Por Roberto Rodrigues
Irrigamos pouco em comparação com países desenvolvidos, embora dominemos as tecnologias.
O desastre do Rio Grande do Sul foi o mais trágico, e ainda demanda políticas públicas compatíveis com as brutais perdas rurais e urbanas sofridas pela população.
Em outras regiões a longa seca também vem trazendo pesados prejuízos em várias culturas, com consequente inadimplência nas cadeias produtivas.
Esta situação exige o aperfeiçoamento de instrumentos que garantam a atividade no campo, para o bem de todos os cidadãos.
O primeiro é a necessidade de um seguro agrícola eficaz. O nosso, criado há 21 anos, não cobre nem 10% da área agricultada no País. Já passa da hora de modernizar o sistema e dar-lhe condições de estabilizar as cadeias produtivas.
E o outro ponto a ser desenvolvido é a irrigação, mecanismo essencial para assegurar produções de alimentos à população brasileira e excedentes exportáveis para a segurança alimentar e energética de outros povos. Irrigamos muito pouco em comparação com os países desenvolvidos, embora já dominemos as tecnologias indispensáveis para esse fator de produção supereficiente, inclusive a fertirrigação.
É bom esclarecer o que é a “pegada hídrica”, para eliminar desinformações sobre o tema. “Pegada hídrica”, conceito introduzido em 2002 pelos holandeses Hoekstra e Hung, é um indicador para mapear o impacto do consumo em recursos globais de água doce nas diversas atividades urbanas e rurais.
E é fundamental desmistificar certas tolices repetidas, como a citada por Xico Graziano, Décio Gazzoni e Maria Thereza Pedroso em seu interessante livro Agricultura: fatos e mitos: mede-se a água que um bovino consome durante a vida e divide-se esse número pelo peso no momento do abate. E o resultado indica o gasto de 15 mil litros de água por quilo de carne! Imagine! Na verdade, o animal elimina água a vida toda, devolvendo ao meio ambiente o que bebeu. O mesmo acontece com as plantas: elas não “consomem” água, e apenas a “usam” em seu desenvolvimento, absorvendo-a pelas raízes com os nutrientes e depois a devolvem à atmosfera sob a forma de vapor, que vai virar chuva em outro lugar, como ensina Everardo Mantovani, mestre da irrigação.
A planta tira uma parcela ínfima da água, que garante a alimentação humana direta ou indiretamente. Isso é o que mede a pegada hídrica.
E é o que orienta a “alimentação” de plantas e animais, com água de chuva ou com irrigação. Vamos irrigar! (Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura e professor emérito da Fundação Getúlio Vargas; Estadão, 11/8/24)