Bolsonaro optou por solução caseira por medo de novos questionamentos, após indicação malsucedida de Adriano Pires.
A indicação de José Mauro Ferreira Coelho para o comando da Petrobras foi definida pelo governo de última hora, em uma decisão cercada de sigilo e sob a pressão de não deixar qualquer margem para novos questionamentos.
O fantasma da indicação malsucedida de Adriano Pires, empresário com laços na indústria de gás e que acabou desistindo pelo risco de conflitos de interesse, levou o governo a recorrer a uma solução caseira como estratégia.
Segundo relatos colhidos pela Folha, o martelo só foi batido pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) na tarde de quarta-feira (6), horas antes de a escolha ser oficialmente anunciada pelo Ministério de Minas e Energia.
Após diversas especulações sobre possíveis nomes, as indicações efetivas eram conhecidas por um círculo restrito: apenas o ministro Bento Albuquerque (Minas e Energia) e Ciro Nogueira (Casa Civil), além do próprio presidente.
Nem mesmo auxiliares palacianos ou secretários do alto escalão do MME participaram das negociações que levaram à escolha de Ferreira Coelho.
O governo esperou o fechamento do mercado para só então divulgar os novos nomes no comando da companhia. Além de Coelho, houve a indicação de Márcio Weber para a presidência do conselho de administração. Ele já integra o colegiado como um de seus membros desde o ano passado.
Nos últimos dias, a desistência de Pires e a indefinição em torno dos novos nomes para a Petrobras penalizaram as ações da companhia, que tiveram três pregões de queda. O anúncio do nome de Coelho reverteu o recuo, com os papéis da estatal liderando a alta da Bolsa nesta quinta.
Na tentativa de pôr fim ao desgaste que cercava a troca no comando da maior empresa de óleo e gás da América Latina, Bolsonaro queria uma escolha rápida, mas ao mesmo tempo certeira, sem espaço para novo revés. Também pesava o prazo exíguo, uma vez que a assembleia de acionistas que aprovará os nomes está marcada para 13 de abril.
O governo optou por uma solução caseira depois de esbarrar em dificuldades para encontrar alguém do mercado, com experiência no setor de óleo e gás, disposto a assumir a função a menos de nove meses do fim do atual mandato de Bolsonaro. Assim, ao final, apenas técnicos eram cotados.
Auxiliar do ministro Paulo Guedes (Economia), o secretário especial Caio Paes de Andrade foi um dos nomes considerados nos últimos dias, à medida que outros iam dizendo não à proposta.
O nome do secretário foi indicado por Guedes, mas o ministro evitou insistir em sua escolha. Ele acabou preterido, segundo relatos, por resistência do MME e de outros atores da ala política do governo: Paes de Andrade não tem experiência no setor, ao contrário de Coelho.
O nome da Economia também havia recebido um veto de peso, o do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), como mostrou a Folha. O deputado ainda criticou publicamente a possibilidade de se escolher um nome sem experiência na área para comandar a empresa.
A indicação de Coelho na quarta-feira foi precedida de outras reuniões em clima tenso. Aliados do governo ficaram incomodados com a desistência de Pires e chegaram a chamar de amadorismo a escolha de um nome que não passaria pelas regras de compliance da companhia.
Na terça-feira (5), Albuquerque esteve com o presidente Jair Bolsonaro no Planalto para discutir alternativas. Segundo relatos de fontes do governo, as opções dadas pelo ministro desagradaram ao chefe do Executivo, que já vinha bastante irritado com o impasse, e o clima azedou.
Nesse contexto, foi cogitada a possibilidade de eventualmente adiar a eleição do presidente da companhia, retirando o assunto da pauta da assembleia de acionistas marcada para 13 de abril. Essa opção acabou sendo depois descartada.
Antes de ser indicado ao comando a Petrobras, Coelho atuava como presidente do Conselho de Administração da estatal PPSA (Pré-Sal Petróleo S.A.) e estava cumprindo quarentena, após ter pedido demissão em outubro do ano passado, do cargo de secretário de Petróleo, Gás e Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia.
Até ser oficializado no posto, o novo indicado tem evitado falar publicamente. “Essa é a primeira etapa, a indicação. Temos ainda um caminho até a efetivação do cargo”, disse Coelho à Folha, por mensagem.
ESCOLHA DE COELHO AGRADA PARLAMENTAR E MERCADO
A escolha para a presidência da Petrobras agradou parlamentares. O deputado Christino Áureo (PP-RJ), coordenador da Freper (Frente Parlamentar para o Desenvolvimento Sustentável do Petróleo e Energias Renováveis), disse conhecer Coelho da época em que ele era secretário no MME e tinha um assento de conselheiro na frente parlamentar.
“É um excelente quadro e vai agregar muito neste momento”, disse Áureo. Segundo ele, Coelho tem “boa compreensão do ambiente e do momento” para perceber os “pontos de dificuldade” da Petrobras. O deputado defende maior transparência na política de preços da companhia, com eventuais ajustes.
“É preciso ter conhecimento para discutir a equação [da política de preços]. Acho que ele terá legitimidade para isso”, disse Áureo, ressaltando que não tem como antecipar qual será a direção tomada pelo novo presidente da companhia.
No mercado, as primeiras reações à indicação de Coelho foram de confiança na continuidade da estratégia e das políticas comerciais da companhia, entre elas a que define o preço dos combustíveis.
A indicação de Coelho foi a segunda desde que Bolsonaro decidiu demitir o general Joaquim Silva e Luna, na semana passada. O governo chegou a anunciar o empresário Adriano Pires, que desistiu do convite, após suspeitas de conflito de interesses.
Bolsonaro vinha criticando publicamente a gestão do general, após o mega-ajuste no preço dos combustíveis promovido pela companhia. Em diferentes momentos, o presidente criticou a política de preços da Petrobras.
O ministro da Casa Civil, contudo, negou que o governo tenha intenção de interferir na forma como a estatal precifica os combustíveis.
À Folha, Nogueira afirmou que o governo espera da nova gestão da estatal mais transparência à sociedade sobre a forma como é composto o preço dos combustíveis.
“É uma situação demagógica dizer que vai tornar o preço dos combustíveis em real. O arroz é em dólar, o feijão em dólar, o álcool é em dólar”, disse. “A Petrobras vai continuar totalmente independente”, completou (Folha de S.Paulo, 8/4/22)