líder do PSD na Câmara, Antonio Brito (BA), e a senadora Leila Barros (PDT-DF) estiveram no lançamento.
A ministra Marina Silva destacou as medidas de incentivo a práticas ambientais no setor do agronegócio. “Os senhores poderão ser a linha de frente dessa exportação de sustentabilidade”, disse, se referindo aos ruralistas.
Também presente no evento, Haddad exaltou o trabalho conjunto dos ministérios para lançar o novo Plano Safra e defendeu a sustentabilidade, afirmando que o governo Lula não vai buscar o crescimento econômico “a todo custo”
“Não queremos desenvolvimento a todo custo. Nós queremos compatibilizar o crescimento da economia com outros valores tão importantes quanto este. Eu vejo muita sensibilidade de todo o setor agrícola nessa questão”, afirmou.
REPRESENTANTES DO AGRO FAZEM CRÍTICAS AO PLANO
Apesar do entusiasmo do governo, representantes do agronegócio já apontam críticas ao programa de Lula.
Para José Mario Schreiner, vice-presidente da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), o plano precisa ser aprimorado na parte de seguro rural, que ajuda o produtor a se proteger financeiramente contra prejuízos causados por desastres naturais, queda de produtividade, e outros eventos imprevisíveis.
Além disso, o critério de exigir o CAR para conceder uma redução extra na taxa de juros não é, na avaliação dele, o mais adequado, por causa da demora na emissão desse certificado. “Como é que pode excluir 80% dos produtores sendo que eles não têm culpa nenhuma?”, questionou.
O presidente da Aprosoja (Associação Brasileira dos Produtores de Soja), Antonio Galvan, pediu aumento de recursos para a construção e ampliação de armazéns e também apontou falta de verba para o seguro rural.
“Havia a expectativa de o plano ter um pouco mais de recursos, mas temos que trabalhar com o que se tem. Precisamos de uma proteção maior por adversidades climáticas ou crise de preços”, disse.
O evento no Planalto teve baixa adesão de parlamentares da bancada ruralista. O governo argumenta que o lançamento do plano ocorreu numa semana esvaziada em Brasília, que não terá sessão na Câmara.
A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) foi representada pelo vice-presidente Arnaldo Jardim (Cidadania–SP), que também engrossou o coro pela redução das taxas de juros.
“É claro que as taxas de juros poderiam ser menores, mas reconhecemos que, com a manutenção da taxa Selic a 13,75% exigiu que a equalização de juros [que permite juros mais baixos para o setor] ficasse numa situação difícil. Reconhecemos o esforço do governo”, declarou Jardim.
Em resposta às críticas, Fávaro informou que já está estudando uma forma de elevar os recursos para o seguro rural e pediu que o agronegócio reforce, junto ao governo, a pressão para o Banco Central reduzir os juros no país.
“Se nós tivéssemos taxas básicas de juros mais baixas, certamente não teríamos mais recursos para seguro, juros mais baixos no Plano Safra. Eu gostaria muito que o setor nos ajudasse com a responsabilidade que tem na cobrança ao presidente do Banco Central”, afirmou o ministro.
Para Fávaro, as perspectivas para a relação do agro com o governo são boas, porque “na medida em que você vai trabalhando, fazendo entregas, reconhecendo a importância do setor, gerando mais oportunidades e apoiando nas dificuldades, certamente todo mundo vai percebendo que não há discurso radical de nós contra eles e o Plano Safra é mais um grande passo nesse sentido”.