Entidades apontam falta de contundência no resultado da reunião de líderes de países amazônicos.
A ausência de metas concretas e prazos para a conservação da Amazônia na Declaração de Belém, assinada nesta terça-feira (8) pelos líderes dos países amazônicos, deu o tom das críticas de organizações socioambientais ao documento.
Dezenas de organizações publicaram notas em protesto à ausência de medidas concretas, em um contexto de agravamento dos eventos climáticos extremos.
“Não é possível que, num cenário como esse, oito países amazônicos não consigam colocar numa declaração, em letras garrafais, que o desmatamento precisa ser zero e que explorar petróleo no meio da floresta não é uma boa ideia. Em resumo, o documento pecou pela falta de contundência”, afirmou Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, rede que reúne cerca de 80 organizações da sociedade civil brasileira.
Na mesma linha, o Greenpeace considerou grave a ausência de metas concretas para zerar o desmatamento ou para frear a exploração de petróleo na Amazônia.
“A declaração final da Cúpula da Amazônia é decepcionante em vários aspectos, mas principalmente pelo fato dela não incluir compromissos claros e concretos que apontem para a superação da relação que os nossos países têm hoje com a Amazônia”, disse Leandro Ramos, diretor de programas do Greenpeace Brasil.
Para Marcelo Furtado, fundador da Coalizão Brasil e diretor da Nature Finance, a Declaração corre o risco de repetir acordos anteriores, que contêm promessas estratégicas, mas não são implementados. “A Cúpula abordou os temas certos, mas não entregou o que a sociedade, o setor privado e a academia esperam: um conjunto de ações concretas, de curto e médio prazo, que possam mudar o rumo que hoje navegamos”, afirmou.
Por outro lado, as organizações também reconhecem avanços que podem alavancar a cooperação regional, mas foram ofuscados pelas omissões sobre o fim do desmatamento e da exploração de combustíveis fósseis.
“O Brasil conseguiu costurar avanços importantes na declaração de Belém, como a proteção de direitos dos povos indígenas, a demarcação legal de suas terras e o reconhecimento de que a região está chegando a um ponto de não retorno”, afirmou Diego Casaes, diretor de campanhas da Avaaz. Ele ressalva que a falta de compromisso com metas de desmate e conservação foram “uma grande bola fora” dos presidentes amazônicos.
Para o WWF-Brasil, é positivo o reconhecimento dos chefes de Estado sobre o ponto de não retorno da Amazônia. “Como a OTCA [Organização do Tratado da Cooperação Amazônica] saiu fortalecida, que ela ajude na rápida implementação de ações efetivas no combate ao desmatamento, ao mercúrio e o garimpo ilegal e na ampliação de áreas protegidas e territórios indígenas”, diz Mauricio Voivodic, diretor executivo da organização.
Para a diretora-geral de presença global e ação nacional do WRI (World Resources Institute), Adriana Lobo, a declaração contém as ideias e princípios necessários para virar o jogo na Amazônia, como evitar coletivamente o ponto de não retorno no desmate.
“A Declaração de Belém é um importante primeiro passo. Agora os países amazônicos precisam colocar essas ideias em prática –criando um plano com ações específicas, políticas públicas e marcos temporais. E uma estratégia para a atração dos investimentos necessários para tornar isso realidade”.
Rachel Biderman, vice-presidente sênior da Conservação Internacional, também tem uma visão positiva sobre o resultado do encontro, apontando o documento como um compromisso importante assumido pelos líderes amazônicos.
“Mas a maneira como a Cúpula será lembrada depende, em última instância, do que será feito a seguir. Nós precisaremos trabalhar em cooperação plena, com transparência total, para direcionar recursos para a região. Teremos que estabelecer metas intersetoriais específicas, com um cronograma rígido”, afirma, ressaltando que, para isso, é preciso seguir a liderança dos povos tradicionais e outras comunidades locais, colocando seus direitos como prioritários (Folha, 9/8/23)