Para executivos do setor, produtores aproveitam alta da gasolina para melhorar margens.
O preço do etanol hidratado subiu nas bombas quase cinco vezes o esperado após a retomada da cobrança de impostos federais na semana passada. Para o setor, usineiros se aproveitaram da alta da gasolina para melhorar suas margens de lucro.
Segundo dados divulgados na segunda-feira (6) pela ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis), o litro do etanol teve alta de R$ 0,09 por litro, ou 2,4%, na semana passada, passando a ser vendido pelos postos a R$ 3,88, em média.
Na última quarta-feira, o governo havia anunciado a retomada da cobrança de PIS/Cofins sobre o produto, suspensa desde maio de 2022, em uma alíquota de R$ 0,02 por litro, ou quase um quinto da alta verificada nas bombas na mesma semana.
Executivos de distribuidoras e donos de postos ouvidos pela Folha dizem que a alta reflete repasse de aumento promovido pelas usinas de cana-de-açúcar na semana passada.
De fato, dados do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada) da Esalq/USP mostram que a cotação do etanol hidratado em Paulínia (SP), o principal centro de movimentação de combustíveis do país subiu quase R$ 0,10 por litro na virada do mês.
Entre o dia 28 de fevereiro e o dia 1º de março, quando os impostos federais voltaram a ser cobrados, o litro do etanol hidratado em Paulínia passou de R$ 2,817 para R$ 2,893, sem considerar os impostos. No dia 2, o valor chegou a R$ 2,902.
Nos últimos dias, houve um recuo: na segunda (6), a cotação chegou a R$ 2,865 e na terça (7), baixou a R$ 2,831, pouco acima do verificado antes da reoneração.
“Nos primeiros dias após o anúncio do aumento dos tributos, o preço no produtor apresentou leve aumento, mas já foi praticamente anulado ao longo dos últimos dias”, defendeu a Unica (União da Indústria da Cana-de-Açúcar e Bioenergia).
Em nota enviada à Folha, a entidade que representa os usineiros diz que os estoques atuais, a produção de etanol de milho e o início da safra da cana “garantem volume dos biocombustíveis em proporção adequada para o regular abastecimento do mercado”, mesmo com aumento esperado da demanda.
Mas, com a alta do etanol nas usinas, o preço de bomba do produto permanece desvantajoso em relação à gasolina na maior parte do país: apenas em Mato Grosso vale à pena usar o biocombustível, do ponto de vista financeiro. No Amazonas, em São Paulo, em Goiás e em Minas Gerais, é indiferente.
Nos outros estados, o consumidor perde dinheiro se optar pelo etanol, considerando que o rendimento é menor do que o da gasolina. A Fipe (Fundação Instituto de Pesquisa Econômica) considera que, se o percentual está entre 65% e 75%, não há vantagens nem desvantagens na escolha do combustível.
Em Mato Grosso, a relação era de 65,35% na semana passada. Nos outros quatro estados citados, ficava entre 70,37% (Amazonas) e 74,80% (Minas Gerais). Os dados da ANP, porém, parecem não ter captado ainda toda a alta da gasolina, já que começam a ser coletados no início da semana.
Ao anunciar a retomada dos impostos federais sobre os produtos, o governo decidiu elevar a diferença de alíquotas com o objetivo de incentivar o uso de etanol. Enquanto este recolhe R$ 0,02 por litro de PIS/Cofins, o derivado de petróleo recolhe R$ 0,47.
A vantagem tributária era defendida pelas usinas sob o argumento de que o Brasil precisa consumir menos combustíveis fósseis. Até o momento, porém, o mercado vê apenas uma recuperação de margens do setor, que passou meses estrangulado pela gasolina barata.
Entre a primeira semana de fevereiro de 2022 e a primeira semana de fevereiro de 2023, o preço médio do etanol hidratado nos postos brasileiros caiu 36%, considerando a inflação do período, para R$ 3,82 por litro.
O setor de combustíveis reclama que as usinas têm adotado, ao longo do tempo, a estratégia de tentar manter o preço do etanol equivalente a 70% do preço da gasolina, o que lhe garante maiores ganhos quando a gasolina está mais cara (Folha de S.Paulo, 9/3/23)