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Para segurar preços, Brasil troca biocombustíveis por derivados de petróleo

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Vendas de combustíveis menos poluentes despencam e importação de diesel dispara em 2022.

A recuperação das vendas de combustíveis após a pandemia no Brasil foi dependente de importações e mais poluente, reflexo do esforço do governo para segurar a escalada de preços provocada pela alta das cotações internacionais do petróleo.

Com o corte de impostos sobre a gasolina, o consumo de etanol em 2022 é o menor dos últimos cinco anos. As vendas de biodiesel foram derrubadas pela redução na mistura obrigatória no diesel e recuaram a níveis de 2019.

“Andamos para trás. O Brasil passou a importar mais combustíveis e exportar empregos e divisas”, diz o ex-diretor da ANP Luiz Augusto Horta. “Foi uma intervenção atabalhoada, equivocada, que só privilegiou gasolina e diesel.”

Segundo dados da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis), o consumo de combustíveis líquidos chegou a 100,8 bilhões de litros nos primeiros dez meses de 2022, batendo recorde histórico.

A alta é puxada principalmente pelo consumo de diesel, que ficou na casa dos 52,9 bilhões de litros no período, também recorde. As vendas de gasolina também sobem, recuperando as perdas da pandemia, mas ainda estão abaixo do registrado em 2017.

No caso do diesel, porém, os recordes não impulsionaram as vendas de biodiesel, já que o governo vem mantendo a mistura obrigatória em 10% para conter a alta no preço do combustível. Pelo cronograma original, deveria estar em 14%.

Nos primeiros sete meses do ano, últimos dados disponíveis pela ANP, as vendas de biodiesel no país somaram 3,6 bilhões de litros, o menor volume desde os 3,3 bilhões do mesmo período de 2019, quando a mistura era de 11%.

A redução da mistura foi decidida em um momento de escalada do preço do biodiesel e, em novembro, o Ministério de Minas e Energia anunciou que os 10% serão mantidos até março de 2023, para que o novo governo decida pela retomada do cronograma original.

“Tem um setor empresarial que atendeu ao pedido do governo por descarbonização, por uma matriz de combustíveis mais verde, mais limpa, mais sustentável e isso foi descartado”, diz Daniel Amaral, economista-chefe da Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais).

Segundo ele, os investimentos nos últimos anos já previam um incremento da mistura para até 20% e, portanto, o setor trabalha com uma ociosidade de 50%. A questão dos preços, defende, foi pontual e hoje o biodiesel tem custo equivalente ao do diesel importado.

No caso do etanol, a perda de competitividade em relação à gasolina derrubou as vendas a 12,9 bilhões de litros entre janeiro e outubro. É o menor valor desde 2017, de acordo com os dados da ANP. O mercado foi ocupado pela gasolina, que teve o melhor volume de vendas desde aquele ano: 34,8 bilhões de litros.

Considerando o produto vendido nos postos e os volumes misturados à gasolina, o etanol representou, nos sete primeiros meses de 2022, 47,5% dos combustíveis consumidos por veículos leves no país. Nos quatro anos anteriores, o volume de etanol foi superior ao de gasolina.

A Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar) diz quem, além da perda de competitividade no segundo semestre, a quebra de safra em 2021 também prejudicou as vendas no início do ano, quando os preços do etanol escalaram.

A produção, diz a entidade, está se acelerando neste fim de ano, quando o produto já não é mais tão competitivo devido aos cortes de impostos da gasolina.

A substituição dos renováveis por combustíveis fósseis tem implicações na balança comercial brasileira. Com menos biodiesel e aumento das vendas, as importações de diesel dispararam no primeiro semestre, chegando a 7 bilhões de litros, alta de 31% em relação a 2019, antes da pandemia.

O novo governo terá o desafio de equacionar a questão, dizem os entrevistados. O setor público, diz a Unica, “precisa garantir um arcabouço legal e regulatório que reconheça os benefícios das energias renováveis e ofereça estabilidade e previsibilidade para investimentos.”

O coordenador da área energética da equipe de transição, Maurício Tolmasquim, diz que ainda não há definições sobre o tema, mas que a ideia é estimular o consumo de combustíveis renováveis.

“O Brasil está se posicionando fortemente na questão da transição energética e, sem dúvida, os biocombustíveis fazem parte dessa transição. Então a ideia é estimular, mas tem a questão dos preços, então temos que ver melhor a situação”, pondera.

Ele elogia a decisão de prorrogar o prazo para avaliar a mistura de biodiesel. “Como existe uma polêmica entre o setor de transportes e o biodiesel, é prudente que o novo governo tenha prazo para tomar pé da situação.”

Henrique Jager, do Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), diz que o cenário reflete uma série de políticas equivocadas. “De um lado, a falta de um programa robusto de alteração na matriz de transporte do país, dominada pelo transporte rodoviário”, afirma.

De outro, continua, o “quase abandono” do programa de biodiesel no Brasil, a falta de uma política de estoques mínimos de etanol para reduzir volatilidades, os subsídios aos combustíveis fósseis e a falta de incentivo da frota movida a eletricidade (Folha de S.Paulo, 6/12/22)

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