Por Roseann Kennedy
Nesse jogo, Lula deixaria sua base aliada no Congresso livre para derrubar o seu veto. Uma iniciativa inócua, uma vez que a nova lei certamente será questionada no Supremo.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não tem outra alternativa a não ser vetar o projeto do marco temporal e devolver ao Congresso a briga com o Supremo Tribunal Federal (STF), dizem seus principais interlocutores. Para não ficar com a batata quente na mão, Lula irá vetar a proposta com um argumento que convence qualquer político: seu eleitorado não aceitaria outra posição do seu governo.
Nesse jogo, Lula deixaria sua base aliada no Congresso livre para derrubar o seu veto. Uma iniciativa que ele sabe ser inócua, uma vez que a nova lei será certamente questionada no Supremo. E a posição da Corte está tomada. O Congresso é a favor da tese do marco temporal para demarcação de terras indígenas, enquanto o Supremo é contra.
Poucas horas depois da votação, toda classe política se reuniu na casa da ex-senadora Kátia Abreu para festejar os 68 anos do senador Renan Calheiros (MDB-AL). A avaliação era a mesma. Faltou habilidade da parte do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para evitar a votação e o desgaste do parlamento.
O evento atraiu ministros de Lula, do Supremo, senadores, deputados… Pacheco também foi. Quando o assunto chegou o tema mudou.
O aniversário de Renan reuniu mais candidato por metro quadrado do que campanha eleitoral. O ministro da Justiça, Flávio Dino, não perdeu a piada. Cotado para ministro do Supremo, no lugar de Rosa Weber, e também para a eleição presidencial de 2026, brincou que aproveitaria para pedir votos, deixando o eleitorado livre para escolher o cargo.
Não houve “climão”. A anfitriã, Kátia Abreu, soube acomodar Dino e o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas, na mesma sala. Os dois “disputam” a vaga de ministro do Supremo. “O (Jorge) Messias só não veio porque tinha outro compromisso”, brincava a ex-senadora sobre mais um de olho na vaga. Em público os candidatos são todos amigos. Nos bastidores, a guerra é deflagrada.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também compareceu. Nome cotado no PT para sucessão presidencial caso Lula não dispute, Haddad circulou pouco e fixou numa rodinha mais reservada. “Eu queria era estar ali com o pessoal do dinheiro”, seguia Dino fazendo graça da situação.
Na bolsa de apostas, a avaliação é que o ministro da Justiça é aquele candidato que todo mundo acha que pode ser o escolhido de Lula, mas que ninguém acha que ele realmente quer. É bom que se diga que esse raciocínio vale só para vaga ao Supremo…
A festa reuniu ainda outros candidatos. O senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) passou rapidamente pelo local. Ele e Renan são candidatíssimos a presidir o Senado no biênio 2024-2025. A votação do marco temporal de forma acelerada pelo Senado, inclusive, passaria por isso. Aliado de Rodrigo Pacheco, Alcolumbre teria pressionado seu principal cabo eleitoral a incluir o tema na pauta como um movimento para atrair o apoio dos senadores bolsonaristas. Para os renanzistas foi um tiro no pé.
Ao menos um candidato aproveitou a noite para fazer campanha sem se preocupar com a concorrência. O presidente do Republicanos, Marcos Pereira (SP), circulou livremente pela festa. Ele busca o apoio do Centrão e do MDB para presidir a Câmara com o fim do mandato de Arthur Lira (PP-AL), rival político do aniversariante (Estadão, 28/9/23)