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Açúcar: O futuro do passado

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Por Arnaldo Luiz Corrêa

O mercado futuro de açúcar encerrou a sexta-feira como o vencimento outubro/22 cotado a 17.93 centavos de dólar por libra-peso. Os fundos reduziram suas posições para quase zero, perdendo influência no curto prazo sobre a trajetória de preços. Com mais açúcar sendo produzido pelas usinas em resposta a um mercado de hidratado frouxo e a necessidade de hedge adicional contra o vencimento março/23, NY deverá ter dificuldades de se manter acima dos 18 centavos de dólar por libra-peso. O firme mercado de açúcar branco tem dado suporte ao mercado de açúcar bruto. O hidratado se recuperou um pouco na semana e negocia apenas a 350 pontos de desconto (já foi 500).

Edward Lorenz (1917-2008) foi um matemático, filósofo e meteorologista americano, fascinado desde criança pelas mudanças do clima, o que o levou a elaborar complicadas equações matemáticas para auxiliar na previsão meteorológica. Esses estudos, que ele desenvolveu na década de 1960 no Massachussetts Institute Of Technology (MIT) foram o embrião do que se chamou mais tarde de Teoria do Caos. A teoria afirmava, colocando de maneira simples, que pequenas mutações iniciais de cada uma das variáveis do seu modelo matemático acarretariam em resultados finais muito divergentes. É o chamado Efeito Borboleta.

Pensei, puramente como exercício mental, o que teria acontecido com o mercado de combustíveis no Brasil, caso não tivéssemos tido a pandemia da covid-19. Explico: em fevereiro de 2020, no início da pandemia, o consumo de combustíveis Ciclo Otto atingia 54.2 bilhões de litros no acumulado dos últimos doze meses, número recorde. Esse consumo apontava para um crescimento anualizado de 3.9% em relação ao ano anterior, em consonância com o crescimento anual década anterior (fevereiro-2020 x fevereiro-2010) que foi de 3.8%.

Admitamos que, mutatis mutandis, o consumo verificado em fevereiro de 2020 mantivesse o mesmo ritmo observado na média da década. Dessa forma, hoje teríamos um consumo de 59 bilhões de litros (Ciclo Otto), ou seja, 7 bilhões de litros acima do consumo acumulado de doze meses observado no final de junho próximo passado.

Em fevereiro de 2020, o etanol (anidro e hidratado) representava 48.3% do consumo Ciclo Otto. Grosso modo, sem pandemia, teríamos hoje uma demanda adicional de etanol ao redor de 3.4 bilhões de litros. Certamente não haveria produto suficiente para atender a essa demanda e o mercado internacional de açúcar, balizador natural da arbitragem, indicaria qual produto a usina deveria produzir. No entanto, nada disso ocorreu, evidentemente. Então qual o ponto da discussão?

Entendo que a pandemia mascarou um problema relacionado à disponibilidade de cana que vamos enfrentar mais cedo ou mais tarde e só não experenciamos isso agora exatamente por causa da pandemia. O Brasil não tem matéria prima suficiente para atender uma demanda interna de combustível (etanol) quando esta retornar aos padrões de consumo observados antes da covid e simultaneamente manter a participação no mercado mundial de açúcar.

O nível de consumo (Ciclo Otto) hoje é o mesmo de um ano anterior à pandemia, ou seja, regredimos ao nível de 40 meses atrás. Se o consumo crescer – a partir de agora – metade do que crescia antes da pandemia, só daqui a 26 meses chegaremos no ponto de consumo de fevereiro de 2020, isto é, em novembro de 2024.

No entanto, as coisas mudam. A terrível crise energética pela qual a Europa está passando e vai passar no inverno que se aproxima vai obrigar as pessoas a consumirem menos, a não deixarem os ambientes tão aquecidos como de costume. É mesmo uma situação de guerra. Não compram petróleo da Rússia, como represália à guerra com a Ucrânia, mas Putin está vendendo para Índia e China que vão refinar e vender para a Europa.

A publicação The Economist toca num ponto importante, em vista das ideias de mudar preço de referência, interferências no mercado para segurar preços e similares. O Brasil tem experiências nessas insanidades que são chamarizes para governos populistas, como esse que está em Brasília. Elas não funcionam.

Diz a revista que, “seria uma loucura tomar decisões de longo prazo sobre o redesenho de sistemas de energia em meio ao caos. Manter o mecanismo de mercado é essencial para incentivar o investimento em novas capacidades e inovação. Encontrar novas fontes de energia é imperativo [assim como] a transição para um sistema de energia mais limpa. A resposta errada pode levar à falência governos e prender a indústria de energia da Europa ao passado”.

Parece muito claro que temos no futuro próximo uma imensa janela de oportunidades para as energias renováveis na qual o etanol se insere. E para fechar essa elucubração com uma provocação, o que precisamos perguntar é como o setor sucroalcooleiro vai se preparar para uma demanda que promete ser exuberante ao mesmo tempo em que a Índia foca na produção de etanol objetivando chegar aos 20% na mistura com a gasolina até 2025? E mais, havendo – como é plausível pensar – uma recuperação da economia global e do consumo de açúcar (crescendo na Ásia e África, per capita) ao mesmo tempo que a Índia reduz a disponibilidade do produto para exportação e a Europa refaz seus cálculos acerca do custo de produção do açúcar branco, quem vai suprir o mercado internacional?

A menos que tenhamos uma recessão mundial duradoura e uma revoada de exasperados cisnes negros sobre o mercado de energia é bem difícil imaginar o binômio açúcar/etanol em tom baixista nas próximas 2-3 safras. A arbitragem entre açúcar e etanol deverá ser estreita e muito sensível a qualquer faísca que possa acender o mercado. Mas, até lá vamos ter que navegar com muito cuidado nos mares revoltosos do curto prazo. No Brasil, principalmente, o que nos aguarda com um novo governo. Segurem-se bem porque as ondas podem nos derrubar.

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