Por José Roberto Mendonça de Barros
Eletrificação da frota vai mexer muito com o setor, a começar por dois fatos: os atuais veículos a combustão têm de 10 a 30 mil partes; carro elétrico puro apenas 200 componentes.
A atual crise de energia apenas reforça a inexorável marcha da transição energética. Mesmo considerando a necessidade de se utilizar, emergencialmente, carvão e outras fontes poluentes, a mensagem é clara: é cada vez mais urgente avançar na direção de fontes energéticas limpas.
Entretanto, algumas coisas já estão razoavelmente avançadas. Na produção de energia elétrica, a eólica e a solar já são amplamente competitivas. No caso da mobilidade, também não há mais dúvida: EUA, Europa e China já tomaram a opção de partir para a eletrificação da frota de veículos. Muitas empresas planejam deixar de produzir carros com motor a combustão até 2035. Em consequência, existem grandes programas de investimento na montagem de uma infraestrutura de abastecimento/recarga e uma corrida em direção à produção de baterias. Buscam-se produtos mais potentes, compactos, leves e que recarreguem em menor tempo.
A eletrificação da frota vai mexer profundamente com o setor, a começar por dois fatos: os atuais veículos a combustão têm de 10 a 30 mil partes. O carro elétrico puro tem apenas 200 componentes. Dá para imaginar o tamanho da alteração da indústria, e esta é uma corrida na qual, ao fim, poucos serão vencedores, sendo que algumas empresas serão novas no ecossistema.
O mercado brasileiro está sendo testado com veículos elétricos importados, mas existem dificuldades. Os carros são caros para a renda média brasileira, embora o custo de uso seja bem mais barato do que o dos veículos tradicionais. Além disso, a inexistência de uma rede de abastecimento limita os deslocamentos.
Nessas condições, parece-me claro que o futuro imediato da indústria brasileira só poderá estar ligado a carros híbridos (inclusive plug-in) a etanol. Esses são menos poluentes do que o elétrico puro, sempre que a carga das baterias provenha de eletricidade produzida por carvão, óleo combustível e gás natural, como é o caso na Europa, na China e nos Estados Unidos. Algumas montadoras com operação no Brasil já adotaram essa rota, como a Toyota.
Embora ainda não esteja operacional, a solução mais atraente seria um veículo com célula de combustível a partir do etanol. Este projeto vem sendo desenvolvido pela Nissan e outras empresas. Aí, sim, teríamos algo a recolocar o setor numa trilha sustentada de crescimento. Ademais, estaríamos explorando uma de nossas grandes vantagens comparativas, que é a da produção de cana e de um combustível que tem o melhor balanço energético, reconhecido no mundo todo (José Roberto Mendonça de Barros é economista e sócio da MB Associados; (*) Agradeço os comentários de Tereza Fernandez D. da Silva e João Fernando de Olibeira; O Estado de S.Paulo, 16/10/22)