Empresa estatal tem mantido os valores da gasolina e do óleo diesel inalterados nos últimos meses.
O vaivém do preço do petróleo no mercado internacional em um patamar elevado, acima dos US$ 85 o barril, deve evoluir neste segundo semestre para US$ 90 ou mesmo ultrapassar essa marca, trazendo mais tensão para os preços da Petrobras no mercado nacional, principalmente em relação ao diesel. O último reajuste, para baixo, ocorreu há 85 dias. O produto está escasso no mercado internacional, o que também tem ajudado a puxar para cima a alta do derivado.
O movimento pode ser uma pedra no caminho da Petrobras, que tem conseguido manter os preços estáveis tanto do diesel quanto da gasolina, esta última sem reajuste há 40 dias. Segundo o especialista em combustíveis da Argus, Amance Boutin, os efeitos do descolamento dos preços da Petrobras das referências de importação já têm efeito nítido no mercado de combustíveis, que reedita os tempos de carga curta de 2022.
Os preços da estatal, que abandonou a política de preços de paridade de importação (PPI) em meados de maio e adotou uma estratégia comercial mais flexível, na qual o preço é formado cliente a cliente, fecharam as janelas de importação para o diesel e a gasolina por pequenos importadores.
Sem aumento do diesel há tantos dias, e escassez do produto no mercado internacional, a expectativa é que um reajuste seja feito em algum momento pela empresa.
Nesta terça-feira, o diretor de Logística, Comercialização e Mercados da Petrobras, Claudio Schlosser, disse em evento do setor de dutos que a nova estratégia comercial da Petrobras tem sido positiva para a companhia. Ele descartou eventuais prejuízos pelo fato de a estatal manter os preços dos combustíveis inalterados, apesar da alta do petróleo no mercado internacional.
“Nós hoje vivemos um momento muito forte de volatilidade, os preços internacionais do petróleo e do diesel tiveram um aumento, mas dentro do que entendemos da estratégia comercial é absorvido, porque no passado teríamos que fazer reajustes contínuos para acompanhar isso”, explica Schlosser.
Os preços nas refinarias da Petrobras registram defasagem de 26% no diesel e de 22% na gasolina em relação ao mercado internacional. A Refinaria de Mataripe, na Bahia, controlada pela Acelen, única refinaria de grande porte privada do País, reajusta os preços semanalmente e a defasagem é de 6% e 3%, respectivamente, segundo dados da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom). Na semana passada, a Acelen elevou o preço do diesel em cerca de 8%.
Com menos produto no mercado e ameaça de escassez pontual nos próximos meses, os agentes já têm começado a comprar diesel nos portos a preços até R$ 0,90 mais caro por litro que o vendido pela estatal. De acordo com o analista da Argus, com a escalada das cotações internacionais do Brent e do diesel russo, que vinha irrigando as importações brasileiras, teve uma interrupção na semana passada.
“Os preços ultrapassaram o teto permitido para os produtos russos (petróleo e diesel russo) e a cadeia, com seus transportadores e seguradoras, parou de fechar negócios pelo menos na última semana para não sofrer retaliações”, diz Amance.
O diesel russo não é embargado, mas tem um preço limite (US$ 100 por barril) que, se for desrespeitado, leva à punição de empresas envolvidas pelo establishment ocidental. Nesse cenário, os importadores brasileiros tiveram de voltar aos tradicionais fornecedores do Golfo, o que fez a distância para os preços da Petrobras aumentar ainda mais.
De acordo com distribuidoras ouvidas pelo Broadcast, o fornecimento de diesel já está restrito em alguns mercados.
Estresse
Para o especialista, não há risco de desabastecimento generalizado, mas o mercado brasileiro tende a continuar sob estresse com a alta das referências internacionais de preço.
“Os cortes da Opep e a melhora da economia dos Estados Unidos foram determinantes para essa subida de preços. A demanda chinesa continua abaixo do esperado e, se crescer de forma significativa nesse segundo semestre, vai colocar mais um ingrediente para a alta dos preços”, diz. “No mercado físico, há um cenário sazonal de oferta (de derivados) mais baixa na Europa, mais apertado do que se imaginava meses atrás. Os preços subiram muito e o curto prazo é nebuloso, ainda mais com o teto (de preços) para a Rússia restringindo ainda mais a oferta”, completou.
Também o consultor de gerenciamento de risco da Stonex, Thiago Vetter, afirma que os cortes de produção anunciados por membros do grupo OPEP +, principalmente Arábia Saudita e Rússia, mantém o mercado em expectativa de déficit de suprimento para os próximos meses.
“Enquanto isso, o mercado busca precificar o lado da demanda, que no momento está incerta. mas tendendo ao otimismo, na medida em que os EUA podem ter chegado ao fim do movimento de aumento de taxas de juros e a China anuncia medidas para incentivar sua economia, cuja recuperação pós-covid tem sido aquém do projetado”, explica Vetter.
Para ele, o petróleo tipo Brent vai oscilar na faixa de US$ 85 a US$ 90 dólares por barril durante o segundo semestre, mas que é possível que chegue a romper os 90 dólares em algum momento.
“Esta instabilidade se dá em função de novos dados a respeito de perspectiva de oferta e demanda, e são normais neste tipo de preço de commodity cotado em bolsa”, avalia o analista da Stonex (Estadão, 10/8/23)
Preço defasado do diesel começa a afetar importação e mexe com mercado
Defasagem em relação ao mercado internacional tornou a compra de combustível no exterior para atender a demanda local menos competitiva.
A nova política de preços da Petrobras pode dificultar o abastecimento de diesel no mercado doéstico. Segundo cálculos do setor, a defasagem do preço dos combustíveis chega, atualmente, a 26%, tornando a importação do produto inviável para distribuidoras independentes.
Isso já se reflete no abastecimento do combustível, apurou o Estadão/Broadcast com fontes de distribuidoras, que ainda não sentem a falta do produto, mas começam a colocar restrições na venda em alguns pontos do País.
Até o momento, a situação não se compara com o que ocorreu na mesma época no ano passado, mas caminhoneiros já relatam faltas pontuais. “Eles falam que não está tendo bombeamento do S10 aqui (Catalão-GO), está difícil achar. Querem aumentar R$ 0,40 no litro, mas isso a gente sabe que estão fazendo pressão (para aumentar)”, disse ao Estadão/Broadcast o presidente da Associação Brasileira dos Condutores de Veículos Automotores (Abrava), Wallace Landin, conhecido como Chorão.
A Vibra, que adquiriu a BR Distribuidora em 2021, e utiliza a marca Petrobras nos postos de abastecimento, enviou aos seus clientes no fim de julho um informe sobre a adequação das suas vendas à restrição do óleo diesel S10, o menos poluente.
O documento ao qual o Estadão/Broadcast teve acesso diz que “em virtude das oscilações de disponibilidade do produto óleo diesel S10, por decisão de nossas diretorias comerciais, informamos as seguintes medidas a serem adotadas no mês de agosto”. O aviso afirma que haverá adequação das cotas dos clientes e restrição a novos pedidos para os clientes varejistas de bandeira branca (BB) e transportadores revendedores retalhistas (TRR).
Os TRR são empresas autorizadas pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) a comprar em grande quantidade combustível a granel, armazená-lo e transportá-lo para depois vender a retalhos. Oficialmente, a Vibra informou que “está atendendo normalmente a demanda regular pelo produto para seus clientes contratados”.
Segundo a consultoria Posto Seguro, as restrições de S10 já chegaram aos Estados do Pará, Rondônia, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Mato Grosso, Goiás, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Já o S500 estaria mais escasso em Rondônia, Bahia, Mato Grosso e Paraná.
Sem cota
Ramon Reis, presidente da Nimofast, uma das importadoras de diesel mais atuantes do mercado brasileiro em 2023, informou ao Estadão/Broadcast que, desde maio, reduziu as cargas mensais (navios) do produto de sete para quatro em função do deslocamento da demanda nacional, que passou a optar pelo produto da Petrobras, desde então mais barato que as cargas inéditas vindas da Rússia com desconto ou das fontes tradicionais do Golfo do México (EUA).
A Nimofast importa diesel russo para todo o País por meio dos portos de Itaqui, Suape, Santos e Paranaguá. Agora, ante o cenário de escassez, a perspectiva da empresa é de retomada de mais cargas vindas da Rússia, que terão demanda mesmo com preços acima dos praticados pela Petrobras.
“Vamos aumentar essa importação em outubro e manter o patamar por dois meses, com nova queda prevista para dezembro e janeiro. Em fevereiro, voltamos (a importar) pesado em função da safra”, disse Reis. A Nimofast mantém uma distribuidora própria que trabalhava majoritariamente com produto importado.
Com a redução das cargas próprias, a empresa recorreu à Petrobras, mas não conseguiu volume de imediato porque não tem cotas passadas para basear os pedidos de momento. Segundo Reis, a tendência é que se repitam as incertezas e as dificuldades para obtenção de diesel vistas em 2022, quando a Petrobras represou preços alinhada à estratégia do governo para segurar a inflação a poucos meses da eleição presidencial.
Preços em alta
Segundo uma fonte de outra distribuidora, a escalada dos preços do diesel no mundo nos últimos 30 dias tornou o produto importado menos atraente que o nacional produzido pela Petrobras, que está com preços represados graças à nova estratégia comercial. Esses clientes, entre os quais estão pequenos e médios importadores e distribuidores, passaram então a procurar a Petrobras e as três grandes distribuidoras, Vibra, Raízen e Ipiranga, cujas capacidades de fornecimento já estariam tomada por contratos estabelecidos.
“A conjuntura está trazendo alguns clientes que não são habituais. Nesses casos, especificamente, como não havia previsão no plano de suprimento das distribuidoras, é possível que não se consiga atender. Não há falta de produto, mas demandas repentinas e imprevistas de clientes que antes importavam ou que distribuíam produto importado podem ter dificuldades nesse mercado spot”, resume um executivo do setor.
Defasagem
Em relação ao mercado internacional, segundo a Associação Brasileira de Importadores de Combustíveis (Abicom), os preços praticados no Brasil estão 23% mais baratos do que no mercado internacional no caso do óleo diesel e de 18% no caso da gasolina. Se observadas apenas as refinarias da Petrobras, essa defasagem sobre para 28% e 24%, respectivamente, o que poderia levar a um aumento de R$ 1,14 por litro no diesel e de R$ 0,77 na gasolina.
Segundo Sergio Araújo, presidente da Abicom, “se a Petrobras não limitar a sua nova política de preços aos volumes de gasolina e diesel produzidos nas suas refinarias, as importações por agentes privados poderão ser descontinuadas, potencializando o risco do abastecimento”.
O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, descartou fazer aumento de preços na semana passada, quando o petróleo ultrapassou os US$ 85 o barril, afirmando que a lógica comercial da Petrobras é diferente dos concorrentes e dos importadores, mas que a rentabilidade da companhia seria mantida.
Ele afirmou que, quando necessário, os combustíveis serão reajustados dentro da lógica da empresa. A situação do diesel não surpreende o chefe do departamento de análises do UBS BB e analista especializado em petróleo e gás, Luiz Carvalho. Como o limite de fornecimento aos clientes desse mercado se dá em função de cargas compradas nos três meses anteriores, pedidos inéditos podem não ser atendidos em um cenário de fechamento da janela de importação.
Isso porque não só esses clientes importam, mas também as grandes distribuidoras do País trazem volume do exterior para compor a carga fornecida no início da cadeia pela Petrobrás. Carvalho afirma que a defasagem entre os preços dos combustíveis da Petrobras e o preço de paridade de importação (PPI), deixado de lado pela estatal desde meados de maio, fecharia “cedo ou tarde” essa janela de importação de combustíveis, algo essencial para País no caso do diesel, em que 20% e 25% do total consumido vêm do exterior.
Nos últimos tempos, aliás, a importação de diesel se estendeu até mais do que o normal em função dos baixos preços do diesel russo, vendido com descontos e que hoje já corresponde a 80% do diesel vendido no País. A oferta mais curta de diesel, acrescenta o especialista, pode coincidir com o período da colheita de trigo e da segunda safra de milho em setembro.
A exemplo do ano passado, a essa altura, não se espera um cenário de desabastecimento, “mas dificuldades pontuais estão sim no horizonte”, disse Carvalho.
Resposta da Petrobras
O diretor de Logística, Comercialização e Mercados da Petrobras, Claudio Schlosser, descartou qualquer problema de abastecimento de diesel S10 no País, apesar da restrição de fornecimento relatada por distribuidoras ao Estadão/Broadcast.
Segundo o executivo, os volumes importados para agosto já foram fechados e no momento está sendo planejada a importação de setembro. “Não há risco de desabastecimento, não trabalhamos com esse cenário”, disse Schlosser após apresentação no 13º Rio Pipeline, maior evento do setor de dutos do País, sem informar se o volume de setembro será maior do que o de agosto.
Schlosser, afirmou que a nova estratégia comercial de preços da Petrobras, que substituiu a política de paridade de importação (PPI), tem sido positiva para a companhia e também descartou eventuais prejuízos pelo fato de a estatal manter os preços dos combustíveis inalterados, apesar da alta do petróleo no mercado internacional.]
“Nós hoje vivemos um momento muito forte de volatilidade, os preços internacionais do petróleo e do diesel tiveram um aumento, mas dentro do que entendemos da estratégia comercial é absorvido, porque no passado teríamos de fazer reajustes contínuos para acompanhar isso”, explicou Schlosser. Segundo ele, a estratégia comercial da Petrobras, implantada em maio deste ano, tem dado maior flexibilidade para a comercialização dos produtos da companhia (Estadão, 10/8/23)