Por Vinicius Torres Freire
Não se sabe o tamanho ou a duração do tumulto, mas finança está em reviravolta ruim.
Estamos em uma crise financeira, crise mundial, de duração e tamanho incertos. O rolo vai ter alguma ou muita influência, da sua aplicação no banco à política econômica do governo, passando pelo Banco Central, para citar apenas questões caseirinhas.
É o estágio um da crise: as autoridades dizem que os problemas são localizados e o sistema é sólido. Apagam os incêndios que enxergam. Pode haver fogo em outra parte.
Fazer prognóstico seria agora, mais do que sempre, chute desinformado. Desconhece-se o tamanho de certos estragos. Alguns mercados são obscuros (não há dados, cotações ou quantidades, públicos). Os entendidos fazem avaliações ainda mais disparatadas.
Francamente, quase ninguém deve mesmo saber a dimensão do que se passa.
Faz uma semana, não havia sinal de terremoto ou quase ninguém prestava atenção a prenúncio de problema.
Até quarta-feira da semana passada, os povos dos mercados discutiam se a taxa básica de juros dos EUA AUMENTARIA em 0,25 ou 0,5 ponto percentual. Até então, as taxas de juros que definem o custo de financiamento do governo SUBIAM. Começaram a cair na quinta-feira e despencam desde segunda-feira.
Nesta quarta, especulava-se, em palavras e atos, se o Fed, o BC dos EUA, vai elevar a taxa básica na quarta-feira que vem e o quanto vai BAIXA-LA até o final deste 2023.
Não dá para confiar muito nem mesmo na informação que vem do mercado de juros dos EUA. Segundo relatórios de alguns bancões e relatos da mídia financeira americana, os negócios com títulos do governo estão meio emperrados, engasgados, por falta de liquidez (não há bastante ofertas de compra e venda). E daí? Quando há pouco dinheiro na praça, poucos negócios podem provocar variações grandes de preços.
Há quem compare este engasgo de agora ao do começo de 2020, que piorou muito com a epidemia. Foi um dos motivos pelos quais o BC dos EUA voltou a tomar as medidas extremas e heterodoxas que se tornaram comuns desde 2008. Na prática, mas indiretamente, o Fed passou a financiar governo e certos setores da economia.
Por enquanto, não se fez nada de parecido. O fundo garantidor de crédito dos EUA salvou os correntistas gordos do SVB; o Fed ofereceu empréstimos para que bancos não precisem vender seus títulos a preço de liquidação. Mas parou por aí, uma tentativa de circunscrever a crise dos bancos médios do país. Na Europa, a Suíça diz que vai dar segurar as pontas do Credit Suisse, bichado e com uma capivara, ficha corrida, ruim.
A decisão do Fed sobre os juros na semana que vem é complicada. A inflação ainda está alta, maior do que no Brasil. Pelo manual, bancos centrais fariam o possível para conter o que, se diz, seria apenas uma crise de liquidez (acesso regular a financiamento) e os pânicos. Outras agências salvariam atropelados, a crise amainaria e a definição da taxa básica de juros seria pautada pelo problema inflacionário.
O “socorro” virá. Altas de juros e finais de ciclo de crédito, com mais ou menos especulação ruim ou bolhas, sempre dão problema. Sem “socorro”, o sistema não para em pé, como se sabe pelo menos desde 1929.
Mas é conversa mole dizer que a política do Fed ou do BC do Brasil ficarão insuladas, protegidas do rolo. Todas essas questões se entrelaçam. Qual o efeito de juros ainda mais altos sobre bancos? O pânico de agora vai provocar quebradeiras, paradão na economia dita real?
O BC do Brasil, que decide o que fazer da Selic também na semana que vem, vai enfrentar problema similar, em outra escala. Talvez tenha a ajuda do ministério da Fazenda, que pode apresentar um bom plano para gastos e dívida, o que seria um alívio para a crise aqui neste rincão do mundo.
A gente não precisava mais desta (Folha de S.Paulo, 16/3/23)